Numa das ruas mais emblemáticas de Lisboa, que volta a ter movimento, depois de vários meses ‘deserta’ devido à pandemia de covid-19, vários turistas paravam para ver um grupo de trabalhadores bancários que segurava cartazes onde se lia “não somos só números”, numa concentração convocada pelo Mais – Sindicato do Setor Financeiro (da UGT) e pelo Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários (SNQTB, independente).
Depois de, em setembro, o BCP e o Santander Totta terem confirmado que iam avançar com despedimentos coletivos (uma vez que não conseguiram que o número de trabalhadores pretendido saísse por acordo), todos os sindicatos de bancários convocaram uma greve — a primeira nacional desde 1988 — e várias concentrações pelo país.
Para o presidente do Mais Sindicato, António Fonseca, as administrações dos bancos estão a ser intransigentes no que diz respeito à redução de trabalhadores.
“O BCP já despediu cerca de 750 pessoas, entre despedimentos coletivos e reformas, e também o Santander já diminuiu cerca de 1.200 trabalhadores. Nós temos dito, os sindicatos, que já chega. Já chega de tanta redução de trabalhadores. Penso que isto tem de ser feito de forma gradual, com mais apoio social e com mais responsabilidade social”, disse à Lusa o dirigente sindical.
O responsável recordou que os sindicatos dos trabalhadores bancários que pertencem à União Geral de Trabalhadores (UGT) interpuseram, na quinta-feira, uma providência cautelar para tentar impugnar o despedimento coletivo, que consideram ilegal.
“Se há uma ameaça entre ‘ou aceitas a rescisão de mútuo acordo, ou vais para o despedimento coletivo’, nós achamos que isto é ilegal”, apontou o Mais Sindicato.
Para António Fonseca, “os bancos estão a aproveitar a oportunidade” de os clientes se estarem a afastar dos bancos, devido à pandemia e à digitalização de serviços, para diminuir constantemente recursos humanos “de forma desumana”.
Por sua vez, o vice-presidente do SNQTB, Luís Cardoso Botelho, considerou que aqueles bancos estão a levar a cabo um processo de reestruturação “muito agressivo”.
“Com este processo de reestruturação sairão da banca, ou estão em vias de sair desses dois bancos, cerca de 2.000 trabalhadores: 1.300 no Santander, 700 no BCP. Nós consideramos que é uma saída excessiva, tendo em consideração os indicadores desses bancos, económicos e financeiros, sobretudo o banco Santander, [que] em Portugal é um dos melhores bancos do grupo Santander, na Europa e no mundo”, apontou o dirigente do sindicato independente.
Luís Cardoso Botelho sublinhou que se trata de uma redução de 25% dos trabalhadores no caso no Santander e de 14% a 15% no BCP.
“Não aceitamos, rejeitamos esta forma de dialogar com os trabalhadores e, portanto, fazemos a greve. […] Este sindicato fez de tudo para não chegarmos aqui, nós batemos a todas as portas que podíamos ter batido, Presidente da República, primeiro-ministro, Governo, a Assembleia da República, partidos”, apontou.
Para Casimiro Gonçalves, funcionário do BCP, os trabalhadores não passam de “números” para a administração do banco.
“Eles [a administração] querem fazer é dinheiro, dinheiro, dinheiro, mais nada do que isso. Nós somos apenas números”, lamentou o trabalhador, que se vai reformar no próximo ano.
Nos últimos meses, os sindicatos têm vindo a acusar os bancos de repressão laboral e de chantagem para com os trabalhadores, considerando que os forçam a aceitar sair por rescisões (sem acesso a subsídio de desemprego) ou por reformas antecipadas. Isto ao mesmo tempo que têm elevados lucros, acrescentam.
O BCP teve lucros de 12,3 milhões de euros no primeiro semestre (menos 84% do que no mesmo período de 2020) e o Santander Totta 81,4 milhões de euros (menos 52,9%).
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