Em nota enviada à agência Lusa, Carlos Cortes, presidente da SRCOM, acusa o CHUC de desvalorizar a saúde mental, argumentando que os doentes "passam vários dias na urgência" por não existirem condições de internamento e que "apenas comem bolachas, sopa e leite ou sumos".
"Há inclusivamente doentes com critérios para internamento compulsivo e que permanecem vários dias no serviço de urgência" e outros, internados noutras enfermarias, "sem os devidos cuidados especializados".
Os doentes "passam dias a fio com dificuldades em satisfazer as suas necessidades básicas de higiene e alimentação, já que não existem condições para os internar".
"Este é um grito de alerta para uma realidade desumana, pois resulta em graves consequências para os doentes. O CHUC tinha um centro de referência nacional na área da psiquiatria que está a ser gradualmente destruído. O conselho de administração deveria valorizar a excelência do trabalho realizado pelos profissionais na área da saúde mental e não estar a pôr em causa a própria dignidade dos doentes", afirma Carlos Cortes.
A denúncia tem por base um documento, dirigido, "face à gravidade da situação", à administração do CHUC, por cerca de 40 médicos do serviço de Psiquiatria, onde são enunciadas "as carências e as deficiências" existentes, nomeadamente relacionadas com a falta de vagas de internamento e com o perigo que aqueles doentes correm na urgência, onde ficam "mais vulneráveis" e desenvolvem complicações orgânicas com infeções hospitalares.
No texto, datado de 26 de junho e a que a Lusa teve acesso, os médicos subscritores avisam a administração que "enquanto não se encontrarem reunidas as condições de segurança e de qualidade para a prática de atos médicos" (…) "declinam toda e qualquer responsabilidade derivada das insuficiências" assinaladas, nomeadamente quanto a acidentes e incidentes que possam vir a ocorrer em resultado das "anomalias" nas condições do serviço, em resultado da falta de condições de internamento.
Os subscritores apontam a "necessidade premente de aumentar o número de vagas para internamento no CRI [Centro de Responsabilidade Integrada] de Psiquiatria destinadas a doentes agudos", repondo-as, "pelo menos para o número igual ao que existia" em setembro de 2018 (54 para homens e mulheres, face às 48 agora existentes) antes do encerramento "intempestivo" da unidade de Psiquiatria Mulheres, em Celas.
Em finais de 2018, essas vagas de internamento foram "provisoriamente deslocadas" para o piso térreo do edifício central dos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC), onde funciona o Internamento Masculino e para o 1.º andar de um pavilhão no hospital Sobral Cid, a dez quilómetros de distância.
Esta reestruturação fez com que "muitos doentes com critérios de internamento e sem condições de alta para ambulatório", por ausência de vaga no internamento, permaneçam no serviço de urgência "muito para além do tempo definido" nas normas do serviço de Psiquiatria, argumentam.
Entre outras considerações relacionadas com a assistência, segurança e dignidade dos doentes, os signatários avisam, a exemplo da SRCOM, que durante o período em que os doentes ficam na urgência do CHUC "veem comprometidas as suas necessidades mais básicas de higiene e alimentação", sendo alimentados "apenas com bolachas, leite e/ou sumos e sopa, muitos dias sucessivos", desenvolvendo complicações "do foro infeccioso".
Em nota enviada à Lusa, a administração hospitalar refere que antes da constituição daquele centro hospitalar, foi criada, em 2009, "a urgência psiquiátrica central da região Centro situada nos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC) e que, dez anos volvidos, com o internamento "centralizado essencialmente" no CHUC a justificação para a sua manutenção "deixou de ter motivo".
Alega que "desde junho que se está a reverter a origem da situação descrita, evitando que fiquem doentes com mais de 24 horas nesta área" e que é "apanágio da urgência dos HUC não existirem doentes a aguardar internamento na urgência".
Sobre as denúncias, o CHUC apenas refere que "as situações do constrangimento de vagas resolvem-se com melhoria dos tempos de internamento, o que está a acontecer".
"O internamento em outros serviços tem sido esporádico e em situações sem especificidades próprias e com segurança", adianta a administração hospitalar, que, especificamente sobre o internamento de doentes do sexo feminino, diz, sem adiantar prazos, que a situação "será revertida com uma reestruturação prevista do internamento nos hospitais da Universidade de Coimbra onde se concentrará a totalidade do internamento de agudos após reorganização do serviço".
Comentários