“Nunca poderá ser o representante da República a retirar consequências políticas dessa não aprovação, pois […] o Governo Regional assenta exclusivamente na Assembleia Legislativa, e só este órgão pode demitir o Governo”, afirmou Ireneu Barreto numa intervenção na cerimónia militar do Comando Territorial da Madeira da Guarda Nacional Republicana (GNR), no Funchal.
Na quarta-feira, o presidente do Governo Regional da Madeira, o social-democrata Miguel Albuquerque, anunciou a retirada do Programa do Governo da discussão que decorria no parlamento madeirense, com votação prevista para o dia seguinte, quinta-feira.
O documento, que é votado em forma de moção de confiança, seria chumbado, uma vez que PS, JPP e Chega, que somam um total de 24 deputados dos 47 que compõe o hemiciclo, anunciaram o voto contra.
Na intervenção de hoje, o representante da República realçou que, ao contrário do que acontece na Assembleia da República e nos Açores, onde a não aprovação de uma moção de confiança “implica necessariamente a demissão do executivo, o Estatuto Político Administrativo vigente na região “obriga a que a aprovação do Programa de Governo seja feita através de uma moção de confiança”, mas “nada diz sobre as consequências da não aprovação”.
Segundo Ireneu Barreto, “poder-se-ia afirmar que se trata de uma lacuna a preencher de acordo com o que acontece na República e nos Açores; solução, aliás, avançada por alguma doutrina”.
Contudo, para o juiz-conselheiro não “parece ser esta a melhor via, porquanto o referido Estatuto Político-Administrativo é muito claro a retirar as consequências da aprovação de uma moção de rejeição, sendo a moção de confiança consagrada de uma forma diferente”.
Assim, não poderá ser o representante da República a retirar consequências políticas da não aprovação de uma moção de confiança, já que o Governo Regional assenta apenas no parlamento do arquipélago e só este órgão pode demitir o executivo.
“Nem o representante da República nem mesmo Sua Excelência o Presidente da República o poderiam fazer”, acrescentou.
Assim, continuou, para ultrapassar a situação “todos os responsáveis políticos” devem colocar “o acento tónico da sua ação no interesse superior da região” para que possa ser “dotada de um programa de governo e um orçamento que tragam estabilidade”.
“Até lá, o Governo continuará em gestão”, disse, apelando ao executivo para que se esforce para “superar os inconvenientes decorrentes do regime de duodécimos”.
“E reafirmo o meu compromisso de oferecer todo o meu empenho para o êxito da sua missão”, salientou.
PS, JPP e Chega têm insistido que o problema para a aprovação do Programa de Governo é o presidente do Governo Regional, exigindo o seu afastamento.
Porém, Miguel Albuquerque recusa deixar a presidência, considerando estar devidamente legitimado em eleições internas e nas últimas regionais.
Nas eleições regionais antecipadas de 26 de maio, o PSD elegeu 19 deputados, ficando a cinco mandatos de conseguir a maioria absoluta (para a qual são necessários 24), o PS conseguiu 11, o JPP nove, o Chega quatro e o CDS-PP dois, enquanto a IL e o PAN elegeram um deputado cada.
Já depois das eleições, o PSD firmou um acordo parlamentar com os democratas-cristãos, ficando ainda assim aquém da maioria absoluta. Os dois partidos somam 21 assentos.
Também após o sufrágio, PS e JPP (com um total de 20 mandatos) anunciaram um acordo para tentar retirar o PSD do poder, mas o representante da República entendeu que não teria viabilidade e indigitou Miguel Albuquerque.
As eleições de maio realizaram-se oito meses após as legislativas madeirenses de 24 de setembro de 2023, depois de o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ter dissolvido o parlamento madeirense, na sequência da crise política desencadeada em janeiro, quando Miguel Albuquerque foi constituído arguido num processo sobre alegada corrupção.
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