Numa entrevista ao jornal italiano La Stampa, hoje publicada, quando questionado sobre se a abertura da Igreja a todos é o grande desafio do seu pontificado, depois de ter declarado no verão passado em Lisboa, por ocasião das Jornadas Mundiais da Juventude, que a Igreja é para “todos, todos, todos”, o Papa assumiu que essa é “a chave para compreender Jesus”, pois “Cristo chama toda a gente”, mas admitiu que tem sido confrontado com muitas questões “nos últimos tempos”.
Recorrendo a uma parábola da bíblia, a de um banquete de casamento a que ninguém comparece, o que leva o rei a enviar servos a chamar todos os que encontrarem para as bodas, o Papa Francisco apontou que “o Filho de Deus quer deixar claro que não quer um grupo seleto, uma elite”, e, “depois, talvez alguém seja ‘introduzido clandestinamente’, mas nessa altura é Deus que se encarrega disso, que indica o caminho”.
“Quando me perguntam: ‘Mas essas pessoas que estão numa situação moral tão imprópria também podem entrar?’, eu asseguro-lhes: ‘Todos, o Senhor assim o disse’. Perguntas como esta surgem-me sobretudo nos últimos tempos, depois de algumas das minhas decisões”, declarou.
Questionado em concreto sobre a bênção de “casais irregulares e do mesmo sexo”, que sugeriu no ano passado, o Papa Francisco confirmou que lhe perguntam “como é possível”, ao que responde que “o Evangelho é para santificar toda a gente, desde que haja, claro, boa vontade”, sublinhando que “não se abençoa a união, mas as pessoas”.
Ao ser questionado sobre como está a lidar com a resistência de parte da Igreja à sua sugestão, depois de ter falado, numa recente entrevista televisiva em Itália, do “preço da solidão que se tem de pagar depois de um passo como este”, o Papa Francisco apontou então o caso particular de África.
“Os que protestam com veemência pertencem a pequenos grupos ideológicos. Um exemplo disso são os africanos: para eles, a homossexualidade é algo ‘feio’ do ponto de vista cultural, não a toleram”, declarou.
“Mas, de um modo geral, confio que, a pouco e pouco, todos se vão apercebendo do espírito da declaração “Fiducia supplicans” do Dicastério para a Doutrina da Fé: quer incluir, não dividir. Convida as pessoas a acolher e depois a confiar-se a Deus”, completou.
Questionado sobre se receia um cisma, o Papa Francisco respondeu que não, observando que “sempre houve na Igreja pequenos grupos que manifestaram pensamentos cismáticos”, mas há que “olhar em frente”.
No ano passado, o Papa Francisco sugeriu que poderia haver formas de abençoar as uniões entre pessoas do mesmo sexo, respondendo a cinco cardeais conservadores que o desafiaram a afirmar os ensinamentos da Igreja sobre a homossexualidade, o que suscitou controvérsia nos setores mais conservadores da Igreja.
Entre aqueles que manifestaram perplexidade com as bênçãos a “casais irregulares”, contam-se os bispos da Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST), que determinaram mesmo que estas não sejam realizadas nestes dois países porque “criariam um enorme escândalo e confusão entre os fiéis”.
“A respeito das bênçãos informais a ‘casais irregulares’, embora seja um sacramento diverso da bênção litúrgica, consideramos que, no nosso contexto cultural e eclesial, criariam um enorme escândalo e confusão entre os fiéis, pelo que determinamos que não sejam realizadas em Angola e São Tomé”, referiram num comunicado.
O comunicado da CEAST reagiu assim à recente sugestão do Papa Francisco de se de dar a bênção a casais do mesmo sexo, sem transmitir “a conceção errada do casamento”, afirmando ainda que os padres não se podem tornar juízes.
Segundo a CEAST, a sua posição tem como suporte a declaração ‘Fiducia Supplicans’, que consideram suficiente para orientar o discernimento prudente e paterno dos ministros ordenados” no que respeita às bênçãos dos casais do mesmo sexo, argumentando ainda que “o documento não impõe qualquer linha uniforme”.
Comentários