Na investigação publicada hoje, o LA Times questiona a relevância que a Associação de Imprensa Estrangeira em Hollywood (HFPA, na sigla inglesa) ainda tem na indústria cinematográfica nos Estados Unidos, divulgando que os membros da organização recebem remunerações avultadas, cuja proveniência não é transparente, e nem todos são efetivamente jornalistas.
A partir de entrevistas com mais de 50 pessoas, incluindo agentes, produtores de estúdios de produção e sete antigos e atuais membros da associação, o jornal norte-americano traça uma imagem de atuação duvidosa, protecionista dos seus membros e desligada da realidade.
Segundo o jornal, está em curso um processo em tribunal interposto em 2020 pela jornalista norueguesa Kjersti Flaa, que viu negada a admissão na associação, acusando a HFPA de perpetuar “uma cultura de corrupção” entre os seus membros e de ser conivente com jornalistas que recebem dinheiro de estúdios de cinema, tudo isto feito “num código de silêncio”.
Em novembro, o juiz federal rejeitou a ação judicial, mas a jornalista recorreu da decisão, contando agora também com a participação no caso da jornalista espanhola Rosa Gamazo.
Ao jornal, Kjersti Flaa considera que é preciso manter a pressão pública sobre a HFPA para a obrigar a uma mudança: “Isto acontece há muitos anos e continua. É tempo de eles perceberem que precisam de mudar”.
O LA Times confirmou também que entre os 87 membros não existe qualquer pessoa negra, facto que a associação admitiu e manifestou “comprometida” em alterar, outros estão em representação de vários países e há ainda “muitos que não são verdadeiramente jornalistas, porque não são ameaça para ninguém”, como descreveu um elemento da organização.
É ainda citado o caso de uma jornalista do jornal francês Le Monde, correspondente em Hollywood (Califórnia), que acabou por desistir de ser membro da associação ao fim de várias tentativas frustradas.
“Eu era bastante qualificada e profissionalmente ativa. Na altura, eu até era a única membro estrangeira da associação de críticas de televisão. Não valeu de nada. Passado um tempo, deixei de insistir [em tentar ser da HFPA]. Achei que eram ridículos”, disse a jornalista francesa Claudine Mulard ao LA Times.
Os Globos de Ouro foram vistos, em tempos, como uma antecâmara para os Óscares, mas em anos recentes a sua importância tem sido questionada e até ridicularizada – por exemplo, pelo humorista Ricky Gervais, apresentador de várias cerimónias.
Este ano, a associação foi amplamente criticada por ter excluído das nomeações dos Globos de Ouro várias produções que são potenciais candidatos aos Óscares, como “Da 5 Bloods – Irmãos de armas”, de Spike Lee, “Judas and the Black Messiah”, de Shaka King, e “Ma Rainey: A mãe do blues”, de George C. Wolfe.
O jornal descobriu ainda que, sendo uma associação sem fins lucrativos, a HFPA faz “pagamentos substanciais” ao seus membros – em 2020 foram 1,6 milhões de euros – para pertencerem em diferentes comités e realizarem determinadas tarefas.
A associação defende-se, dizendo que há preconceitos em relação aos membros da associação, que as contas da associação são auditadas e que a prática de compensação financeira aos associados se baseia no que já é praticado em relação a outras organizações sem fins lucrativos.
A atribuição dos Globos de Ouro, que acontece anualmente há quase oitenta anos, é o lado mais visível da atuação da Associação de Imprensa Estrangeira em Hollywood.
O jornal recorda que todos os anos a cerimónia de entrega dos prémios soma entre 18 a 20 milhões de espectadores, um número generoso e que é visto ainda pelos estúdios de cinema como um ponto chave no calendário de prémios rumo aos Óscares.
“O problema é que os estúdios precisam deles”, admitiu o agente de um dos estúdios de Hollywood, que não quis ser identificado.
A 78.ª edição dos Globos de Ouro está marcada para domingo, 28 de fevereiro, contará com apresentação de Tina Fey e Amy Poehler e a cerimónia será apenas virtual, face à situação epidemiológica da covid-19 nos Estados Unidos.
O filme “Mank”, de David Fincher, e a série “The Crown”, produzidos pela plataforma Netflix, lideram as nomeações.
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