Esta quinta-feira, dia 20 de julho, celebra-se o Dia Nacional da Doação de Órgãos e da Transplantação, o SAPO24 falou com Mafalda Tavares, um exemplo no que diz respeito ao transplante, tendo em conta que no decorrer dos seus 58 anos de vida já fez dois.
O tipo de transplante da Mafalda é o mais comum em Portugal, o de rim, sendo que recebeu um da mãe quando tinha apenas 17 anos e mais tarde, já em adulta, um do irmão, por causa de uma infeção bacteriana na garganta quando ainda era adolescente.
Hoje em dia descobriu a macrobiótica, algo que diz que mudou completamente a sua vida, passando a viver cada vez mais concentrada no poder que os alimentos têm no corpo humano e como estes podem influenciar a saúde.
Neste momento está bem, mas já esteve perto de morrer entre os dois transplantes, sendo que nunca pensou que tivesse de fazer um segundo.
Nesta entrevista, conta-nos como ficou doente, as dificuldades que passou, como as superou, como entrou no “corredor da morte” e como saiu dele. Conta também como é grata aos dadores e familiares que a ajudaram a ter hoje uma vida normal tendo apenas um rim, e como se pode viver bem só com um exemplar deste órgão.
Este é ainda um relato dos momentos mais marcantes da experiência da hemodiálise e como o transplante de rim pode tirar as pessoas deste tipo de tratamento bastante incómodo e invasivo.
Mafalda pede também a quem passa por esta doença “que não tenha pena de si próprio” e que opte por fazer como ela, que aceitem a doença e tentem passar por ela da melhor maneira.
Diz ainda que não é corajosa nem lutadora e que sobretudo gosta muito da vida, uma filosofia que traz consigo, reforçada agora pela descoberta da alimentação macrobiótica.
Como começou a sua doença e esta jornada pelo mundo da transplantação?
A doença começou em 81, tinha eu 16 anos, e na altura vivia no Brasil, com os meus pais e os meus irmãos. Estava num período de férias escolares, no mês de julho, e fui passar esse mês a São Paulo a casa de uns amigos, sendo que na altura vivia no Rio de Janeiro.
Era inverno no Brasil e em São Paulo, nesta altura do ano pode sentir-se mesmo muito frio e eu tive uma grande dor de garganta que imediatamente foi detetada pela minha mãe, que me disse para ir ao médico para, talvez, tomar antibiótico. Confesso que já não sei a que médico acabei por ir, mas acabei mesmo por tomar antibiótico para umas anginas, mas com 16 anos, não fiz a caixa toda do medicamento e, hoje olhando para trás, talvez tenha começado aí a minha doença.
Depois, acabei por voltar ao Rio de Janeiro no fim de julho e foi tudo muito rápido. Comecei a acordar com os olhos inchados, a andar com as pernas muito inchadas quando vinha da escola, em especial nos tornozelos, cheguei a acordar com o lábio superior inchado, e o cabeleireiro também notou que tinha o cabelo mais ralo e fraco. E claro, tudo isto levou os meus pais a preocuparem-se e a levaram-me ao médico.
Até esta altura nunca tinha tido nenhum problema de saúde de maior, nem sequer tinha partido a cabeça como alguns dos meus primos. Nunca tinha estado internada, por isso não existia qualquer razão para se suspeitar de um problema destes.
Quando acabei por ir ao médico, havia duas opções: ou era um problema de rins, ou era coração. Depois de fazer exames que revelaram que tinha uma creatinina elevadíssima, voltei a São Paulo, porque havia lá um médico muito bom de pediatria renal, e rapidamente percebeu que a bactéria das anginas, que tinha tido nas férias e que tinha ficado mal curada, tinha-se alojado nos meus rins, e por azar, nos dois.
Nesta altura já era agosto, e foi-me logo dito que tinha de fazer um transplante. E de repente, a minha vida mudou completamente, aos 16 anos.
Depois de saber o que se passava o que se seguiu?
