Uma tendência para continuar? O SAPO24 foi tentar sabê-lo e as respostas apontam nesse sentido. Há mesmo quem defenda que seja uma obrigatoriedade.

Carolina Alves, que celebrou o seu casamento em 2018, optou por esta 'solução' e explica as razões.

“Casei e quero que seja para a vida, mas hoje em dia encaramos a dita vida com outros olhos. Penso que há alguns anos a questão do regime do casamento nem se colocava, era comunhão de adquiridos [os bens adquiridos após casamento são dos dois] e estava feito, nem olhavam a outras soluções. Agora, pensamos em tudo, ouvimos o que se passa aqui e ali e ficamos a pensar. Penso que não muda nada, se casámos foi a pensar que era para a vida, se correr mal, cada um de nós tem de arcar com as devidas consequências dos atos que tomámos, nomeadamente dívidas”, disse Carolina, de 26 anos, residente em Proença-a-Nova.

Pelo mesmo diapasão afina a advogada Carla Neto, habituada aos corredores dos tribunais devido a questões como estas. “Podem pensar que são poucos os casos, mas há muitos casais que, após divórcio, vão para tribunal exigir isto e aquilo do outro, alegadamente porque o outro fez isto e aquilo sem a sua autorização, mas a verdade é que assumiram isso mesmo quando assinaram o papel de casamento”, começou por assinalar a advogada, explicando depois a sua visão do novo panorama dos casamentos no nosso país.

“Hoje em dia os casamentos são mais curtos, há mais divórcios, nomeadamente no papel. E quem casa sabe disso mesmo e analisa tudo antes do enlace. Não tem nada a ver com sentimento, mas sim com raciocínio. Já ninguém pensa que tem de assumir um compromisso para a vida, vivem o dia a dia e, por isso, quando casam, já muitos optam então pela separação de bens. Já ninguém tem de assumir uma dívida que foi o outro membro do casal a assumir enquanto casados. Acredito que os números até venham a aumentar nos próximos anos”, disse, salientando depois que a pandemia de Covid-19 “ajudou nesta tendência”.

"Agora, pensamos em tudo, ouvimos o que se passa aqui e ali e ficamos a pensar. Penso que não muda nada, se casámos foi a pensar que era para a vida, se correr mal, cada um de nós tem de arcar com as devidas consequências"Carolina Alves

“Sem dúvida, foram muitos meses juntos, entre casais, durante 24 horas. Muitos separaram-se, muitos ainda estão a ver se se separam e essas histórias chegam aos ouvidos de amigos e familiares que estão ainda para se casarem. Vão existir, cada vez mais, casamento com separação total de bens, não tenho dúvidas. Consultas nesse sentido? Sim, cada vez mais. Recebo muitos clientes que, antes de casarem, querem tirar dúvidas e procuram conselhos. Claro que não posso ditar o que vão escolher, mas explico tudo ao pormenor, tudo o que pode acontecer depois de um eventual divórcio e a verdade é que a grande maioria desses tem escolhido o regime de separação de bens”, refere.

Separação de bens

Este regime permite a salvaguarda do património perante terceiros. Assim, o regime de separação total de bens dita que os cônjuges mantêm todo o seu património separado – tanto o que levarem para o casamento como aquele que vai ser adquirido posteriormente à data. Aqui também está englobado tudo o que escolherem para o dia do casamento, como as alianças de casamento, o vestido e o fato do noivo, habitação, carro e tudo o que venham a adquirir após darem o nó.

Como optar?

Como este regime não é o assumido por defeito nos casamentos, é necessário que seja estabelecida uma convenção pré-nupcial para comprovar o consentimento de ambas as partes neste regime. Essa convenção antenupcial é celebrada por escritura pública, pelo conservador ou num cartório notarial. Após estabelecer a convenção, o casamento tem de ser realizado no espaço de um ano – caso a convenção tenha sido celebrada por escritura pública – ou dentro do prazo acordado para a sua realização, se o casal optou por uma convenção lavrada pelo conservador do registo civil. Normalmente, os noivos que decidem optar por este regime não têm a intenção de partilhar o seu património.

Se Carolina Alves e Carla Neto acreditam que esta tendência é para continuar e crescer, Pedro Santos, outro que optou por este regime em plena pandemia, 2020, assina por baixo.

“Tem a ver com a forma de pensar de cada um. Foi um pensamento que sempre tive, nomeadamente quando assumi, na altura com a minha namorada, o casamento. Falámos e contei-lhe o que pensava. Ela, numa primeira etapa, não entendeu, mas aos poucos foi vendo que era o mais correto e leal para cada um. As nossas vidas profissionais são, e eram, totalmente distintas, com salários totalmente diferentes. Temos a nossa vida, partilhamos tudo o que há para partilhar em casa, na vida social, etc. Mas fazemos alguns investimentos à parte, sempre assumido e sempre será assim. Não quer dizer que não use um bem material meu, que investi, no meu casamento, mas é apenas uma segurança”, disse Pedro, considerando que até deveria existir uma lei neste sentido.

"Claro que não posso ditar o que vão escolher, mas explico tudo ao pormenor, tudo o que pode acontecer depois de um eventual divórcio e a verdade é que a grande maioria desses tem escolhido o regime de separação de bens"Carla Neto, advogada

“Muitos não pensam nisto e atiram-se de cabeça. Penso que estes regimes deveriam terminar, porque o outro não tem de arcar com más decisões do outro cônjuge. Eu sei que ninguém aponta uma pistola à cabeça, após o casamento, para que o outro, mais renitente, assuma uma dívida, por exemplo. Mas quando estamos casados é muito mais complicado dizer que não, por isso penso que deveria ser lei, casar com separação de bens, ou algo semelhante”, concluiu Pedro Santos, de Torres Vedras.