João Carreira, de 19 anos, que sofre de autismo e atualmente está internado preventivamente no Hospital Prisional de Caxias, respondia a perguntas do seu advogado, Jorge Pracana, no Juízo Central Criminal de Lisboa, onde está a ser julgado por dois crimes de terrorismo, um dos quais na forma tentada, e de um de detenção de arma proibida, depois de, em fevereiro, ter sido detido pela PJ no seu quarto nos Olivais, na posse de facas, bestas e cocktails molotov, entre outro material.
Apesar de toda a prova indiciária recolhida pelos agentes da PJ apontar para a iminência de um ataque sanguinário dentro da faculdade, o advogado de defesa pretendeu evidenciar ao coletivo de juízes presidido por Nuno Costa que o tribunal está na presença de alguém que dificilmente passaria das palavras aos atos descritos na acusação.
"Já mataste algum animal na tua vida?", questionou Jorge Pracana, ao que o jovem respondeu prontamente."Nunca".
"Eras capaz de pegar numa faca e espetar num ser humano?, insistiu ao causídico, ao que João Carreira retorquiu: "Acho que não".
A pergunta de Jorge Pracana incidiu sobre as facas porque, antes, o jovem tinha apontado, entre os objetos apreendidos, a faca como sendo, na sua perspetiva, "a arma mais eficaz".
Durante o interrogatório, o jovem admitiu que "nunca manejou uma arma de fogo", confirmando porém que comprou várias facas, sendo que a escolha recaía naquelas que eram mais "fixes" e esteticamente atraentes.
Revelou ainda que na véspera de ser detido ficou a saber na "Loja do Chinês", onde adquiriu material para o seu plano, que a polícia "andava atrás de si", o que o levou a cancelar a compra de mais líquido para fabricar os cocktails molotov.
Também em resposta ao advogado, o estudante de engenharia informática, cujos pais vivem na Batalha e o único irmão reside e trabalha na Alemanha, confessou que chegou a pensar em suicidar-se, em vez de cometer o atentado, mas que "não foi capaz", justificando que não tinha "razão" e eventualmente coragem para o fazer.
Durante a sessão, o tribunal inquiriu Micaela Nunes, uma jovem que tinha um blogue sobre casos criminais e que se tornou amiga, via online, do arguido, trocando também com ele ideias e mensagens no Telegram e Instagram. A testemunha disse saber que João Carreira tinha armas, que estava "triste", tendo-lhe dito "várias vezes que se ia matar".
Em tribunal foram também ouvidos dois inspetores da Unidade Nacional de Combate ao Terrrorismo da PJ, tendo ambos confirmado ter sido o FBI a lançar o alerta sobre as intenções criminosas do jovem, após uma denúncia de que este teria anunciado num grupo restrito da internet o seu plano de causar mortes na universidade.
Arménio Pontes contou que na vigilância efetuada na universidade constatou-se que o jovem "não interagia com ninguém", andando "cabisbaixo" e que "algo a nível comportamental" indicava que "algo estava a acontecer". Alertou ainda para o "plano muito elaborado e disiciplinado" encontrado na parede do quarto do jovem, que é "típico" de quem prepara meticulosamente este tipo de atentados. Segundo o plano, o ataque deveria ser concretizado dia 11 de fevereiro.
Quer Arménio Pontes, quer o seu colega Luís Simas Miranda, declararam que o jovem "estava a dormir" quando o seu quarto foi alvo de buscas, tendo João Carreira ficado "surpreendido" com a ação, mas com uma atitude "colaborante" e "serena".
Os inspetores da PJ vincaram que, após ser detido nos Olivais, o jovem lamentou ter deixado passar a oportunidade, desabafando: "Fogo, já devia ter feito isto (ataque) na segunda-feira".
João Carreira ficou em prisão preventiva desde 11 de fevereiro de 2022, tendo a medida de coação sido substituída por internamento preventivo no Hospital Prisional de Caxias, com o Ministério Público a alegar “forte perigo de continuação da atividade criminosa e um intenso perigo de perturbação da tranquilidade e da ordem públicas”.
A próxima audiência de julgamento está marcada para dia 28, devendo as alegações finais ocorrerem em 04 de novembro.
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