A cadeia de televisão NBC, que transmitiu na madrugada deste domingo (em Portugal) a quinquagésima segunda edição do Super Bowl a partir do U.S. Bank Stadium, no estado do Minnesota, entre os New England Patriots e os (agora) campeões Philadelphia Eagles, cobrou cinco milhões de dólares pela exibição de anúncios com trinta segundos de duração.
Porque até pode não ser fã de futebol americano, não conhecer quem são as equipas a chegar à final ou simplesmente nem saber que se tratou do jogo em que Justin Timberlake homenageou Prince ao intervalo. Só que todos sabem e têm noção que, durante a transmissão, quando o jogo está parado, o tempo de antena funciona como montra de apresentação das mais antecipadas novidades. Algo que Amazon, HBO e Hulu bem sabem — e por isso pagaram a peso de ouro cada segundo. Porque já lá vai o tempo em que eram apenas as grandes marcas como a Coca-Cola ou a Budweiser a gastar avultadas somas de dinheiro nestes spots publicitários.
Só a Netflix gastou 5 milhões de dólares para chegar a mais ou menos a 110 milhões de pessoas com o trailer do seu novo filme, Cloverfield Paradox. A Hulu, outra plataforma de streaming, quis promover a série Castle Rock, de J.J Abrams; a Amazon fez o mesmo para a série baseada em Jack Ryan e a HBO quis promover a segunda temporada de Westworld, a estrear na primavera nos Estados Unidos. De acordo com a Business Insider, no total, as plataformas de streaming devem ter pago aproximadamente mais de 20 milhões de dólares para trazer à tona os seus conteúdos originais.
O preço elevado é justificado por um estudo da Gallup que refere que 33 por cento das pessoas que seguem a partida pela televisão estão mais interessadas na publicidade do que no jogo.
Netflix e o Paradoxo promocional de Cloverfield
A frase que normalmente se espera findo um trailer de apresentação de um filme é, por norma, "Coming soon" (Brevemente). No caso de ontem, foi um "Coming very soon" (Muito brevemente). Ora, tal mensagem subliminar, ainda que estranha, nada incidiu fora da cabal normalidade. Afinal, a data de estreia dos filmes está sempre a mudar: sejam adiadas ou antecipadas, é prática normal na indústria. E, durante o jogo de ontem, foi isso que a maioria dos que assistiram ao dito trailer terá pensado — até porque era esperado que Cloverfield Paradox conhecesse a sua data de estreia na plataforma daqui a um par de meses.
A Netflix é que, pelos vistos, tinha um plano diferente. Porque até este ter sido revelado durante a madrugada, não se sabia qual era a intenção da plataforma. Esta havia comprado há pouquíssimo tempo os direitos de distribuição do filme a outro estúdio (Paramount), o qual esperava colocá-lo nas salas norte-americanas no próximo mês de abril. Portanto, a questão que se colocava era: qual seria o objetivo da Netflix com o filme? Seria passá-lo primeiro nos cinemas e só depois disponibilizar em streaming? Ou passaria por colocar em exibição nos dois sítios em simultâneo? Pois bem, agora já se sabe. A intenção passava por criar um move arrojado. Isto porque que o colocou disponível (em Portugal por volta das 02h00 também já o podíamos ver) assim que o jogo terminou. Para — grande — surpresa de todos.
É normal que os trailers de filmes com grande antecipação sejam apresentados em primeira mão no Super Bowl. Ontem ficou a conhecer-se mais algumas imagens do novo Missão Impossível, dos Vingadores: Guerra do Infinito ou da muito antecipada segunda temporada série da HBO, Westworld. Nada poderia ser mais banal. (Poderá ver a compilação de todos filmes e séries num único vídeo aqui.) São ferramentas para criar hype, expectativa desenfreada na comunicação social e água na boca dos fãs nos próximos meses que se seguem. E se era mais ou menos esperado que Cloverfield fosse um deles, não se podia prever que fizessem o que acabou por acontecer.
