Assinalam-se hoje os 20 anos do Bloco de Esquerda, cuja assembleia de fundação aconteceu em 28 de fevereiro de 1999, em Lisboa, uma nova força política que resultou em grande parte da união entre três partidos, entretanto já extintos: Partido Socialista Revolucionário (PSR), União Democrática Popular (UDP) e Política XXI.
“O Bloco mostrou uma realidade que é muitíssimo profunda, e tenha cuidado quem se enganar sobre isso porque são raízes populares, são militantes com dezenas de anos da atividade, são gente nova que sabe o que está a fazer”, avisa Francisco Louçã.
Segundo o fundador e antigo coordenador, o BE “foi o primeiro partido da esquerda europeia com o formato que depois foi repetido com particularidades na Alemanha, em França, em Espanha”.
“Tudo o que há de novo na esquerda europeia com sucesso são imitações do Bloco de Esquerda. E foi, além disso, o primeiro de todos esses partidos que fez uma renovação de geração de direção”, destaca.
Do panorama político do final dos anos 90, quando o partido nasceu, Francisco Louçã recorda a pesada derrota no referendo à despenalização do aborto em Portugal, através da qual se constatou que “era preciso muito mais do que uma junção de esforços numa coligação ocasional por eleições”, mas sim “um novo partido, uma nova força, uma nova esperança, um novo movimento”.
“O que eu acho que o Bloco procurou sempre contrariar foi a ideia de que a fragmentação é o caminho da esquerda, a ideia de que se uma pessoa tem uma opinião diferente deve fazer o seu partido. Isso tem uma história tremenda na esquerda portuguesa”, defende.
A “paciência impaciente e o esforço permanente” que caracterizam a criação do partido, na perspetiva do fundador, “começou com a ideia de que não podia continuar a haver uma esquerda espartilhada entre pequenas forças” que, apesar do seu valor, não faziam “política que mudasse a vida das pessoas”.
Apesar de a proposta ser ousada, o antigo dirigente recorda que o entendimento entre as várias correntes “foi bastante fácil”, mesmo com uma grande diferença de “caráter e na história política” entre Francisco Louçã (PSR), Luís Fazendo (UDP), Miguel Portas (Política XXI) e Fernando Rosas, comummente conhecidos como os fundadores do partido
“[O BE] mudou a política portuguesa porque foi a primeira vez que além dos quatro partidos de referência, históricos surgiu um quinto partido que durou, que mudou, que influenciou, que se tornou determinante, que dialoga com outros, que não vive de portas fechadas e que faz essa diferença”, considera.
Com a saída de Francisco Louçã ao fim de 13 anos da liderança do partido abriu-se um processo de transformação na direção bloquista, atualmente composta por “mulheres e homens entre os 30 e os 40 anos que juntam gerações variadas”, uma mudança que “não é fácil de fazer”.
“Há partidos que resistem muito à ideia de que os dirigentes não são eternos, que não têm um poder perpétuo, (…) que não se está sempre toda a vida no parlamento, que não há carreiras políticas numa esquerda popular”, critica.
Sobre a decisão de deixar a liderança do partido, o economista recorda “um período muito difícil, também para o Bloco”, durante o qual “parecia que os astros se tinham conjugado para desgraçar Portugal”.
Antevendo um novo ciclo político, o bloquista justifica que “era preciso no tempo certo e antes das eleições de 2015, abrir a porta que alguém se afirmasse, ganhasse a sua experiência e mostrasse que era capaz, de uma forma totalmente autónoma e sem nenhuma dependência da direção anterior”.
“Catarina Martins foi a heroína das últimas eleições. (…) Ter esta arte, esta inteligência, esta vontade, esta capacidade, creio que é muito raro encontrar numa pessoa e ela fê-lo melhor do que qualquer um de nós até agora”, enaltece.
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