De um dia para o outro, a minha vida mudou. Passei a ser seguida depois por um médico no Rio de Janeiro, de que gostei imenso, e em setembro comecei a hemodiálise e melhorei imediatamente tudo o que era inchaço. Passei também a fazer uma dieta muito restrita.
Para além de me ter ido abaixo, comecei a fazer aquela questão: Porquê a mim? Porque é que isto me foi acontecer a mim?
Qual foi a parte pior desta altura?
A pior parte, diria mesmo horrível, foi a hemodiálise. Foi muito duro, sofri imenso. Para além de me ter ido abaixo, comecei a fazer aquela questão: Porquê a mim? Porque é que isto me foi acontecer a mim?
Contudo, rapidamente passei a pensar o contrário: Porque não a mim? Porque é que havia de ser a outro? Depois disso passei a pensar que tinha de passar por isto e pronto, não podia fazer nada, e passei.
Fiz nove meses de hemodiálise, com uma excelente equipa médica. Eu era uma miúda e era super mimada por todos os profissionais, porque detestava sangue e agulhas, principalmente estas em particular que eram muito grandes e me faziam chorar, e até nisso fui mimada porque os enfermeiros davam-me uma injeção para não ter dores, algo que tornava tudo aquilo melhor.
Sentia-me especial com este cuidado dos médicos e dos enfermeiros, e até em casa com todos estes cuidados.
Mas entretanto, apesar de passar bem com a hemodiálise, o que me custava mais era ver as pessoas que sofriam muito com aquele tratamento, pessoas mais velhas que tinham picos de tensão e gritavam, muito real naquela altura. No entanto, apesar disto tudo, saía dali a sentir-me bem e mais preocupada com os outros.
Acabei por perder um ano e afastar-me dos meus amigos, fui ficando mais em casa com amigos mais velhos, mas no geral estava bem.
E como surgiu possibilidade de um transplante?
Naquela altura, como hoje aqui em Portugal, já se fazia transplantes de dadores vivos, e propuseram logo ao meu pai e à minha mãe serem testados como possíveis dadores. Eles eram 50% compatíveis comigo e por isso podiam ser meus dadores.
Imediatamente começaram a preparar-se os dois. Primeiro o meu pai, que fez os exames todos, mas entretanto o meu pai era do tipo de sangue 0-, e eu tive uma hepatite nas sessões de hemodiálise devido a uma transfusão de sangue e, sendo 0+, fiquei incompatível com o meu pai.
Nessa altura começou a minha mãe o processo, e nove meses depois de começar este processo consegui fazer o transplante de um rim que funcionava a 50% com doses bastante elevadas de medicação.
Como correu a operação?
Correu muito bem, nunca tive nenhuma dor, aquilo que tive de ultrapassar foi sempre mais psicológico.
A ideia com que fiquei na altura era que o rim ia durar toda a minha vida e foi um choque quando o meu médico me disse que estava a perder o rim
Depois disto, a ideia era que a situação ficasse resolvida para sempre?
Sim, a ideia com que fiquei na altura era que o rim ia durar toda a minha vida e foi um choque quando depois, anos mais tarde, já a viver em Portugal, o meu médico me disse que estava a perder o rim.
Mas posso dizer que depois deste transplante renasci, vivi a minha vida no Brasil, quase que me esqueci que tinha passado por tudo aquilo.
Quais eram as dificuldades de viver só com um rim nessa altura?
Nunca tive dificuldades nenhumas. Tenho uma terapêutica para fazer de manhã e à noite, que faz parte da minha vida desde essa altura e mais nada. Naquela altura, vivia uma vida perfeitamente normal, comia o que queria, ia onde queria, bebia, andava de carro, que era algo que se dizia que não se podia fazer por causa da pressão do cinto de segurança no rim, mas até isso eu fazia.
É importante notar que, quando se é transplantado, o rim fica à frente da barriga e é algo visível, que se sente com uma massagem, por isso a questão de andar de carro, mas nunca abdiquei de o fazer, andei sempre de cinto e ando atualmente e até me esqueço que tenho um problema de saúde.
