Depois de mais de meio século de uma carreira que o tornou famoso em todo o mundo, em 2012 o autor anunciou que não tinha "mais nada para escrever" e que não tinha energia para administrar a frustração que acompanha a criação literária.
Uma decisão que voltou a explicar em agosto de 2017 ao jornal francês "Libération": "Contar histórias, isto que foi tão precioso durante toda minha existência, já não é o centro da minha vida", explicou. "É estranho. Nunca imaginei que algo assim poderia acontecer".
"Némesis", publicado em 2010, foi o último romance publicado pelo escritor, que vivia entre seu apartamento no Upper East Side de Nova Iorque e uma casa em Connecticut.
Roth foi reconhecido com múltiplos prémios: o Pulitzer em 1998 por "Pastoral Americana", o National Book Award em 1960 por "Adeus, Columbus" e em 1995 por "Teatro de Sabbath", além do Príncipe das Astúrias de Letras em 2012. Também foi citado durante muitos anos entre os nomes prováveis para vencer o Nobel da Literatura.
Neto de imigrantes judeus do leste da Europa, nascido em Nova Jersey, perto de Nova Iorque, Roth escreveu 31 romances.
Os seus relatos provocadores sobre a moral da burguesia judaico-americana, sátiras políticas, reflexões sobre o peso da história, ou mais recentemente sobre o envelhecimento, ficam com frequência na fronteira entre a autobiografia e a ficção.
O seu texto exigente e sua lucidez implacável ocupam um lugar único na literatura americana da segunda metade do século XX, sendo o único escritor cuja obra foi publicada pela prestigiosa coleção Library of America ainda vivo.
Primeiros livros, primeiros mal-entendidos
Nascido em Newark em 19 de março de 1933, filho de um corretor de seguros, tinha apenas 26 anos e era professor de Literatura Inglesa quando publicou sua primeira obra, "Adeus, Columbus". O livro de relatos fez sucesso, e um rabino criticou o autor por, na sua opinião, apresentar uma visão deformada dos valores fundamentais do judaísmo.
Roth tornou-se um autor conhecido por todos em 1969 com "O Complexo de Portnoy", que gerou grande polémica. No livro, o jovem protagonista aborda sem qualquer reserva com seu psicanalista a sua obsessão pela masturbação e o relacionamento com a mãe possessiva, os Estados Unidos e o judaísmo.
A obra rendeu fama mundial ao escritor, mas representantes da comunidade judaica consideraram que o romance estava impregnado de antissemitismo. Outros enxergaram pura e simplesmente pornografia.
"Fico feliz de escrever sobre sexo. Um tema extenso! Mas a maioria das coisas que conto nos meus livros nunca aconteceram. No entanto, são necessários alguns elementos de realidade para começar a inventar", disse anos depois.
No fim dos anos 1970, influenciado entre outros pelo autor americano Saul Bellow, Roth iniciou uma série de nove livros nos quais o protagonista era um jovem romancista judeu, Nathan Zuckerman, geralmente considerado seu alter ego.
Entre os livros da série estão três dos seus maiores sucessos: "Pastoral Americana" (1997), sobre os estragos da guerra do Vietnam na consciência nacional; "Casei com um Comunista"(1998), sobre o macartismo; e "A Mancha Humana" (2000), que denuncia um país puritano e voltado para sim mesmo.
Philip Roth também é conhecido por "Os Factos" (1988), uma autobiografia de seus 36 primeiros anos de vida, iniciada após uma depressão.
A frustração de escrever
Em "Conspiração contra a América" (2004), imaginou o destino de uma família de judeus americanos, se os Estados Unidos tivessem passado para o lado de Hitler em 1940.
O romance estabelece uma história alternativa do país, na qual imagina que Franklin D. Roosevelt foi derrotado na eleição de 1940 por Charles Lindbergh, um aviador com inclinações pró-nazismo.
Roth é autor ainda de "Operação Shylock" (1993), no qual o narrador tem o nome Philip Roth, mas na realidade é apenas um homónimo do escritor.
A velhice e a morte marcaram as suas obras mais recentes, como "Fantasma sai de Cena" (2007) e "A Humilhação" (2009).
"Escrevo ficção e dizem-me que é autobiografia. Escrevo autobiografia e dizem-me que é ficção. Então, como sou tão tonto e eles tão espertos, deixem que eles decidam o que é e o que não é", afirmou.
Pouco afeito a entrevistas, Roth explicou em 2012, no entanto, por que parou de escrever.
"Não tenho mais energia suficiente para suportar a frustração. A escrita é frustração, uma frustração quotidiana, para não dizer humilhação", declarou ao jornal "New York Times".
"Não posso mais enfrentar os dias em que escrevo cinco páginas e deito-as fora", completou Roth, que escrevia de pé desde que percebeu que andar de um lado para o outro liberava a sua mente.
Por Brigitte Dusseau e Catherine Triomphe | AFP
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