Os dois partidos da oposição que concorreram contra o partido presidencial em 2017 e a coligação de exilados acusam o regime de manter torturas, prisões arbitrárias, impedir liberdades políticas e “mascarar” esses atos com “ações de propaganda” como a mesa de diálogo com opositores.
Teodoro Obiang disse à Lusa que a mesa de diálogo com a oposição foi um “estender de mãos” a quem se lhe opunha. Os partidos que assinaram os acordos são partidos controlados pelo regime, dizem os opositores que vivem na Guiné Equatorial, contactados pela Lusa.
Gabriel Nzé Obiang é o presidente do Cidadãos para a Inovação (CI), um partido político que conseguiu eleger os dois deputados (um num Congresso nacional pelo círculo de Malabo e outro num conselho local numa província) da oposição nas últimas eleições.
Todos os outros mais de 500 lugares eleitos são ocupados pelo Partido Democrático da Guiné Equatorial (PDGE, no poder).
No entanto, o CI não conseguiu tomar posse dos dois lugares porque foi ilegalizado e perdeu os assentos, com muitos militantes presos pelas forças governamentais.
Na Guiné Equatorial “não há multipartidarismo real, não há uma democracia real”, porque os opositores são “sujeitos a tortura e processos falsos”, afirmou Gabriel Nzé Obiang, em entrevista à Lusa.
“O CI era um partido muito forte e só nos derrotaram com a força”, disse o opositor, que considerou uma “farsa” as leis da amnistia e os indultos presidenciais.
Teodoro Obiang “montou um parlamento só com um partido. Isso é uma democracia?”, acusou.
“Por vontade do presidente, nunca haverá mudança política, o que ele faz é ganhar apoios da França, da CPLP, ganha apoios de todo o mundo para se manter no poder”, acusou o dirigente, que esteve vários meses sujeito a prisão domiciliária sem um processo formal aberto.
“Aqui já não sabemos o que é realidade ou farsa. A Guiné Equatorial é um país de teatro de uma democracia falsa”, disse à Lusa Pedro Nguema Bindang, representante no país da Coligação para a Restauração de um Estado Democrático (Cored), estrutura que nem sequer foi chamada à mesa de diálogo.
A Cored junta vários exilados políticos, críticos do regime de Teodoro Obiang, no poder desde 1979, e não está legalizada no país, porque nunca quis participar nas eleições que considera falsas.
“Não pode haver qualquer mediação para que houvesse uma mudança no país” e “não se conseguiu nada” porque as “forças reais da oposição” não foram ouvidas.
O que existe no país, explicou, é uma “ficção”, com o regime a “criar ou tomar conta” de partidos apenas para dizer que “são da oposição”.
“Os partidos que aparentam ser da oposição são fantoches do Presidente” Obiang.
A mesa de diálogo foi “uma anedota do ditador e não se conseguiu nenhum avanço para o país”, acusou Nguema Bindang.
O diálogo, os indultos para os presos políticos e a amnistia para os exilados foram decisões apenas “para dar sentido a uma farsa e mistificação para a comunidade internacional” valorizar.
A viver em Bata, a maior cidade do país, Pedro Nguema Bindang já foi preso e dá a cara por estas acusações, até porque também é dirigente político: “Se tiver de morrer, morro pela democracia”.
Desde as eleições de 2017, o regime prendeu muitos opositores sem processo formado.
Na Guiné Equatorial, “as prisões não são por causa de uma sentença judicial”, resultam somente da “vontade pessoal de algum dirigente” do regime.
Em dezembro de 2017, o Governo equato-guineense afirmou ter evitado um golpe de Estado, com financiamento internacional, mas o dirigente da Cored diz que é tudo mentira.
“As instituições internacionais não encontraram sinais concretos de qualquer golpe de Estado”, disse, considerando que isso permitiu o reforço da repressão no país.
O presidente da Convergência para a Democracia Social da Guiné Equatorial, Andrés Esono Ondo, um dos dois partidos que concorreram nas últimas eleições gerais do país, participou nas negociações, mas disse à Lusa que “nunca houve diálogo”, somente um “monólogo” de Obiang.
“Diálogo significa discutir a situação do país”, coisa que nunca aconteceu, porque “não se negociou nada”, disse.
Por exemplo, no que respeita à “legislação eleitoral, a oposição não esteve de acordo, havia artigos a introduzir e a alterar, mas não houve nada disso” e o regime “foi à televisão dizer que tomava boa nota”, mas ficou “tudo na mesma”.
Por isso, o CPDS recusou assinar as atas dos encontros: “A comissão de diálogo de que o Presidente fala não existe, o que há é um monólogo”.
Em abril, Andrés Esono Ondo foi detido no Chade por ordem das autoridades equato-guineenses, por estar ligado a uma alegada tentativa de golpe de Estado em 2017.
“Eles prendem-me porque não desisto de fazer uma oposição legal. Em 2015 acusaram-me de trazer Ébola para o país. Em 2017, de trazer armas. Agora de um golpe”, afirmou acusando Obiang de querer “acabar com o CPDS a qualquer preço”.
“O Presidente é o único que fala e que dá entrevistas, usa a televisão do país e a rádio para impor a sua posição e para que as vozes discrepantes não se escutem”, acusou Andrés Esono Ondo.
O filho do Presidente, Teodoro Nguema Obiang Mangue (conhecido por ‘Teodorín’) é vice-presidente do país e é o escolhido pelo pai para lhe suceder.
Teodorín “já deveria dar sinais que quer ajudar à mudança e nunca o fez. Só estamos a ver o contrário: um reforço da repressão”, acusou André Esono Ondo, uma posição que o representante da Cored subscreve.
“Espero que a Guiné não seja como o Gabão, seria um mau sinal para todos”, disse Pedro Nguema Bindang, numa referência ao país vizinho em que o filho (Ali Bongo) sucedeu ao pai (Omar Bongo) numas eleições presidenciais fortemente criticadas pela comunidade internacional.
*Paulo Agostinho, da agência Lusa
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