Num debate no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, no dia seguinte ao chumbo do acordo de saída pelo Parlamento britânico, Michel Barnier disse que uma saída ordenada continua a ser “a prioridade absoluta” da UE, que deve, todavia, preparar-se para o cenário que sempre quis evitar, o de um “não acordo”, cada vez mais provável.
Na terça-feira, os deputados britânicos rejeitaram o acordo negociado pela primeira-ministra Theresa May para a saída do Reino Unido da UE, numa votação que o negociador-chefe da UE para o 'Brexit' considerou "clara como água", já que o acordo teve 432 votos contra e apenas 202 a favor.
“No momento em que vos falo, nenhum cenário pode ser excluído, e isso é particularmente verdade no caso do cenário que sempre quisemos evitar, o de um ‘não acordo’. Estamos em 16 de janeiro, a 10 semanas apenas do final do mês de março, ou seja, do momento escolhido pelo Governo britânico – escolhido pelo Governo britânico, repetiu – para se tornar um país terceiro. E hoje, a 10 semanas dessa data, jamais o risco de um ‘não acordo’ foi tão elevado”, declarou.
Insistindo que a vontade da UE a 27 “continua a ser evitar tal cenário”, Barnier apontou que também é necessária lucidez, pelo que vão ser intensificados os esforços para preparar essa eventualidade, que já foram iniciados há meses, num trabalho conjunto da Comissão Europeia, dos seus serviços e do secretariado-geral, em ligação com os Estados-membros e Parlamento Europeu.
“O trabalho vai ser acelerado, em ligação com todos os atores”, disse, apontando que serão acertadas “medidas de urgência para fazer face às eventuais consequências”.
Barnier, que na quinta-feira estará em Lisboa para participar, a convite do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, no Conselho de Estado, para abordar “as perspetivas para as futuras relações com o Reino Unido”, disse hoje no plenário de Estrasburgo que, neste momento, “é muito cedo para avaliar todas as consequências” do chumbo do acordo de saída, que está associado a uma declaração política também negociada entre a UE e Londres sobre a futura relação entre as partes, que se quer “próxima e ambiciosa”.
O negociador-chefe da UE reiterou a profunda convicção de que o acordo negociado ao longo de 18 meses com Londres “é ainda hoje o melhor compromisso possível”, e recordou que foi “fruto de um trabalho construtivo” conjunto com o Governo britânico, e que teve em conta as “linhas vermelhas” traçadas pelas próprias autoridades britânicas.
“O que o voto de ontem (terça-feira) mostrou é que as condições políticas para a ratificação ainda não estão reunidas em Londres. Constatamos, ao escutar as declarações públicas dos deputados da Câmara dos Comuns que votaram contra, que o fizeram por motivações muitas diversas, por vezes contraditórias”, disse.
Para Barnier, este voto “não é a manifestação clara de uma maioria positiva que defina um projeto alternativo ao acordo que está hoje sobre a mesa. Nesse contexto, cabe às autoridades britânicas fazer hoje ou amanhã uma avaliação desse voto e indicar como pretende proceder para uma saída ordenada em 29 de março”, disse.
Barnier insistiu que, “contrariamente ao que foi dito nas últimas semanas e nos últimos dias, o acordo alcançado com o Reino Unido é um bom acordo”, sobretudo porque “dá segurança jurídica em todos os setores em que o ‘Brexit’ criou incerteza, a começar pela segurança jurídica para os cidadãos, relativamente aos seus direitos”.
“A proteção desses direitos continuará a nossa prioridade em qualquer cenário”, disse.
No debate participou também o primeiro vice-presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans, que lamentou igualmente a votação do parlamento britânico, dado ter reprovado o que considerou ser “o melhor desfecho possível”.
“Temos de esperar pelo que se vai passar. Mas também temos a obrigação de estar preparados para qualquer cenário, incluindo uma saída desordenada. A Comissão estará bem preparada para assegurar que reagiremos a qualquer desfecho”, disse.
A concluir, Timmermans – que é o candidato dos Socialistas Europeus a presidente da Comissão Europeia, no quadro das próximas eleições europeias – concluiu a sua intervenção citando um escritor britânico, Clive Staples Lewis: “Não podemos voltar atrás e mudar o início. Mas podemos começar onde estamos e mudar o fim”.
Por fim, também a atual presidência romena do Conselho da UE, representada no debate por Melania Ciot, lamentou o resultado da votação da véspera, que “torna a saída desordenada mais provável, com efeitos negativos para todos, sobretudo para o Reino Unido”, e indicou que, pela sua parte, vai prosseguir “os preparativos para todas as possibilidades, incluindo o cenário, não desejado, de um não acordo”.
O Parlamento britânico reprovou terça-feira à noite de forma expressiva o acordo de saída do Reino Unido da União Europeia negociado pelo Governo da primeira-ministra Theresa May com Bruxelas, com 432 votos contra e 202 a favor.
Com este chumbo, a dois meses e meio da data prevista para a saída do Reino Unido do bloco europeu (29 de março), o processo fica com um futuro incerto, insistindo a UE que cabe agora às autoridades britânicas clarificar como pretende proceder a partir de agora.
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