A pandemia abriu o debate desta quinta-feira na RTP3, que de confronto — na verdadeira acepção do termo — teve pouco. Abriu e dominou-o nos primeiros minutos. Quem primeiro falou foi o Marcelo-Presidente e não o Marcelo-candidato.
O 'professor catedrático' — por oposição ao 'calceteiro' Vitorino Silva —, demorou-se na análise ao aumento de novos casos diários e sobre a realização de eleições em tempo de pandemia.
"Há condições para votarmos com o mínimo de segurança?" questionou o jornalista e moderador Carlos Daniel, lembrando que o tema dominou o debate do dia anterior entre Ana Gomes e Vitorino Silva.
Segundo Marcelo, face ao possível agravamento da crise pandémica, com um aumento de contágios pelo novo coronavírus, "há em cima da mesa dois cenários".
"O primeiro cenário é de regressarmos a quatro mil, cinco mil, seis mil casos por dia", o que "significaria regressar àquilo que era o regime vigente até agora", apontou o Presidente. Já no caso de a evolução da pandemia "continuar neste ritmo mais elevado", alertou Marcelo Rebelo de Sousa, "então aí vai ter que se ponderar um confinamento muito mais rigoroso, exceto porventura o encerramento de escolas".
Mesmo com um agravamento das medidas, a campanha eleitoral não estará em causa, lembra Marcelo. Isto porque "a atividade política está salvaguardada por lei, e deve ser salvaguardada em qualquer caso pelo decreto presidencial e pela sua execução". Também o desconfinamento para permitir às pessoas deslocarem-se aos locais de voto será "obviamente" tido em conta, garantiu, antecipando que no dia 24 de janeiro "haverá liberdade de circulação, de deslocação, permitindo o exercício do direito de voto".
Marcelo Rebelo de Sousa disse ainda que quando marcou as eleições, a 24 de novembro, como Presidente, sublinhou, ponderou esta possibilidade de agravamento da situação e que a colocou aos partidos — que concordaram em não adiar a eleição.
"Ao contrário das outras eleições, quanto às eleições presidenciais, a Constituição, ela própria, fixa os termos que determinam a data, ou as datas possíveis da eleição, porque a data é fixada em função do termo do mandato anterior do Presidente, o que significa o quê? Que para haver um adiamento, e por isso perguntei aos partidos políticos, era preciso haver revisão constitucional", explicou, notando que só pode acontecer por iniciativa do parlamento e que não é "muito fácil" que possa acontecer "em tempo útil".
- “Há muita gente que não vai votar porque tem medo” - Vitorino Silva
- “O seu voto [de Marcelo] é tendencialmente idoso, o meu voto é o voto caviar e sardinha. Mesmo que eu tenha mais votos sardinha que caviar, porque há mais sardinhas… Nas últimas eleições não consegui chegar ao voto caviar” - Vitorino Silva
- "Tenho a certeza que o Partido Socialista não vai votar em Marcelo” - Vitorino Silva
- “António Costa não quer que Marcelo tenha 70% dos votos” - Vitorino Silva
- "A minha intenção não era fazer 10 anos de mandato. A pandemia foi um fator determinante na minha recandidatura" - Marcelo Rebelo de Sousa
- "Depois de 2023 o povo é quem mais ordena" - Marcelo Rebelo de Sousa
- "O comentador Marcelo morreu no dia em que foi eleito o Presidente Marcelo" - Marcelo Rebelo de Sousa
- "[Tino de Rans] deve continuar como comentador se não for eleito Presidente" - Marcelo Rebelo de Sousa
- "Nestas eleições ninguém vai votar na direita ou na esquerda eleições. A direita e a esquerda não vão a votos, vão as pessoas" - Vitorino Silva
- "Quando subo a rua, a minha casa fica à direita; quando desço, a minha casa fica à esquerda. Eu moro numa casa à direita ou à esquerda? Depende se estou a descer ou a subir" - Vitorino Silva
- "Tenho um saco azul do IKEA onde guardo as minhas ideias" - Vitorino Silva
- "Em Penafiel não só se morre, também se nasce. E o bebé do ano é de Rans e nasceu à 00h00" - Vitorino Silva
- "Quero que vá a Penafiel fazer campanha. Vai pela direita e eu vou pela esquerda" - Vitorino Silva
- "Sondagens só no dia seguinte" - Marcelo Rebelo de Sousa
- "Eu ando no terreno e sei que vou ter muitos votos" - Vitorino Silva
- "Sou um candidato do norte num país desnorteado" - Vitorino Silva
A relação com o executivo no segundo mandato
No debate com Vitorino Silva, transmitido pela RTP3, Marcelo Rebelo de Sousa confirmou que a sua intenção não "era fazer os dez anos em Belém" e que a pandemia foi "um fator determinante da recandidatura". Nada de novo, no entanto.
