Pavlo Sadokha, presidente da Associação dos Ucranianos em Portugal, já nem se lembrava, mas quando foi convidado pela Assembleia da República a prestar esclarecimentos sobre o caso polémico dos refugiados ucranianos recebidos na Câmara de Setúbal por funcionários russos pró-Putin, voltou atrás no tempo e descobriu que a primeira queixa que apresentou ao Alto Comissariado para as Migrações é de 2011. De lá para cá passaram mais de dez anos e três altos-comissários, mas pouco mudou.

Foram duas estreias para Pavlo Sadokha, em Portugal há já 21 anos: primeiro foi falar ao Parlamento - onde ontem e hoje decorreram audições sobre o acolhimento de refugiados pela Câmara de Setúbal -, depois veio ao "O sapo e o escorpião" contar o que o aflige: "Sabemos que as tropas russas quando invadem uma aldeia ou uma cidade têm uma lista negra de pessoas que depois são perseguidas, mortas ou levadas para sítios desconhecidos", diz.

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O presidente da Associação dos Ucranianos adianta que estas organizações pró-Putin estão por todo o lado, em Portugal, de norte a sul, mas não só: "O caso de Setúbal acontece em todo o mundo", assegura. E não acredita em coincidências infelizes ou insensatez, porque sabe "como os russos atuam há séculos, como funciona a máquina de espionagem de forças especiais da Rússia". Isso deixa-o de pé atrás.

Mas as denúncias não se ficam por aqui. Pavlo Sadokha denuncia os padres da Igreja Ortodoxa Russa ortodoxa, que sempre tiveram uma "retórica ofensiva aos ucranianos e continuam a ser representantes do Patriarca Kirill, que hoje é mais agente do KGB do que sacerdote espiritual".

O responsável lembra que "já há alertas e factos de que estas igrejas estão a criar escolas ou grupos que acolhem menores ucranianos para trabalhar com eles. Isso significa que eles [ucranianos] fugiram de uma perseguição dos russos e aqui caem nas mãos da propaganda russa. É inaceitável".

Lembramos que Portugal - e os números são da deputada do Partido Socialista Joana Sá Pereira -, já acolheu mais de 35 mil refugiados da Ucrânia, tem nove mil inscritos no Instituto do Emprego e Formação Profissional (das quais duas mil já têm contrato de trabalho), e mais de quatro mil crianças nas escolas do país.

Nesta conversa participou também a deputada municipal da Câmara de Lisboa, Margarida Bentes Penedo (CDS/PP), para explicar como é possível que casos destes - no ano passado foi a polémica transmissão pela CML de dados de manifestantes russos anti-Putin à Embaixada da Rússia -, continuem a acontecer sob o olhar da oposição e das Assembleias Municipais, que têm como função fiscalizar a ação do executivo.

"O executivo da câmara deve respostas às perguntas que lhes fazem os deputados. E, na altura, éramos alvo da maior chacota porque nos diziam: 'Parece impossível, estão preocupados com os dissidentes russos e ucranianos em vez de estarem preocupados com a pobreza em Lisboa'", conta.

Pavlo Sadokha recusa entrar em questões partidárias, mas confessa que ficou "muito surpreendido quando o presidente da Câmara de Setúbal [André Martins (CDU)] disse que não perguntava a Igor Khashin [presidente da Associação de Imigrantes dos Países de Leste (Enditsvo)] as suas preferências políticas, porque ele está ali para apoiar os refugiados, não fazem uma escolha pela cor, língua ou preferências políticas".

"Quer dizer, a Ucrânia é invadida pelos russos, e ao presidente da Câmara de Setúbal, que ocupa um cargo político, não interessa o que se passa fora de Setúbal?", pergunta o presidente da Associação dos Ucranianos em Portugal. Oiça toda a história e fique a saber quem são os sapos e quem são os escorpiões nesta polémica.