"Os psicólogos estiveram lá a fazer consulta na primeira semana, mas, depois disso, nunca mais voltaram", disse à agência Lusa José Esteves, de 52 anos, a viver em Pobrais, concelho de Pedrógão Grande, concelho que assistiu no dia 17 de junho ao início do incêndio que provocou a morte a 64 pessoas e mais de 200 feridos.
Na freguesia da Graça, também no mesmo concelho, José Alcides sublinha que a sua mãe, Lucinda Gonçalves, de 84 anos, anda "sempre a chorar, com as mãos na cabeça".
"Parte da casa ardeu e ela não anda bem da cabeça. Até agora, não teve apoio de ninguém", realça José Alcides.
Também em Nodeirinho, há vários casos de pessoas que criticam a falta de presença de psicólogos nas aldeias afetadas, referindo que a resposta não pode estar concentrada em centros de saúde, por muitas das pessoas que precisam de apoio não terem forma de se deslocar às vilas de Figueiró dos Vinhos, Castanheira de Pera ou Pedrógão Grande.
O presidente da Administração Regional de Saúde do Centro (ARSC), José Tereso, vincou que "continua a haver equipas multidisciplinares da unidade de saúde mental comunitária", bem como as unidades de cuidados na comunidade, constituídas por enfermeiros e por outros profissionais.
"Não se pode fazer tudo no mesmo dia. As equipas vão continuar no terreno para dar apoio e encaminhar, se for necessário", explicou, afirmando que se está a tentar "arranjar um sistema de mobilidade", para dar resposta a todas as necessidades já identificadas ou que sejam apontadas pelas câmaras ou juntas de freguesia.
Na casa de Dina Duarte, no Nodeirinho, já se abriu a porta a quatro levantamentos, mas apoio psicológico, até agora, "nada", assegura, referindo que a última equipa que esteve no terreno era uma enfermeira e uma psiquiatra "a fazer um levantamento e a ajustar a medicação de casos já analisados".
"Ainda não há psicólogos no terreno. O psicólogo não pode estar no centro de saúde, à espera, porque há muitas pessoas sem possibilidade de se deslocar até à vila", explicou à agência Lusa Dina Duarte.
Esta habitante de Nodeirinho sublinha que não é só nesta aldeia onde morreram 11 pessoas - cinco das quais residentes - que é necessário apoio psicológico, apontando também para Pobrais, Várzeas, Moita, Sarzedas ou Balsa.
"Todas as aldeias precisam de alguém no terreno. Todas as pessoas têm de ser verdadeiramente ouvidas. Houve pessoas que, mesmo não perdendo um familiar, ouviram os gritos e os berros. Lidar com esta situação não é fácil", salientou Dina Duarte.
Também Eugénio Santos, de 60 anos, a morar desde 2006 em Nodeirinho, aclara que levantamentos já foram feitos, mas que não houve nenhuma consulta de psicologia na aldeia.
"Há uma família aí que perdeu a filha e ainda não foram lá a casa psicólogos", depois da primeira semana do início do incêndio, realça, frisando que o que vai valendo às populações é "a amizade" dos vizinhos.
O incêndio que deflagrou em Pedrógão Grande no dia 17 de junho, no distrito de Leiria, provocou pelo menos 64 mortos e mais de 200 feridos, e só foi dado como extinto uma semana depois.
Mais de dois mil operacionais estiveram envolvidos no combate às chamas, que consumiram 53 mil hectares de floresta, o equivalente a cerca de 75 mil campos de futebol.
A área destruída por estes incêndios na região Centro corresponde a praticamente um terço da área ardida em Portugal em 2016, que totalizou 154.944 hectares, segundo o Relatório Anual de Segurança Interna divulgado pelo Governo em março.
Das vítimas do incêndio que começou em Pedrógão Grande, pelo menos 47 morreram na Estrada Nacional 236.1, entre Castanheira de Pera e Figueiró dos Vinhos, concelhos também atingidos pelas chamas.
O fogo chegou ainda aos distritos de Castelo Branco, através da Sertã, e de Coimbra, pela Pampilhosa da Serra e Penela.
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