O grupo AVIC tomou a decisão de suspender, a partir de 13 de junho, oito carreiras de transporte público urbano e interurbano, bem como vários horários em diversas linhas, por gerarem “receitas de bilhética de apenas 86,20 euros, por dia, por viatura, valor insuficiente para cobrir sequer os custos do motorista, quanto mais os restantes custos operacionais”.
Em causa está a atualização do valor das compensações por Obrigações de Serviço Público (OSP), atribuído às operadoras, ao abrigo do programa Incentiva + TP.
Até 2023 o valor foi de 250 euros, por dia, até 150 quilómetros percorridos. Para este ano, a transportadora propõe uma atualização para os 285 euros, por dia, até 100 quilómetros percorridos, rejeitando a proposta da autarquia que é de 285 euros, por dia, por 125 quilómetros.
Contactado pela Lusa, o diretor executivo do grupo AVIC, Ivo Cunha, adiantou que a suspensão irá manter-se “por tempo indeterminado”.
“Se a Câmara aceitar as condições mínimas para operar, obviamente a situação será revertida e o serviço será reposto”, referindo-se à atualização da compensação para os 285 euros, por dia, até 100 quilómetros percorridos.
O contrato de concessão do serviço público de transporte coletivo de passageiros foi celebrado, entre o município e a Transcunha - Transportes Rodoviários de Viana, LDA, do grupo AVIC, por escritura pública, em 2015 e termina, em 2025.
Além da situação em Viana, também o presidente da Câmara Municipal de Ponte de Lima disse não poder aumentar o valor das compensações pelo serviço público de transporte de passageiros (SPTP) enquanto o grupo AVIC “não comprovar que teve aumento de custos”.
“Enquanto a empresa não nos comprovar que, efetivamente, teve um aumento de custos, não posso aumentar o valor. Em Ponte de Lima temos sete ou oito operadores, todos aceitaram a nossa proposta menos o grupo AVIC, e foi igual para todos”, disse à agência Lusa Vasco Ferraz.
“Acredito que a empresa possa ter algum défice, mas ainda não consegui perceber de forma a dar-lhes razão. Continuamos a não ter informação correta, continuam a enviar informações erradas no que diz respeito aos passes escolares, com duplicação de nomes e até de crianças que até já nem sequer estão a estudar no sistema. Com estas incongruências não conseguimos pagar o que lhes apetece. O sistema tem de ser justo”, afirmou o autarca do CDS-PP.
O que diz a autarquia?
Na semana passada, a autarquia advertiu que, “enquanto vigorar, o contrato de concessão confere à concessionária o direito exclusivo perante os utilizadores e à concedente assegurar os serviços objeto da concessão (serviço público de transportes coletivos de passageiros da área urbana (…), sem remuneração pelo município”.
“O contrato de serviço público de transporte coletivo de passageiros celebrado assumiu a natureza de um verdadeiro contrato de concessão (…), não envolvia qualquer remuneração pela entidade adjudicante, sendo o operador de transportes remunerado pelas tarifas cobradas aos passageiros”, sublinha a autarquia.
Acresce, adianta o município, “que o concessionário, Transcunha - Transportes Rodoviários de Viana, LDA aceitou, de forma incondicional, o conteúdo do caderno de encargos do procedimento”.
“Desta forma, não é legalmente admissível, em homenagem ao princípio da concorrência na celebração e execução dos contratos públicos, quer a pretensão de alteração das obrigações constantes do caderno de encargos, bem como o incumprimento das mesmas durante a execução do contrato correspondente”, sustenta.
Apesar disso, a autarquia garantiu, logo no primeiro dia de constrangimentos, “de forma transitória e a título excecional, o transporte dos circuitos urbanos da cidade e de Areosa e Meadela com recurso a oito autocarros próprios e de forma gratuita.
Com isto tudo, como ficam os utentes?