Outra das coisas que tive de meter logo de parte foi a ideia de ter filhos. Queria viver e não queria prejudicar outra pessoa.
Quando é que começaram a surgir os problemas?
Este rim durou 18 anos. Eu por volta dos 19 anos acabei por vir para Portugal, casei e vivi a minha vida.
Outra das coisas que tive de meter logo de parte foi a ideia de ter filhos. Com a medicação que tomava baseada em cortisona não queria passar isso para a criança e por isso ficou fora de questão. Além disso, queria viver e não queria prejudicar outra pessoa.
Aos 34 anos perdi o rim, estava a ser seguida na Cruz Vermelha de seis em seis meses por um médico que adorava, e numa dessas consultas descobriram que a creatinina estava novamente a aumentar. Sendo aquele um rim mais velho que eu, que era da minha mãe, e com muita terapêutica em cima, houve um desgaste natural.
Desta vez o processo foi semelhante, entrei em hemodiálise de novo e preparei-me para a ideia de um segundo transplante.
Como é que recebeu esta notícia?
Foi terrível, pensei que era tudo a acontecer outra vez, tinha de entrar em lista de espera para um transplante, inscrever-me e esperar… Tudo isto enquanto voltava à hemodiálise.
Como foi voltar a sentar-se na cadeira da hemodiálise?
Quando me sentei a primeira vez acho que ainda não me tinha apercebido do que estava a acontecer e passei a sessão inteira a chorar. Até acho que isso foi terapêutico, porque saiu tudo cá para fora e comecei a encarar isto como um part-time.
Depois, nas sessões seguintes, comecei a encarar a coisa como algo que tinha de ser. Quis sempre fazer as sessões das 8:00 da manhã na Cruz Vermelha e saía por volta das 13:00, portanto era um part-time.
Depois disso, almoçava na casa da minha mãe, dormia e por volta das 4:00 da tarde já estava pronta para sair e viver a minha vida com normalidade. Fazia o jantar, dormia, tudo como se estivesse tudo bem.
Sempre trabalhou?
Nesta fase deixei de trabalhar. Todos os tratamentos deitavam uma pessoa abaixo e, apesar de fingir que estava tudo bem, não era assim.
Alguma vez teve apoio psicológico para lidar com a doença?
Da primeira vez não tive, porque o meu pai achou que não era necessário, apesar de eu achar, e hoje vejo que teria sido bom.
Mais tarde fiz durante um tempo. Não só por causa da doença, mas ajudou bastante.
Como é estar numa lista para receber um transplante em Portugal?
Acho que não entrei na lista logo no início. Primeiro tive de regular os parâmetros das análises, e acabei por me inscrever bastante mais tarde. Foi o hospital que tratou de tudo, eu só dei o meu nome no Hospital de Santa Maria e foi tudo muito rápido.
Estive dois anos a fazer hemodiálise. No primeiro ano ainda não estava na lista, e no segundo era o ano 2000 e achei que ia conseguir um dador vivo outra vez, tinha tudo para dar certo, até a situação se complicar novamente.
Entrei no corredor da morte, foi uma experiência muito marcante.
Como é que a situação se complicou?
Numa das sessões de hemodiálise saí com peso a mais. Era uma sexta-feira e era a altura em que eu estava mais tempo sem o tratamento, tendo em conta que só voltaria a fazer na segunda-feira seguinte.
Eu na altura sabia que havia coisas que não devia comer, como coisas com muito potássio que podem intoxicar o corpo. Depois nessa altura também não urinava, o que mantinha todas estas toxinas dentro do meu corpo, e por isso era necessário alguma contenção, em especial durante o fim de semana.
Confesso que nunca ligava ao facto de sair com peso a mais da hemodiálise. O ideal é sair com menos peso, porque a máquina tira a água que está no sangue. Nessa altura, acabei por sair com peso a mais, era inverno e eu estava constipada e abusei naquele fim de semana.
Bebi, comi feijoada em casa de uns amigos, que é algo que tem muito potássio, e no domingo à noite já estava com uma grande tosse e muito cansada.
