O Governo de coligação liderado por Pedro Passos Coelho tentou pela primeira vez passar a lei a criminalização do enriquecimento ilícito em 2012, com um decreto da Assembleia da República, enviado pelo Presidente da República de então, Aníbal Cavaco Silva, para fiscalização preventiva pelo Tribunal Constitucional, que viria a pronunciar-se pela inconstitucionalidade das normas.
O mesmo viria a acontecer em 2015, com nova tentativa do Governo de Passos Coelho a não passar no Tribunal Constitucional (TC).
A ideia ter ressurgido no programa do Governo da Aliança Democrática (AD), é algo que para o vice-presidente da Frente Cívica, João Paulo Batalha, se explica com facilidade.
“Em termos políticos, é uma coisa fácil de propor e é popular. E, portanto, é natural que esteja sempre a surgir. A verdade é que já esbarrou nas reservas do TC e mesmo que se encontre uma formulação que passe no crivo do TC, eu acho que vai ser difícil ter uma formulação que torne uma lei destas verdadeiramente eficaz, sem chocar na cultura judicial”, disse o responsável à Lusa.
Na opinião de João Paulo Batalha, “tudo o que pareça ou possa ser interpretado como reversão do ónus da prova vai ter problemas no TC e mesmo que se consiga uma formulação que não tenha problemas no TC, vai ter problemas nos tribunais em termos de aplicação”, gerando “imediatamente imensa doutrina” em sentido contrário, levando a que a nova tipologia de crime e a sua aplicação penal siga “o mesmo caminho do recebimento indevido de vantagem, do tráfico de influências, que estão na lei, mas não são aplicados porque não estão na nossa cultura judiciária”.
A este propósito, João Paulo Batalha referiu que, nos casos mais mediáticos, só tem memória de uma condenação por tráfico de influência, a do ex-ministro socialista Armando Vara.
O vice-presidente da Frente Cívica defende que “pode ser útil” para o combate à corrupção criminalizar o enriquecimento ilícito, regulamentar o lóbi ou permitir mecanismos de direito premial (a chamada ‘delação premiada’, como é denominada no Brasil), mas defende que “tudo isto tem que ser discutido com muito rigor, tem de ser legislado com muito cuidado e de forma muito participada e avaliando bem o que já existe e a sua eficácia”.
“Nós estarmos a fazer leis muito progressistas, que depois esbarram em instituições que, ou não têm meios, ou não têm uma cultura que esteja em linha com a legislação progressista, então serve de pouco”, disse.
Ainda sobre o lóbi, recordou o processo apressado de tentativa de regulamentação no parlamento mesmo a encerrar a legislatura, que “ia, em grande medida, fazer mais mal que bem”, sobretudo no que diz respeito à atividade dos advogados, sublinhando que se poderia cair na contradição de ter sociedades de advogados em Portugal registadas como lobistas em Bruxelas, mas não em território nacional, ficando a ação destes profissionais enquadrada no âmbito dos atos próprios da atividade
“Se nós fizermos uma regulação do lóbi que deixa de fora os advogados, na verdade estamos a criar o mercado para o lóbi transparente, em que é preciso registar quem é o lobista, quem é que está a pagar ao lobista, quais são os interesses que ele está a defender e criamos ao mesmo tempo o mercado de lóbi paralelo, que é um mercado que já existe hoje em dia pelas sociedades de advogados e que se ficarem fora da lei podem continuar a exercer um mercado que se torna ainda mais lucrativo, que é o do lóbi discreto ou opaco”, criticou.
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