Um plano faz a caracterização física do concelho, na qual se encontram, por exemplo, as altitudes, a existência de mais declives ou encostas, a exposição solar, bem como o mapa hidrográfico que determina se se trata de uma zona com elevados ou fracos recursos hídricos.
Somam-se referências à evolução demográfica e à ocupação do território.
De acordo com o Plano Municipal de Defesa da Floresta contra Incêndios (PMDFCI) do concelho da Sertã, consultado pela Lusa a título de exemplo, as diferenças de altitude e declive contribuem para as variações da temperatura e da humidade relativa, afetando por sua vez a quantidade de precipitação recebida, a última ocorrência em que o gelo ou a neve derreteu ou o mês em que a vegetação ficou seca.
A altitude é um fator com importância no comportamento do fogo, basicamente pela sua influência sobre outros fatores, nomeadamente as condições meteorológicas e o desenvolvimento vegetativo, sendo dos elementos incluídos na determinação do risco de incêndio.
Um plano faz ainda a caracterização climática, sendo analisada a temperatura - um fator importante, já que tem influência direta no conteúdo de humidade dos combustíveis, ou seja, quanto maior for a temperatura ambiente mais seca fica a vegetação e, por conseguinte, maiores são as condições para a rápida propagação de incêndios.
A humidade relativa do ar, em conjugação com a temperatura, pode ajudar a definir o maior ou menor risco de fogo. Também a precipitação tem uma ação direta sobre os combustíveis. A sua ausência prolongada condiciona a secagem dos combustíveis, tornando-os mais vulneráveis ao fogo.
Segundo o PMDFCI da Sertã – um dos concelhos fustigados pelos incêndios de junho de 2017 -, há que ter ainda em conta os ventos dominantes: o efeito do vento sobre as chamas é muito semelhante ao provocado pelo declive, uma vez que ao inclinar as chamas na frente do fogo se potencia a radiação de calor.
Segundo este plano, perante a tendência para o despovoamento e envelhecimento da população local, “o decréscimo populacional, tem-se acentuado a um ritmo extremamente elevado, que pode colocar em risco a sobrevivência de algumas localidades ao longo deste século”. Perante este facto, refere o plano, “as povoações envelhecidas e com maior desertificação, ficam expostas à ocorrência de incêndios”.
Desde que o índice de envelhecimento, que também é tido em conta num plano, é publicado (1998), tem-se verificado, segundo o documento, que a maioria dos concelhos do interior centro do país “tem vindo a aumentar o seu índice de envelhecimento e sempre com valores que ultrapassam o índice para a região Centro e para Portugal”.
Tanto o PMDFCI da Sertã, como o de Pampilhosa da Serra, concelho fustigado pelos incêndios de 15 de outubro de 2017, fazem menção ao facto de os terrenos mais afastados das aldeias se encontrarem ao abandono, dada a partida das populações, levando ao progressivo abandono das atividades agrícolas, silvícolas e pecuárias.
Devido a este abandono acumula-se a carga combustível nos pinhais e matos das regiões, já que se deixou de cortar mato para o gado e se reduziu o consumo de lenha, diminuindo, igualmente, a vigilância popular.
Fonte do Ministério da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural explicou à Lusa que, após a elaboração por parte das Câmaras, os PMDFCI têm de ser apreciados pelas respetivas Comissões Municipais de Defesa da Floresta, que elaboram um parecer prévio.
O Instituto da Conservação da natureza e das Florestas (ICNF) dispõe, em seguida, de um prazo de 20 dias para emitir um parecer vinculativo. Segue-se uma fase de consulta pública, nunca inferior a 15 dias, para a matéria não sujeita a reserva, após a qual o plano é votado na Assembleia Municipal.
Os planos podem vir a ter um parecer negativo caso não cumpram as disposições quanto à estrutura e ao conteúdo definidas pelo organismo no respetivo Guia Técnico.
Se o plano tiver “incorreções e incoerências técnicas graves poderá também ser alvo de parecer negativo”, referiu o ICNF, adiantando que o instituto presta todo o apoio e acompanhamento aos municípios na elaboração dos planos.
Vinte e nove municípios sem plano de defesa florestal atualizado em vigor
Vinte e nove municípios do continente português não têm um Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios (PMDFCI) atualizado em vigor e, destes, três entendem que não precisam de elaborá-lo por não terem floresta.