Nesse dia, lembro-me que tentei ir dormir mas tive um grande ataque de tosse e levantei-me para não incomodar o meu marido e fui para a sala para me sentar. Quando cheguei, senti-me logo mal, com uma grande vontade de vomitar e uma falta de ar, ainda fui à casa de banho, mas acabei por desmaiar.
Daí fui para o Hospital de Cascais de ambulância. Lá avaliaram que necessitava de fazer hemodiálise urgentemente, mas não tinham uma máquina. Fui então transferida para Santa Cruz, que não era o meu hospital, mas onde conheci uma nova equipa de médicos, todos super novos e que são os meus médicos até hoje.
Tive um processo difícil, acho que entrei no corredor da morte, foi uma experiência muito marcante. Não me lembro de nada do hospital nem da ambulância, só me lembro de acordar já em Santa Cruz com estaladas na cara.
O que é que não se esquece dessa experiência?
Não me esqueço da voz da médica, que ainda hoje conheço.
O que aconteceu depois?
Depois voltei a fazer hemodiálise, e os médicos de Santa Cruz sugeriram que eu tendo 5 irmãos poderia pedir-lhes para fazer os testes para um transplante. Nunca tinha pensado nesta opção porque não queria sujeitar os meus irmãos, que são todos mais novos, a uma operação deste tipo, até porque estava na lista e era jovem.
Mas depois na minha cabeça comecei a pensar que se era jovem, o que eu queria era viver a vida e não estar a fazer aqueles tratamentos e por isso tinha de ter o transplante já.
Virei a história e falei com os meus irmãos, que se prontificaram logo todos para fazer os exames, até porque tinham o exemplo dos pais, e encontrámos um dador num dos meus irmãos.
Um deles tinha todas as compatibilidades necessárias e avançamos para a cirurgia. Depois disso, fiquei boa em seis meses.
Este rim é de um irmão que é sete anos mais novo do que eu, é de um homem e, por isso, neste momento não podia estar melhor com este rim.
Atualmente estou com umas doses de medicamentos menores do que muitas pessoas na mesma situação. Já não tomo cortisona e não tenho grandes queixas.
A alimentação e o cuidado com o corpo têm feito o seu trabalho e estou bem. Hoje sinto-me com 23 anos e não com 58.
Como se lida com esta realidade depois dos 50?
Depois dos 50, percebi que queria durar mais 50 anos. Então, tomei as rédeas da minha saúde e comecei pensar de forma diferente.
Sempre que ia ao médico, cada um me mandava para uma especialidade diferente, para um problema diferente. Então comecei a ser eu a tratar de mim.
Por exemplo, quando tinha colesterol alto, causado pela medicação e por uma questão genética, os médicos estavam sempre a receitar-me nova medicação, que muitas vezes tomava sucessivamente e não fazia efeito. Então, comecei eu por mim a ir fazer análises e fazer uma melhor dieta. Larguei a carne, os lacticínios e descobri a macrobiótica [dieta baseada em produtos de origem vegetal, tendo por base os cereais integrais, complementados com hortícolas, leguminosas, algas e óleos vegetais. O consumo de carne, ovos e produtos lácteos é opcional e o objetivo é conhecer o corpo e as suas necessidades].
Entretanto, este estilo de vida mudou completamente a minha vida, depois de uma consulta com o Dr. Francisco Varatojo, considerado o pai da macrobiótica.
Depois desta consulta, foi claro para o médico que se mudasse relativamente o meu estilo de vida, rapidamente controlaria o colesterol e, hoje em dia, tenho um estilo de vida mais saudável.
Inscrevi-me inclusivamente no Instituto Macrobiótico de Portugal para aprender a cozinhar, e em 6 meses era uma pessoa muito mais saudável. Sou macrobiótica há 10 anos e mudei a minha vida completamente. Quando ultrapassei os 50 anos, os médicos em Santa Cruz começaram a ter mais cuidado com este rim que já vai agora com 23 anos só comigo, e podiam com a idade adicionar-se mais problemas. Mas não, a alimentação e o cuidado com o corpo têm feito o seu trabalho e estou bem, não tenho queixas. Hoje sinto-me com 23 anos e não com 58.
