O apelo do chefe de Estado para se "dotar o sistema internacional do reformismo urgente de que ele carece, integrando melhor, para o salvaguardar" foi feito numa mensagem em vídeo gravada para a 6.ª Conferência de Lisboa, uma iniciativa do Clube de Lisboa.
Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, "o mundo está, de facto, dividido" e é preciso reformar o sistema institucional para "tentar esbater as divisões que se acentuam na política internacional", com "dezenas de conflitos espalhados pelos vários continentes".
"Também por outra razão: a interpretação do direito internacional, em permanente depreciação, indica um desconforto com as suas regras, na definição de condutas e valores, como a Carta das Nações Unidas – seja na estabilidade de fronteiras, na preservação da soberania, no cumprimento do direito humanitário e no uso da força militar", apontou.
O Presidente da República defendeu que "só reforçando as organizações do multilateralismo e do direito internacional" se pode "recriar um roteiro de normalização das relações entre estados e entre estes e as suas sociedades" que permita "compromissos globais, que são fundamentais, acerca de alterações climáticas, conflitualidade, migrações, transições energética e digital e combate à pobreza e desigualdades".
Marcelo Rebelo de Sousa realçou o crescente fosso entre ricos e pobres e o aumento das desigualdades entre regiões, "num efeito gerador de vagas migratórias forçadas a que se juntam fenómenos climáticos cada vez mais extremos".
A seguir, alertou para a "fragilidade dos sistemas políticos existentes", incluindo sistemas democráticos: "Começa logo na fragilidade do sistema norte-americano. Continua na fragilidade dos sistemas europeus, e particularmente fortes na União Europeia".
Na opinião do chefe de Estado, "o que se passa com eles é a falta de visão da corrosão interna, no sistema de partidos, no sistema político global, no sistema de parceiros económicos e sociais", e "é impressionante essa degenerescência".
"Se não enfrentarmos essas fragilidades, haverá conflitualidade, radicalização, movimentos e forças sistémicas e antissistémicas, dificultando tudo o que se possa querer fazer no plano internacional", advertiu.
Por fim, o Presidente da República considerou que se vive "um fim de ciclo" com alterações na geopolítica mundial, que "a própria crise interna do sistema político americano tem confirmado e potenciado", o mesmo se aplicando "em sistemas europeus".
De acordo com Marcelo Rebelo de Sousa, mesmo não havendo tão depressa "uma nova ordem internacional", pode haver "outra balança de poderes", com reajustes nas potências globais e regionais e efeitos em conflitos atuais.
"Mas não é só nesse plano geopolítico global que estamos em fim de ciclo. Estamos em fim de ciclo nas lideranças. Cumpriram a sua missão, terminaram esse ciclo, uma ou outra prolonga-se neste período de transição, mas é excecional", acrescentou.
Neste contexto, Marcelo Rebelo de Sousa insistiu que é necessário "dar passos no sentido da reconstrução dos sistemas fragilizados".
"Se sabemos aquilo que queremos, quais os valores internacionais, quais os valores humanos, quais os direitos fundamentais, quais as regras e os princípios que importa fazer valer, então mudemos o que não funciona em termos de sistema, em termos de operacionalidade de comportamentos, enquanto é tempo", afirmou.
O Clube de Lisboa é uma associação para a promoção de conferências, debates e estudos, que tem como finalidade projetar Lisboa como lugar de reflexão e de iniciativas sobre temas relevantes da agenda internacional.
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