Na primeira sessão de julgamento, que decorre em Lisboa, uma coordenadora de projetos do Conselho Português para os Refugiados (CPR) contou que Tazi, acusado de pertencer ao grupo extremista Estado Islâmico (EI) e de recrutar operacionais em Portugal, a troco de 1.500 euros mensais, foi acolhido na Bobadela em setembro de 2013, assim como Hicham El Hanafi, que, de acordo com a acusação do Ministério Público (MP) português foi radicalizado e doutrinado pelo arguido.
A funcionária do CPR disse que “notou uma relação muito próxima” entre ambos, a que atribuiu, à data, ao facto de ambos serem cidadãos marroquinos, descrevendo Tazi como alguém “inteligente, com um perfil diferenciado, com formação superior, bem informado e com capacidade de liderança”, que parecia ser o “orientador e o mentor”, enquanto Hicham o “mentorado”.
A técnica deu dois exemplos: nos dias com mais significado para os muçulmanos, como a sexta-feira, era o arguido quem “liderava a oração” e também era ele que “incentivava” Hicham a frequentar as aulas de português.
Cerca de três meses após terem sido acolhidos no Centro de Acolhimento para Refugiados (CAR), Abdesselam Tazi, 65 anos, que se encontra em prisão preventiva desde 23 de março de 2017 na cadeia de alta segurança de Monsanto, em Lisboa, e Hicham El Hanafi [detido em França desde 20 de novembro de 2016 por envolvimento na preparação de um atentado terrorista] foram enviados para Aveiro, cidade onde passaram a residir e a ser acompanhados pela Segurança Social.
A técnica disse que o arguido regressou depois várias vezes ao CAR para dizer “olá” e, numa das visitas, perguntou se havia outros cidadãos marroquinos, manifestando a sua disponibilidade para apoiar e ajudar essas pessoas, caso estas fossem enviadas para Aveiro.
A testemunha contou ainda que o irmão de Hicham El Hanafi, acolhido mais tarde no CAR da Bobadela, pediu para visitar o irmão em Aveiro, juntamente com mais dois cidadãos marroquinos.
A técnica referiu que o irmão de Hicham regressou da visita “muito preocupado com o estado do seu irmão”, o qual "estava impedido de sair de casa por Abdesselam Tazi e que passava o dia inteiro a ver filmes de guerra e a ler livros indicados” pelo arguido.
A mesma versão foi confirmada na sessão de hoje por uma assistente social que, à data dos factos, trabalhava no CAR da Bobadela, no apoio a cidadãos marroquinos.
Esta técnica explicou que recebeu um pedido do arguido, quando este já morava em Aveiro, a solicitar que alguns requerentes de asilo, de nacionalidade marroquina, "fossem descentralizados para Aveiro", enumerando três pessoas, uma delas o irmão de Hicham.
Numa primeira fase estes três cidadãos mostraram vontade em seguir para Aveiro, mas após a visita do irmão de Hicham, mudaram de opinião. Segundo esta técnica, o irmão de Hicham El Hanafi contou que este estava “a ver vídeos ligados a práticas terroristas” executadas pelo grupo Estado Islâmico, razão pela qual todos decidiram não seguir para Aveiro.
Na sessão de hoje foram ainda ouvidos um inspetor da Polícia Judiciária que confirmou os autos e disse que o arguido “tinha muita ascendência” sobre Hicham e uma inspetora do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras que se limitou também a confirmar os autos.
A próxima sessão ficou marcada para quinta-feira.
O arguido responde por oito crimes: adesão a organização terrorista internacional, falsificação com vista ao terrorismo, recrutamento para o terrorismo, financiamento do terrorismo e quatro crimes de uso de documento falso com vista ao financiamento do terrorismo.
Segundo a acusação do MP, Abdesselam Tazi deslocou-se várias vezes ao Centro de Acolhimento para Refugiados no concelho de Loures, para recrutar operacionais, prometendo-lhes mensalmente 1.800 dólares norte-americanos (cerca de 1.500 euros).
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