“Do ponto de vista dos trabalhadores, a privatização da ANA trouxe um aumento brutal de precariedade nos aeroportos nacionais”, afirmou Fernando Henriques, do Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos (Sitava), perante os deputados da Comissão de Economia, Obras Públicas e Habitação.
O representante sindical considerou que a privatização da gestora aeroportuária “foi lesiva do interesse público” e “ainda mais lesiva para os trabalhadores” e que o negócio foi bom para a Vinci e também para o presidente do Conselho de Administração, José Luís Arnaut, que, lembrou o sindicalista, assessorou o processo de venda.
Fernando Henriques disse que se tem assistido ao esvaziamento dos quadros da ANA nos últimos 10 anos, com menos 20% de mão de obra face ao período antes da privatização, e com um número de passageiros que quase triplicou.
Este esvaziamento, prosseguiu, traduz-se no recurso a empresas de subcontratação que têm dificuldade em pagar mais do que o ordenado mínimo nacional, levando a que haja “precariedade generalizada nos aeroportos portugueses”.
Da parte do Sindicato Democrático dos Trabalhadores dos Aeroportos e Aviação (Sindav), José António Vinagre alertou que a paz social na empresa “está por um fio”, numa altura em que após cerca de três anos e quase 60 reuniões ainda não foi possível chegar a consenso para um novo acordo de empresa, depois de a ANA ter denunciado o anterior acordo de 2015.
O Sindav recordou ainda que a ANA anunciou, no ano passado, a intenção de vender a sua empresa de serviço em terra Portway, mas até ao momento não foram comunicadas mais informações.
Já Rúben Simas, do Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Aviação Civil (Sintac), considerou que a privatização da ANA trouxe um conjunto de preocupações e desafios que têm impacto nos trabalhadores, na operação e nos passageiros.
“Desde o início da concessão por 50 anos – exageradamente longa – observamos […] maior pressão sobre os trabalhadores, em virtude do crescimento do tráfego aéreo”, apontou o Sintac.
Antes dos sindicatos, foram também ouvidos representantes das comissões de trabalhadores (CT) da ANA e da Portway, que acusaram a empresa de ter transformado os aeroportos em “centros comerciais” e de recorrer à subcontratação.
“Cerca de um terço dos trabalhadores são aquilo a que a administração chama de reciclagem. A Subcontratação é feita sazonalmente, […] por exemplo em 31 de março são capazes de sair 600 trabalhadores e no dia 01 de abril entram mais 600, é o que a empresa chama de reciclagem”, explicou Bruno Granito, da Portway.
Da parte da CT da ANA, João Figueiredo defendeu que a privatização não defendeu os interesses do país e vincou que “não existia nada no contrato de concessão que apontasse para uma alteração no fundo de pensões”, que a empresa suspendeu.
A privatização da ANA ao grupo francês Vinci foi anunciada em 27 de dezembro de 2012 e concluída em setembro de 2013, num processo controverso que motivou chamar os intervenientes a prestar esclarecimentos no parlamento mais de uma década depois.
O grupo parlamentar do PCP tinha apresentado uma proposta para criação de uma Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar, “tendo por objeto apurar as responsabilidades políticas e administrativas dos Governos e dos Conselhos de Administração da ANA Aeroportos que envolveram a privatização da empresa e as suas implicações para o Estado e a gestão da rede aeroportuária nacional”, mas foi rejeitada com os votos contra do PSD, PS e CDS e a abstenção do Chega.
Por requerimento do PCP, vão ser chamados ao parlamento o antigo primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, o antigo ministro das Finanças Victor Gaspar, a antiga secretária de Estado do Tesouro Maria Luís Albuquerque, o antigo secretário de Estado das Infraestruturas Sérgio Monteiro, o presidente do Conselho de Administração da ANA, José Luís Arnaut, o presidente executivo da empresa, Thierry Ligonnière, e as organizações representativas dos trabalhadores da gestora aeroportuária.
Já o PSD requereu as audições dos ex-ministros das Infraestruturas socialistas Pedro Marques, Pedro Nuno Santos e João Galamba, do presidente do Tribunal de Contas, José Tavares, do juiz conselheiro relator do relatório de auditoria sobre a privatização da ANA, José Manuel Quelhas, e da juíza Maria José Brochado, bem como dos ex-presidentes do Conselho de Administração da Parpública Joaquim Pais Jorge e Pedro Ferreira Pinto.
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