Em 17 de maio assinala-se o Dia Internacional contra a Homofobia, a Transfobia e a Bifobia, que Giovanna Tavares vê como uma data importante, mas com o problema de só nesse dia a maioria das pessoas se lembrarem de que os direitos das pessoas LGBTI (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans e Intersexo) continuam a não ser cumpridos.
“Não adianta a gente falar disso e depois nada mudar na sociedade em si. Eu preferiria que existissem várias pessoas trans ocupando postos de trabalho e que talvez não existisse o dia da visibilidade trans”, defendeu, em declarações à Lusa.
Para Giovanna, a dificuldade em encontrar um trabalho é um dos principais problemas das pessoas trans, que se veem afastadas para uma espécie de “submundo”, com “uma barreira à volta delas”, o que justifica que muitas recorram à prostituição ou outros trabalhos sexuais para conseguirem sobreviver.
Giovanna conseguiu “andar por outros caminhos”, o que explica com o apoio que sempre teve da mãe, que considera ter sido fundamental para “ganhar forças e ter novas ideias para ter uma outra profissão”.
“Eu acho que a única forma de a gente conseguir trazer normatividade é com as pessoas trans ocupando postos de emprego porque assim consegue ser algo que você vê no seu dia-a-dia e aquilo acaba sendo uma coisa mais normativa”, apontou.
Apedrejada à porta da escola “por ser trans”
Outra questão que Giovanna Tavares entende que afeta as pessoas trans, e que está relacionada com o acesso ao mercado de trabalho, é a dificuldade em sentir que a escola é um lugar seguro, recordando um episódio, quando tinha 14 anos, em que foi apedrejada à porta da escola “por ser trans”.
Deixou de estudar, mas nunca perdeu a ambição de ter o próprio negócio. Fez formação para cabeleireira, trabalhou em Itália no salão de uma prima, mas depois escolheu vir para Portugal, onde começou por trabalhar ao domicílio.
Ao fim de pouco tempo conseguiu abrir o próprio cabeleireiro numa localidade da margem sul.
“Depois abri outro em Lisboa, depois abri mais dois, até que chegou a um ponto em que cansei daquela vida de salão”, contou, recordando que foi nessa altura que decidiu criar a própria marca de cuidados de beleza de rosto.
Com a noção de que as pessoas gostam de cuidar da pele, mas não têm tempo ou paciência, decidiu criar uma rotina que fosse “simples, fácil e eficaz”, apta para todos os géneros e tipos de pele.
“A marca tem um ano e três meses e a gente já vende para nove países. Vendemos para África, entrámos nos Estados Unidos há mês e meio. Temos revendedores nesses países e a França é o segundo país onde mais vendo depois de Portugal”, adiantou.
Lingerie para corpos trans
Entretanto, aventurou-se na criação de ‘lingerie’, no caso cuecas específicas para mulheres trans, que foram desfiladas na Moda Lisboa, em março, sem que ninguém desse conta, no que apelidou de “estratégia de marketing”.
Giovanna explicou que a ideia partiu do facto de não haver ‘lingerie’ pensada para os corpos trans e revelou que o sucesso tem sido tal que já planeia alargar a linha para roupa de praia e de fitness.
No seguimento do negócio, pensa ter revendedoras trans e mostrar a essas mulheres que “elas podem fazer outras coisas”.
“Quando a gente vê alguém trans, como nós, isso permite sonhar também, não é? Quando a gente não tem muitas referências, a gente sonha pouco”, apontou.
Defende, por isso, que o negócio já não é só uma causa sua, “é uma causa de um coletivo” e revela que tem o sonho de “ser mundialmente conhecida” porque isso traz poder e ter poder é ter voz para mostrar que as pessoas trans também são válidas e que conseguem fazer muito mais coisas do que só trabalhos sexuais.
Assume-se, por isso, como um exemplo na comunidade trans e admite o orgulho que sente pela mulher que é hoje, que considera ser a sua melhor versão.
“Ser trans e ser uma pessoa bem-sucedida é possível. É como se fosse uma super trans. Eu sou feliz e se morresse hoje, morria feliz”, concluiu.
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