Todos os anos, na cidade indiana de Calcutá, a 'profissão mais antiga do mundo' recebe o respeito efémero de um antigo costume: os homens juntam terra à porta dos bordéis que consideram sagrados.
A tradição faz parte das comemorações do festival de Durga Puja, o maior festival hindu do estado de Bengala Ocidental, no leste da Índia, que começa neste mês de outubro.
No entanto, para as profissionais do sexo, esta tradição é um reflexo da discriminação que as mesmas enfrentam na Índia.
Os devotos hindus consideram sagrado o chão na entrada dos bordéis porque acreditam que os homens deixam todas as coisas boas à porta antes de lá entrarem.
“Os homens que entram na casa das prostitutas deixam toda a segurança que há dentro deles à porta”, diz Jayanta Kushary, de 64 anos, fundador da academia cultural indiana Sarva Bharatiya Prachya Vidya.
No entanto, Kushary insiste na importância do respeito da sociedade pelas profissionais.
“Ninguém se sacrifica tanto quanto elas”, diz. “Elas são muito, muito importantes para a nossa sociedade”, argumenta.
"Eles acham que estou a fazer algo de errado", diz Salima, nome fictício de uma profissional do sexo há 30 anos. "Aos olhos deles não sou digna", acrescenta.
Por esse motivo, a família da mulher não sabe o que ela faz para viver. “Não gostamos de fazer este trabalho”, diz, referindo que, contudo, não tem outra alternativa.
As festividades, que duram uma semana, celebram a vitória de Durga, uma deusa poderosa e com vários braços, geralmente, representada montada num leão, sobre um demónio.
A terra é misturada com argila e serve também para fazer esculturas das figuras dos "ídolos" que as famílias hindus adoram, além da deusa Durga.
Samar Dutt, um indiano que utiliza a terra há mais de um século com a sua família, lamenta que as mulheres dos bordéis sejam menosprezadas desta forma. “Elas não são o lado obscuro da sociedade”, diz, ”são como o mundo inteiro", refere.
No distrito de Sonagachu, as profissionais do sexo opõem-se, há muito tempo, a esta tradição e lutam pelo respeito social.
Uma porta-voz do Comité Durbar Mahila Samanwaya, uma associação de profissionais do sexo, explica que as artes de argila foram proibidas na região desde 2004, de forma a exigir que sejam tratadas com “dignidade na sociedade”.
Os homens continuam a recolher e a deixar a terra na zona, mas ninguém convida as profissionais para participarem na celebração de Durga Puja.
“As mulheres acham que lhes roubamos os maridos se conversamos com eles. Mas nós não pensamos assim”, afirma Pushpa, identidade cujo nome foi alterado para proteger a sua.
“Uma profissional do sexo é uma assistente social”, acrescenta.
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