Já sobre como será o seu segundo mandato, nomeadamente na relação com o executivo, Marcelo deu a entender que, no que depender de si, a atual legislatura decorrerá até ao seu término.
"Até 2023, do que depender do Presidente, a legislatura deve durar. Estamos em pandemia e vamos ter uma crise económica e social profundíssima. Uma crise política em 2021 ou 2022 será má. Depois de 2023, o povo é quem mais ordena. Elege a esquerda, será [um Governo] de esquerda; elege a direita, será [um Governo] de direita", disse.
O embalo
Ao acusar o Presidente de "embalar" o primeiro-ministro, e vice-versa, Vitorino Silva defendeu que isso aconteceu pois Marcelo Rebelo de Sousa tinha interesse num segundo mandato e no apoio do PS à recandidatura — o que não se confirma.
Ana Gomes concorre para o segundo lugar
Vitorino Silva acredita que terá "muitos votos" do eleitorado socialista. Primeiro, diz o candidato de Rans, porque "o PS não vai votar Marcelo". Depois porque "o objetivo de Ana Gomes é ficar em segundo" e o voto dos socialistas que não querem ficar em segundo lugar pode transferir-se para si.
A auto-avaliação e a "nota 14"
Vitorino Silva, se fosse "professor ou comentador", não teria problemas em "dar nota positiva" ao mandato de Marcelo Rebelo de Sousa. Sem justificar, e desafiando Marcelo a fazer a sua auto-avaliação, disse que lhe dava "nota 14" — o que é equivalente a um Satisfaz/Suficiente.
"O comentador Marcelo morreu no dia em que foi eleito o Presidente Marcelo", respondeu o adversário. Mas Tino de Rans deve "continuar a sua veia de comentador se não for eleito Presidente”, destaca o chefe de Estado.
O popular, o popular-populista e populista-popular
Para Vitorino Silva, nestes eleições há "dois políticos muito carismáticos": ele e Marcelo. Mas "candidatos populares há três": ele, Marcelo e André Ventura.
"Há o só popular, que sou eu. Depois há o popular-populista e depois o populista-popular", explica, sendo Marcelo Rebelo de Sousa o popular-populista "sem se aperceber".
"Populista é aquele que diz aquilo que as pessoas querem ouvir. Por definição, o Presidente da República tem muitas vezes que dizer coisas que as pessoas não querem ouvir, uns gostam, mas muitos não gostam", defendeu-se Marcelo.
As folhas e as ideias que se evaporam
"Há quem pense que tenho gurus e que tenho uma grande equipa, uma agência", diz Tino de Rans. "Enganam-se!". "Há 49 anos que me preparo", diz colocando em cima da mesa do estúdio um conjunto de folhas.
"Mostre, mostre", pediu, curioso, Marcelo Rebelo de Sousa. "Todos os meus pensamentos estão nestas folhas, toda a minha campanha está aqui. Se não registar as ideias, elas evaporam", explica o candidato de Rans.
Abstenção e juventude, "dois temas fundamentais"
Em sintonia "em dois temas fundamentais", Marcelo concorda com Vitorino Silva quando este considera que o "voto é o maior património". "Não há nada pior do que os sistemas onde a abstenção vai subindo", disse o chefe de Estado. "As democracias vivem da participação”, defendeu ainda o Presidente em funções.
O candidato do RIR (Reagir Incluir Reciclar) disse também ficar "muito triste quando a abstenção é jovem". “Quero fazer tudo por tudo para os jovens votarem (…) Dizem que os jovens não se interessam pela política; os jovens interessam-se pela política, não se interessam é por políticos. E nós somos os culpados por os jovens não se interessarem na vida pública".
Quem assistiu.
Contrastando com o registo de outros debates, pautados por atropelos no discurso, neste não houve "casos ou casinhos". Foi meia hora simpática, de uma troca saudável de ideias. Uma conversa entre dois amigos — "o amigo Vitorino" vs. "o amigo Marcelo" — que se candidatam à Presidência da República.
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