Os municípios de Amadora, Porto e São João da Madeira não dispõem – e nunca dispuseram - de qualquer plano, como determina a lei, segundo dados do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) publicados na sua página da internet e qe reportam a 31 de março.
Uma resposta enviada à Lusa pelo gabinete do ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural refere que os municípios que não cumprem a lei são alvo de coima: a lei do Orçamento do Estado para 2019 “prevê que, em caso de incumprimento do prazo (31 de março), seja retido no mês seguinte 20% do duodécimo das transferências do Fundo de Equilíbrio Financeiro”.
Este fundo é uma das rubricas previstas no Orçamento do Estado para a transferência anual de verbas para as autarquias.
A Lusa questionou o Ministério da Administração Interna, que tutela o poder local, sobre a aplicação de coimas a algum município neste contexto, mas não obteve uma resposta.
Em 10 de abril, numa audição parlamentar, o ministro da tutela, Eduardo Cabrita, referiu que o Governo irá notificar os municípios que ainda não disponham de planos de proteção da floresta contra incêndios.
Questionado sobre a ausência de PMDFCI, o município da Amadora (distrito de Lisboa) informou que não está ao abrigo de “qualquer exceção na necessidade de elaboração do plano”, mas indicou que a configuração “eminentemente urbana e sem floresta” justifica que ele não seja elaborado.
“A existência do Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios não se afigura como vital para a mitigação dos riscos e/ou mesmo do seu combate, existindo planos prévios para intervenção nos incêndios rurais, realizados anualmente”, acrescentou a autarquia, no distrito de Lisboa.
O município do Porto indicou que "está isento de apresentar tal plano, uma vez que não tem floresta".
Também a Câmara de São João da Madeira (distrito de Aveiro) informou que “o concelho não tem zona florestal, pelo que, no entendimento do município, não está obrigado a ter plano”.
"Ainda assim, o município pediu esclarecimentos à tutela sobre esta matéria, não tendo, até ao momento, obtido resposta. Informa-se também que a gestão de material combustível neste âmbito é feita pela autarquia ao abrigo do regulamento de resíduos e limpeza urbana", referiu fonte do município, em 08 de abril.
O gabinete do secretário de Estado das Florestas e Desenvolvimento Rural esclareceu, numa resposta à Lusa, que a lei "não prevê exceções, uma vez que se aplica a todos os municípios do país".
Dos 278 municípios de Portugal continental, 249 (ou seja, 89,5%) têm planos de segunda geração vigentes ainda dentro do prazo ou têm já os planos de terceira geração com parecer positivo do ICNF ou mesmo já aprovados pela assembleia municipal, de acordo com uma análise feita pela Lusa ao mapa publicado no 'site' do instituto.
Os planos de terceira geração são elaborados já em função de legislação de 2018.
Destes 249 planos que estão em cumprimento da lei, 46 terminam este ano o prazo de vigência e 41 têm já planos de terceira geração (atualizados em relação à lei) e com parecer vinculativo positivo do ICNF.
Outros oito planos de terceira geração tiveram parecer negativos e não têm, neste mapa, menção a qualquer documento anterior.
Há ainda quatro concelhos com planos de segunda geração já ultrapassados ou indeferidos, além de 14 municípios com planos de primeira geração, ou seja, já inválidos.
Feitas as contas, 29 municípios não têm uma situação regularizada ao nível dos PMDFCI, que listam as medidas necessárias à prevenção de incêndios florestais, bem como a previsão e o planeamento integrado das intervenções das diferentes entidades envolvidas no combate.
O período de vigência dos novos planos de terceira geração é de dez anos. Os planos municipais de primeira e segunda geração eram válidos por cinco anos.
Os de terceira geração podem vir a ser revistos sempre que se justifiquem alterações aos objetivos e metas definidas, nomeadamente no que toca ao desenho das redes de defesa da floresta contra incêndios, à carta de perigosidade e à carta de prioridades de defesa.
As autarquias que não disponham de planos aprovados e atualizados até 31 de março “incorrem em incumprimento”, segundo o ICNF, acrescentando que “a inexistência de plano não dispensa a obrigação da execução das faixas de gestão de combustível”.
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