O filme pertence ao franchise (?) Cloverfield. Se não está familiarizado, pense em Black Mirror; no entanto, não o faça no sentido lato, porque não tem muito que ver, mas pense antes ao nível da estruturação: como tudo nos é apresentado. Isto é, apesar de estarmos a falar do mesmo universo em termos narrativos, as histórias são diferentes e não são lineares. No caso da série, em episódios e por temporadas; no caso do filme, bem, há independência entre eles.
O primeiro saiu em 2008, pelas mãos de Matt Reeves (fez a versão norte-americana de Deixa-me Entrar, os últimos dois filmes da saga dos Planeta dos Macacos e é aquele que vai ter a árdua tarefa de substituir Christopher Nolan na cadeira de realização do próximo Batman a solo) com título Nome de Código: Cloverfield. Na altura, não houve grande promoção do filme, havendo apenas trailers — sem quaisquer créditos. E terá sido esta aparente falta de informação que levou a que a publicidade se pendurasse de boca em boca e se fizesse por ela própria. As pessoas andavam intrigadas porque não se sabia muito sobre a história e os seus protagonistas. No entanto, aquelas que saíam das salas de cinema, saíam satisfeitas. Quanto ao filme, é imaginar um filho de Projeto de Blair Witch e de um Godzilla que aparece pouco, mas que sabemos que anda por lá a atazanar o juízo ao Pentágono e a destruir as infraestruturas mais conhecidas de Nova Iorque (com aquele romance pelo meio, claro).
Em 2016, sai o surpreendente 10 Cloverfield Lane, em que um desconhecido Dan Trachtenberg assumiu a realização e acabou por fazer algo semelhante ao que Foge (2017) fez o ano passado — arrancou boas críticas e a satisfação dos espectadores em geral. No elenco, figuram nomes como John Goodman (O Grande Lebowski), Mary Elizabeth Winstead (última temporada de Fargo) e John Gallagher Jr (The Newsroom, Temporário 12). É intenso, tem suspense e suscitou ânimo para aquilo que poderia estar aí a vir — só não se sabia bem quando. Paralelamente, pode agradar a quem não tenha ficado satisfeito com o primeiro.
Sobre o filme em si, como escrevemos, este não funciona como sequela do primeiro. (Até porque a equipa que estava por detrás do tema achou que o guião se podia enquadrar no universo Cloverfield já em fase de pré-produção.) Não obstante, tal como já tinha acontecido em 2008, o filme não contou com grande promoção. E para além de ter sido anunciado meio que de forma inesperada, aconteceu a meros dois meses de se estrear nas salas norte-americanas. Todavia, uma vez mais, a situação levou a que fossem criadas várias especulações e burburinho em torno da questão: estava ou não ligado ao filme de Reeves? Para quem já viu o filme e se não descortinou bem em quê, há várias pistas que o confirmam. E J.J Abrahams, o produtor, também.
Ontem, saiu Cloverfield Paradox. Sobre este, reza o seguinte resumo de apresentação retirado da própria Netflix: "Em órbita sobre um planeta à beira da guerra, um grupo de cientistas testa o dispositivo que pode solucionar uma crise de energia e acaba numa realidade negra paralela". Tem como protagonistas Daniel Brühl (Adeus, Lenine!, Sacanas Sem Lei ou Capitão América: Guerra Civil), David Oyelowo (Selma: A Marcha da Liberdade) ou Gugu Mbatha-Raw (Belle", A Força da Verdade ou Beyond the Lights).
As primeiras críticas já se escreveram, apesar de estar disponível há menos de 24 horas — e não são muito favoráveis. Contudo, o mesmo aconteceu com Bright, filme protagonizado por Will Smith e Joel Edgerton, mas tal não impediu que este contasse com 11 milhões de visualizações nos primeiros três dias.
[Artigo atualizado às 17:49]
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