
Nos últimos anos, os especialistas têm alertado para o aumento do número de diagnósticos de cancro em pessoas com menos de 40 anos, uma tendência que desafia a ideia de que a doença é sobretudo associada à idade avançada.
Apesar de serem menos frequentes do que em idosos, os cancros em jovens tendem a ser diagnosticados em fases mais avançadas, muitas vezes por falta de rastreio ou subvalorização dos sintomas.
Os cancros de início precoce, diagnosticados em pessoas com menos de 50 anos, cresceram globalmente em 79%, refere a CNN.
A recente revelação da cantora Jessie J, de 37 anos, diagnosticada com cancro da mama em fase inicial, reacendeu o debate sobre a importância do autocuidado e da deteção precoce, mesmo em idades consideradas menos “prováveis”.
João Vasco Barreira, oncologista, confirma ao SAPO24 que "o número de novos casos, ou seja, a incidência de cancro na população jovem, está a aumentar". O especialista destaca o maior número de diagnósticos de cancro da mama na faixa entre os 30 a 40, 40 a 50. "Por isso, houve necessidade de adaptar a idade dos rastreios, acaba por ser uma consulta personalizada", explica.
A vigilância passa a ser feita de forma personalizada, respeitando os fatores de risco de cada pessoa.
Estudos internacionais indicam que os cancros de início precoce — incluindo mama, cólon, estômago e fígado — têm vindo a aumentar entre os 25 e os 39 anos, segundo a Agência Internacional para a Investigação em Cancro.
As razões elencadas pela American Cancer Society incluem alterações no estilo de vida, sedentarismo, alimentação processada, stress crónico e hereditariedade. João Vasco Barreira aponta ainda outros fatores, como a presença de "disruptores endócrinos" no ar e na alimentação. Trata-se de "substâncias químicas que estão presentes durante a nossa vida, devido à exposição ambiental a partículas que podem interferir com o nosso sistema hormonal do corpo e ter um comportamento negativo".
O especialista explica que "todos temos, todos os dias, potenciais células que se podem vir a tornar cancro, mas a maioria tem um sistema imunitário que é capaz de destruir este ciclo vicioso".
Contudo, "numa pessoa que tenha hábitos de vida não saudáveis, por exemplo, o stress, a falta de um sono não reparador, uma alimentação rica em gordura saturada, ou seja, não diversificada nos nutrientes-chave, e a somar a isso também aqueles microplásticos que podem estar na comida", a probabilidade de contrair a doença é maior. "O risco é sempre cumulativo", nota, e a principal arma de combate é, "dentro da bagunça e azáfama do dia a dia, saber arranjar tempo para cuidar de nós próprios".
A primeira e principal preocupação é a prevenção
"A prevenção é chave", lembra João Vasco Barreira. Aliado à atenção, um comportamento saudável pode ser transformador. O especialista desenha uma "tríade simplista que nos vai guiar a uma vida com longevidade e com saúde", sustentada em três pilares fundamentais: sono, nutrição e exercício físico.
"Temos que ter um sono reparador pelo menos oito horas por dia, há cada vez mais estudos publicados com um alto fator de impacto a mostrar o benefício de um sono reparador ao longo da nossa vida, juntamente com o benefício que traz na saúde física e mental da pessoa", evidencia.
Além de "uma nutrição equilibrada e exercício físico, devemos conseguir afastar-nos de tudo o que sejam fatores de risco carcinogénicos, seja o consumo de tabaco, drogas recreativas, a obesidade, principalmente com o advento de nova medicação".
A World Cancer Research Fund recomenda ainda:
- Manter um peso saudável e ser fisicamente ativo,
- Comer cereais integrais, legumes, fruta e leguminosas,
- Limitar o consumo de 'fast food',
- Limitar o consumo de carne vermelha e processada,
- Limitar bebidas com adição de açúcar,
- Moderar o consumo de álcool,
- Não usar suplementos para prevenir o cancro,
- Para mães: amamentar o seu bebé, se possível.
Sensibilizar e alertar
Celebridades que partilham publicamente os seus diagnósticos podem contribuir significativamente para a sensibilização da população. Testemunhos como o de Jessie J ajudam a normalizar a conversa sobre o cancro, a reduzir o estigma e a incentivar o autocuidado e os exames regulares.
Segundo o oncologista, "o facto destas figuras públicas abordarem o caso, falarem publicamente, consciencializa os mais jovens", algo que nota durante as consultas, com os pacientes com quem vai contactando.
Estas partilhas têm impacto especialmente junto dos mais jovens, que muitas vezes não se sentem representados nas campanhas de saúde pública tradicionais, e idolatram estas figuras como exemplos a seguir.
Afinal, o cancro "não é uma doença de idosos apenas, existe numa idade jovem, a partir dos 20, 30, 40. É importante a perceção em relação ao nosso próprio corpo e aos sinais e sintomas para que devemos estar alerta".
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