“Portugal partilha com a Europa muitos esforços exemplares na defesa da criação. Mas o problema global continua extremamente grave”, afirmou o Papa, falando em italiano, num encontro com autoridades, sociedade civil e corpo diplomático, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa.

Referindo que “os oceanos aquecem e, das suas profundezas, sobe à superfície a torpeza com que se polui a casa comum”, o líder da Igreja Católica salientou ainda: “Estamos a transformar as grandes reservas de vida em lixeiras de plástico. O oceano lembra-nos que a existência humana é chamada a viver de harmonia com um ambiente maior do que nós; este deve ser guardado com cuidado, tendo em conta as gerações mais novas. Como podemos dizer que acreditamos nos jovens, se não lhes dermos um espaço sadio para construir o seu futuro”, questionou.

No discurso, depois de falar do primeiro estaleiro de obras, referiu que o futuro é o segundo e o “futuro são os jovens”, embora reconhecendo que são muitos os fatores que “os desanimam, como a falta de trabalho, os ritmos frenéticos em que se veem imersos, o aumento do custo de vida, a dificuldade de encontrar uma casa e, ainda mais preocupante, o medo de constituir família e trazer filhos ao mundo”.

“Na Europa e em geral no Ocidente, assiste-se a uma triste fase descendente na curva demográfica: o progresso parece ser uma questão que diz respeito ao desenvolvimento técnico e ao conforto dos indivíduos, enquanto o futuro pede para se contrariar a queda da natalidade e o declínio da vontade de viver”, salientou.

Para o chefe de Estado do Vaticano, “a boa política pode fazer muito neste sentido” e “pode gerar esperança”.

Defendeu também que aquela “não é chamada a conservar o poder, mas a dar às pessoas a possibilidade de esperar”.

“É chamada, hoje mais do que nunca, a corrigir os desequilíbrios económicos dum mercado que produz riquezas, mas não as distribui, empobrecendo de recursos e de certezas os ânimos”, prosseguiu.

Para o líder da Igreja Católica, a política “é chamada a voltar a descobrir-se como geradora de vida e de cuidado da criação, a investir com clarividência no futuro, nas famílias e nos filhos, a promover alianças intergeracionais, onde não se apague o passado, mas se favoreçam os laços entre jovens e idosos”.

“A isto mesmo faz apelo o sentimento da saudade portuguesa, que exprime nostalgia, desejo dum bem ausente, que só renasce em contacto com as próprias raízes”, disse, defendendo que, “neste sentido, é importante a educação, que não pode limitar-se a fornecer noções técnicas para se progredir economicamente, mas destina-se a introduzir numa história, transmitir uma tradição, valorizar a necessidade religiosa do homem e favorecer a amizade social”.

Quanto ao último estaleiro de esperança, a fraternidade, Francisco assinalou que, “em muitas partes de Portugal, está ainda muito vivo o sentido de vizinhança e solidariedade”.

“Contudo, no contexto geral duma globalização que nos aproxima mas não nos dá uma proximidade fraterna, somos todos chamados a cultivar o sentido da comunidade, começando por ir ter com quem vive ao nosso lado”, afirmou, salientando a importância de “trabalhar pelo bem comum, deixando para trás contrastes e diferenças de visão”.

Neste campo, apontou o exemplo dos jovens que, “com o seu grito de paz e ânsia de vida”, levam “a derrubar as rígidas divisórias de pertença erguidas em nome de opiniões e crenças diversas”.

“Soube de muitos jovens que cultivam, aqui, o desejo de se fazerem próximo dos outros. Penso na iniciativa ‘Missão País’, que leva milhares de jovens a viver no espírito do Evangelho experiências de solidariedade missionária em zonas periféricas, sobretudo nas aldeias do Interior, indo ao encontro de muitos idosos sozinhos”, referiu, agradecendo e encorajando “a tantos que na sociedade portuguesa se preocupam com os outros, nomeadamente a Igreja, e que fazem tanto bem mesmo longe dos holofotes”.

Mais de um milhão de pessoas são esperadas em Lisboa até domingo para a JMJ, considerado o maior acontecimento da Igreja Católica, e que contará com a presença do Papa Francisco.

O Papa, o primeiro peregrino a inscrever-se na JMJ, chegou a Lisboa hoje de manhã, tendo prevista uma visita de duas horas ao Santuário de Fátima no sábado para rezar pela paz e pelo fim da guerra na Ucrânia.