Desde o início da pandemia da Covid-19, o Alentejo tem sido uma região relativamente poupada, pelo menos em comparação com o restante território de Portugal continental.
Com 844 infeções detetadas — segundo o boletim epidemiológico lançado hoje, 18 de agosto, pela Direção-Geral da Saúde — esta continua a ser região a que menos casos tem a nível nacional. Porém, com o verão começaram a surgir novos surtos na região.
Depois do surto que afetou o lar de idosos da Fundação Maria Inácia Vogado Perdigão Silva, em Reguengos de Monsaraz — que resultou em 162 casos de infeção, a maior parte no lar, mas também em pessoas da comunidade, tendo morrido 18 doentes, e cujas causas estão a ser investigadas pelo Ministério Público — agora é outra vila alentejana onde a pandemia chegou.
Segundo o presidente da Câmara Municipal de Mora, são já 46 os habitantes do concelho infetados com Covid-19, estando cinco, todos homens, internados no Hospital do Espírito Santo de Évora (HESE), três deles em cuidados intensivos. No dia 9 de agosto, contavam-se apenas três casos, mas à medida que se foi fazendo o rastreamento dos seus contactos, foi-se desvendando o real espectro do surto.
De acordo com os depoimentos de uma habitante do município ao jornal Público, a situação é tal que é possível que todas os agregados familiares de Mora tenham ou alguém infetado ou sob suspeição de infeção. Neste momento há, pelo menos, duas centenas de pessoas a fazer quarentena por precaução.
Estas pessoas encontram-se em casa, mas a restante vila também. Neste momento, a população de Mora encontra-se confinada, e, como medida de segurança, fecharam também cafés, restaurantes e outros estabelecimentos comerciais. Ou seja, a povoação neste momento encontra-se praticamente deserta.
Mas se os habitantes de Mora se encontram neste momento a cumprir à risca as medidas de segurança recomendadas na prevenção e no combate à pandemia, tal não parece ter sido o caso há algumas semanas, pelo menos de acordo com diversos depoimentos de moradores do concelho.
Em entrevista ao Público, várias pessoas de Mora lamentaram que se tivesse baixado a guarda no município, sendo comuns os ajuntamentos. “De há duas semanas para cá isto era uma calamidade de gente de fora a vir aqui, à cata dos petiscos”, queixou-se uma idosa ao diário.
Já o provedor da Santa Casa da Misericórdia de Mora, Manuel Caldas de Almeida, deixou uma mensagem dura em entrevista à SIC Notícias: “Olhem para Mora e não façam a mesma coisa”. Segundo o responsável, a situação gerou-se “por descuido” pois “as pessoas acharam a certa altura que já tinham passado o pico, que estavam numa redoma assética, que ali em Mora não havia casos, e começaram a fazer tudo o que não deviam fazer”.
Mas se as causas da transmissão parecem estar explicadas, falta compreender como é que o surto teve início. A tese mais frequentemente apontada é para um casal de reformados que passou férias em Espanha e que não fez quarentena por precaução, apesar de ambos terem sintomas. Tal levou mesmo o presidente da Câmara Municipal de Mora, Luís Simão, a sugerir que a situação poderia ser “um caso de polícia” por poder incidir num crime de propagação de doença.
De resto, a nível local, a autarquia implementou o Plano Municipal de Emergência e fechou, no início da semana passada, os serviços de atendimento ao público e outros equipamentos, como a Oficina da Criança, a Casa da Cultura, o Centro de Atividades de Tempos Livres e instalações desportivas. O encerramento vigorará até, pelo menos, sexta-feira.
Para além disso, estava prevista para hoje a testagem de a todos os trabalhadores da câmara e da junta de freguesia, num total de 160 pessoas, dizendo o autarca que o município está a tentar que os bombeiros e os elementos da GNR a operar no concelho façam testes até ao fim da semana.
As visitas aos lares de idosos do concelho foram suspensas, sendo que Manuel Caldas de Almeida diz que teve de chamar o pessoal que trabalha nos equipamentos da Misericórdia para voltarem de férias e que a situação é de grande cansaço junto dos trabalhadores, que ainda não foram testados.
No que toca à atuação das autoridades de saúde, a Diretora-Geral da Saúde aludiu ontem ao surto de Mora em conferência de imprensa, dizendo que está a ser feito um “trabalho policial, de detetive” no que toca à investigação das cadeias de investigação.
Considerando este um "surto complexo porque tem mais de 300 pessoas potencialmente envolvidas", Graça Freitas sugeriu ainda que um outro foco surgido nas redondezas pode estar relacionado com o de Mora. Em Ciborro, freguesia de Montemor-o-Novo, há já 24 casos registados, mas "só quando as investigações terminarem é que podemos reconstituir as ramificações destas cadeias de transmissão, que podem dar origem a outros pequenos surtos ou focos da doença", disse a responsável.
*com Agência Lusa
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