Ter só um rim pode causar problemas no corpo do dador, visto que conhece os seus?
Eu acho que não, e os médicos sempre me disseram que não. Mesmo a minha mãe e o meu irmão, que também têm agora só um rim e vivem uma vida normal, nem se apercebem desta situação.
A minha mãe que é uma pessoa de idade não tem mais infeções urinárias por só ter um rim.
Ou seja, quem dá não terá uma vida muito diferente?
Diria que não. A minha mãe fez 80 anos esta semana e está super saudável fisicamente. Claro que tem outros problemas de saúde, mas nada a ver com o rim. O meu irmão, da mesma forma, é vigiado anualmente enquanto dador, e nestes anos todos nunca teve nada.
No caso do meu irmão, é inclusivamente um homem atento à sua saúde, que come a minha comida macrobiótica e acredito que isso também o ajude.
Eu até posso contar que, quando eu andava a fazer hemodiálise, este meu irmão vivia em casa da minha mãe, e quando eu ia almoçar lá a casa diariamente depois dos tratamentos ele via-me sempre naquele estado de cansaço. Eu sei que ele dizia às minhas irmãs que tinham de fazer alguma coisa e foi ele que contactou muito mais de perto com a minha parte má, porque eu tentava sempre parecer bem à frente de outras pessoas, mas ele via o pior e depois foi ele a ajudar-me.
Acho que isto é um ato de tanta generosidade e não sei se eu o teria feito ao contrário, não me posso pôr do lado dele. Os meus irmãos são todos uns corajosos e este meu irmão fez uma coisa muito bonita.
Só depois do meu irmão dar o rim é que foi pai. O meu sobrinho tem 14 anos e o meu rim 23, e em nada afetou essa parte da vida dele, vive uma vida normal.
Vivo cada dia, posso morrer amanhã de outro problema qualquer e por isso não é algo que esteja na minha cabeça.
Como se perspetivam os próximos anos a entrar nos 60?
Se eu intelectualizar muito a situação, talvez possa considerar que este rim não vai ser para sempre, como o outro, mas eu não penso nisso diariamente. Vivo cada dia, posso morrer amanhã de outro problema qualquer e por isso não é algo que esteja na minha cabeça.
Tenho médicos que me dizem que este rim é mesmo muito compatível comigo e vai durar até aos 90 e é nisso que eu acredito. Claro que se surgir uma surpresa vou ter que lidar com ela, mas não penso no assunto.
Esta previsão dos 90 anos foi até antes de eu ser macrobiótica, por isso agora deve ser até aos 100.
As pessoas dizem sempre que sou corajosa, que sou lutadora. Eu não acho, eu simplesmente aceitei que fiquei doente e passei por isso da melhor maneira.
Que conselhos dá a quem passa pelo mesmo?
Que não tenham pena de si próprios. Que não pensem muito naquela questão - Porquê eu? - pensem mais: Porque não nós?
As pessoas dizem sempre que sou corajosa, que sou lutadora. Eu não acho, eu simplesmente aceitei que fiquei doente e passei por isso da melhor maneira.
Uma coisa eu sei: gosto muito da vida e existem muitas coisas que eu quero viver. E se calhar agarrei-me muito a isso, aceitando aquilo que me acontece e com muita esperança de que, acreditando na medicina, um dia eu iria estar bem. Hoje em dia, sei que existem pessoas que estão pior e, dentro das circunstâncias, sinto-me uma sortuda porque nunca tive dores físicas, que era o que mais me apavorava.
A pior recordação será sempre o tempo da hemodiálise, as horas intermináveis sentada naquela cadeira ou cama. Costumava ler, devorar caramelos, dormia, mas eram quatro horas de tédio horríveis. O pior era ver os outros e continuo a ter esse sentimento em relação aos outros, ainda hoje tenho com pessoas que ficam doentes, porque eu sei como é.
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