Delegado na ilha da Guadalupe da Associação de Autarcas de Origem Portuguesa Cívica, José Fernandes Rodrigues e "o companheiro de luta" Armindo Paulo Carvalho têm organizado a transferência de portugueses das ilhas de Saint-Barthélémy para Portugal, acolhendo-as em Guadalupe, encaminhando-os para a Cruz Vermelha e dando-lhes abrigo.
No total, José Fernandes Rodrigues já ajudou cerca de cem pessoas no processo para regressaram a Portugal, nomeadamente 70 que partiram na quarta-feira num avião da Força Aérea Portuguesa e que deverão chegar hoje a Lisboa.
"Falei com quase toda a gente. Há muitos que não querem voltar [para as Antilhas]. Eles estão traumatizados. Vi imagens que me fizeram chorar. Tenho arrepios no corpo. É duro", testemunhou à lusa o português que vive há 24 anos em Guadalupe e que também viveu quatro anos em Martinica.
Hoje, José Fernandes tem apenas uma família de Leiria em sua casa - o gato pipoca, Paulo e a mulher Rosa, que está grávida de oito meses e meio - mas chegou a acolher uma média de 11 pessoas diariamente.
"Houve um grupo que me contou que teve que se esconder num tanque de água, numa cisterna, com água até à cintura. O furacão arrancou tudo e entrou dentro de casa. É duro, é duro para eles. Estão traumatizados", contou, emocionado.
Desde a passagem do furacão, o português de 57 anos não tem parado, levanta-se de madrugada, recebe "mais de 200 chamadas por dia", inicialmente pensou ir para Saint-Barthélémy ajudar na reconstrução, mas acabou por decidir ficar em Guadalupe, onde seria “mais útil".
Só na quarta-feira é que José Fernandes comeu "a primeira refeição digna desse nome", sublinhando que a força que o tem motivado vem-lhe “de Nossa Senhora de Fátima”.
"Eu agora estou aqui sozinho, ninguém me vê, mas quando estou com eles [sobreviventes do furacão] tenho que estar forte. Quando estou ao pé deles tenho de fazer cara alegre, fazê-los rir, abraçá-los, dar-lhes apoio e carinho", contou o português oriundo de Mortágua.
Ao longo da última semana, José Fernandes tem ido buscar os portugueses de Saint-Barthélémy ao aeroporto, depois acompanha-os à Cruz Vermelha e orienta-os "para casa dos amigos" ou para a sua.
"Em minha casa tenho tido uma média de 11 pessoas, em casa da minha sogra 5,6,7 pessoas, em casa dos meus vizinhos 4,5,6. A noite em que eu tive cá menos pessoas foi esta noite. Só lá tenho um casal, com uma senhora que está grávida de oito meses e meio, o seu marido e um gatinho", descreveu.
José Fernandes, que é também o responsável da associação Guadalusa "que serve de ligação entre Portugal e as ilhas", confirmou que o secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Luís Carneiro, que está hoje a acompanhar na sua visita Guadalupe, lhe afirmou que vai passar a haver aí uma permanência consular, "pelo menos uma vez por ano".
"Estamos satisfeitos, já é um primeiro passo importantíssimo. Já nos disseram que vão arranjar um local e que precisavam da nossa colaboração aqui. Francamente estou contente, estou feliz que ao fim de tanta luta e de tanto sofrimento uma porta se abra para resolver este problema", disse.
"Fica caro o cartão do cidadão e o passaporte" quando as pessoas têm de comprar um bilhete de avião para irem ao consulado de Paris tratar dos documentos, a cerca de 7.000 quilómetros, referiu.
Hoje, o secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Luís Carneiro, anunciou à Lusa que o Governo vai criar uma nova permanência consular nas Antilhas francesas, a partir de maio de 2018, para apoiar os mais de 2.000 portugueses que vivem na região e que estão dependentes do Consulado-Geral de Portugal em Paris.
Na quarta-feira, a Associação de Autarcas de Origem Portuguesa em França, Cívica, insistiu que quer uma rede administrativa portuguesa nas Antilhas francesas, nomeadamente nas ilhas de Saint-Barthélémy e de Saint-Martin, devastadas pelo furacão Irma.
Em comunicado enviado à agência Lusa, a associação indicou que esta "solicitação é bem antiga mas nunca foi tomada em consideração", sugerindo permanências consulares, protocolo com câmaras municipais locais de serviço administrativo europeu e criação de um consulado honorário".
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