Em declarações à Lusa, Filipe Duarte Santos, professor da Faculdade de Ciências na Universidade de Lisboa e presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável, mostrou-se "surpreendido" com o Leslie, uma tempestade pós-tropical que atingiu Portugal no sábado e no domingo, classificando o fenómeno como "raro", mas alertou que a continuação das alterações climáticas pode vir a tornar aquele tipo de eventos "quase frequentes".
"Nós não sabemos quando é que uma coisa destas vai acontecer outra vez mas é muito provável que passem a ser mais frequentes no futuro. É surpreendente que a Portugal e a restante Europa sejam afetadas por estes temporais pós-tropicais, mas é por causa da temperatura da água do mar", disse, à margem de uma conferência sobre adaptações às alterações climáticas, hoje em Guimarães.
Segundo o especialista, que foi um dos revisores do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC), o Leslie foi "um fenómeno oceânico que nasceu no Atlântico e que cresceu, dando origem a um ciclone tropical que se aproximou da costa portuguesa, mas que quando entrou em terra já era um temporal pós tropical, mas com ventos extremamente intensos", e resultou do aumento da temperatura da água do mar.
"A temperatura superficial dos oceanos aumentou 1,5 graus celsius desde 1900, sendo que o oceano Atlântico está em média a ficar mais quente e deixa-nos vulnerável", avisou.
Filipe Duarte Santos disse ainda que "os cientistas não têm qualquer capacidade de prever quando é que um temporal pós-tropical como o Leslie vai novamente chegar" a Portugal: "Não fazemos ideia se será daqui a cinco, dez, 15 anos. Mas aquilo que se nota é que os ciclones tropicais no Atlântico, os muito intensos estão a ficar mais intensos, os de categoria 4 e 5, estão a ficar maior e as trajetórias estão a chegar mais a norte e mais a leste", descreveu.
"Estamos todos surpreendidos. Os registos meteorológicos que há em Portugal, desde 1860, não têm nenhuma notícia de uma tempestade com estas características", referiu.
Para o investigador aquele que é "ainda um fenómeno raro" pode ser mais frequente: "Em relação ao futuro, se as alterações climáticas continuarem, ou seja as emissões de gases com efeito de estufa para atmosfera, especialmente o dióxido de carbono, que provem da combustão de combustíveis fosseis, se não fizermos uma transição para energias renováveis e muito maior eficiência energética, isto vai continuar", alertou.
O professor salientou, por isso, a importância de "iniciativas de adaptação" às alterações climáticas.
"São muito importantes, as pessoas estão a consciencializar-se que estamos num clima em mudança e que isso traz impactos negativos, mas que também traz oportunidades em algumas regiões do mundo. Temos que nos adaptar a um clima diferente e essa adaptação deve ser feita à escala global, sobretudo através de iniciativas das Nações Unidas, pode e deve ser feita, e está a ser feita, à escala da União Europeia, em Portugal à escala governamental e depois ao nível municipal", apontou.
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