Ao longo de 35 páginas a que a agência Lusa teve acesso, David Neeleman respondeu às 80 perguntas que lhe foram enviadas pela comissão parlamentar de inquérito à TAP, entre as quais se “houve tentativas de interferência do Governo na operação da TAP”.
“Eu não era administrador executivo e, portanto, não estava envolvido na operação diária. Mas é público e notório que o Governo em vários momentos procurou pressionar a administração e/ou a Comissão Executiva”, refere, dando depois um conjunto de exemplos.
Entre estas tentativas de pressão está, segundo o antigo acionista, o “caso grave” do bloqueio da oferta pública de venda, “em que, sem razões objetivas, o Estado/Parpública em incumprimento claro com o que tinha assumido no Acordo Parassocial, impediu que a empresa fosse colocada em bolsa”.
“Infelizmente, os administradores nomeados pelo Estado não atuaram com independência e no melhor interesse da TAP e decidiram vetar o IPO. Optaram por tomar uma decisão assente em juízos de oportunidade política de curto prazo e de agradar a um eleitorado específico”, critica.
Neeleman lamenta ainda que se tenha transformado num “caso público” o pagamento de remuneração variável aos trabalhadores, o que diz ser “um incentivo normal no mercado e um importante fator de alinhamento de interesses entre empresa e trabalhadores”.
“Durante esses dias, o Governo pressionou a nossa Comissão Executiva e em particular o CEO, de uma forma lamentável e inaceitável, para que não pagasse as remunerações variáveis. Foram pressões muito duras através de mensagens de telemóvel e reuniões com o próprio Ministro das Infraestruturas. Felizmente, o CEO teve coragem para não ceder às pressões e a Comissão Executiva acabou por pagar as remunerações variáveis, que eram devidas”, recorda.
Outro exemplo, segundo Neeleman, é a “definição de determinadas rotas internacionais”.
“Havia grande dificuldade em perceberem, no Governo de então, que uma coisa é o Estado ter uma palavra a dizer na estratégia de uma empresa, outra muito diferente, é interferir numa gestão independente e que, precisamente porque é independente, está em melhores condições de cumprir com a sua obrigação fiduciária de proteger, em primeiro plano, o melhor interesse da companhia”, refere.
Questionado sobre a relação com o ex-ministro das Infraestruturas e da Habitação Pedro Nuno Santos, o antigo acionista começa por referir que o socialista foi “sempre bastante transparente nas suas intenções e foi sempre respeitador no trato pessoal”.
“Mais recentemente, fiquei muito dececionado com ele por ter feito graves acusações na sua audição na Comissão de Economia, Obras Públicas, Planeamento e Habitação contra a minha honra e reputação, dizendo que poderíamos ter enganado todos os Governos, fundamentando a sua acusação numa avaliação que ninguém conhece sobre preços de aviões feita sete anos depois da data da compra e contrariando nove avaliações (3 por cada modelo), feitas por entidades independentes”, escreve.
Segundo o Neeleman, “tamanha irracionalidade” só pode ser entendida “por necessidade de desviar as atenções dos contribuintes portugueses dos erros grosseiros cometidos nos anos de gestão pública da TAP”.
“Até posso entender que no contexto de um processo de reestruturação da TAP, como o que está a decorrer, pretendam renegociar com a Airbus os preços então acordados, mas não posso aceitar que o façam à custa da minha honra e reputação”, avisa.
Na audição de 6 de junho, Pedro Nuno Santos disse que “é possível” que o país tenha sido enganado com o negócio dos aviões Airbus para a TAP, e que, a confirmar-se, é preciso exigir a revisão dos contratos.
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