Ao fim de cinco dias sem a totalidade dos transportes, os utentes dos transportes públicos do Alto Minho criticaram a situação de “rutura e colapso” no concelho de Viana do Castelo, acusando a autarquia de incapacidade e pedindo ajuda “às autoridades de transportes e ao poder político”.
“Atenta a situação insustentável de colapso dos transportes públicos em Viana do Castelo e a incapacidade demonstrada pela autarquia de gerir a rede, apelamos às autoridades de transportes e ao poder político que tomem as medidas necessárias para garantir que as populações desta região não continuam a ser discriminadas e a não beneficiar dos apoios financeiros do governo central da mesma forma que beneficiam os restantes portugueses”, afirma o movimento de utentes, em comunicado de 18 de junho.
De acordo com os passageiros, a incapacidade da Câmara de Viana do Castelo tem-se traduzido numa “redução de horários de autocarros temporária durante a pandemia”, que se tornou, “na maioria dos casos, definitiva” ou na “inexistência de transportes aos domingos e feriados, e residual aos sábados”.
A isto, soma-se a “redução do apoio financeiro nas deslocações Viana do Castelo – Porto”, que passaram de 88 euros por mês em 2023, para 171,60 euros mensais em 2024”.
Em maio, houve ainda uma “supressão do desconto direto na aquisição de passes e bilhetes, obrigando os utilizadores a solicitar fatura ao operador e, posteriormente, reembolso à autarquia”.
Os utentes assinalam ainda a “inexistência de apoio ao transporte ferroviário, com custo do passe Valença – Viana de 115 euros e Viana – Porto de 180 euros”.
Para além disso, destacam a “supressão de linhas e redução de horários dos autocarros urbanos e suburbanos” desde quinta-feira.
“Contrariamente à evolução positiva que se tem registado um pouco por todo o país, fruto dos programas governamentais de apoio aos transportes públicos e do empenho dos autarcas, em Viana do Castelo o desincentivo à utilização de transportes públicos traduz-se num conjunto de obstáculos que se têm avolumado”, lamentam.
De acordo com os utentes, “perante esta sequência de eventos a reação da Câmara de Viana tem sido uma sucessão de anúncios mediáticos de intenções de projetos não fundamentados, ao invés de ações concretas de incentivo à utilização de transportes públicos”.
Desde janeiro que estes utentes reivindicam “igualdade” com a criação de um “passe de baixo custo” até ao Porto, evitando a subida de 88 para 200 euros mensais na deslocação.
O que diz a Autoridade da Mobilidade e dos Transportes?
A Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT) disse esta semana que “enquanto o serviço público de transporte de passageiros (SPTP) se encontrar a ser executado por operadores do grupo AVIC, estes devem ser adequadamente compensados pelo mesmo”.
Em resposta, por escrito, a um pedido de esclarecimento enviado pela agência Lusa, a AMT considera que o “impasse” criado em torno da atualização do valor das compensações por Obrigações de Serviço Público (OSP), atribuído às operadoras, ao abrigo do programa Incentiva + TP, “não pode nem deve prolongar-se no tempo, pela incerteza que causa tanto nos operadores do grupo AVIC, como nos passageiros”.
A agência Lusa contactou o presidente da CIM do Alto Minho, [por ser a entidade que representa os dez municípios do distrito de Viana do Castelo], Manoel Batista, para uma reação à posição da AMT e para saber quantos concelhos já acordaram valores com a empresa, mas ainda não obteve resposta.
Em declarações aos jornalistas, à margem uma sessão comemorativa dos 766 anos do Foral Afonsino de Viana do Castelo, o presidente da autarquia Luís Nobre remeteu uma posição para a CIM do Alto Minho e disse que “município não recebeu nenhuma orientação, nem nenhuma indicação concreta de estar em situação de incumprimento”.
“Há outros municípios que não avançaram tanto nas propostas como Viana do Castelo. Essa informação da AMT terá a ver com outros municípios [do Alto Minho] e não com Viana do Castelo. Há municípios que se mantêm na proposta inicial. Não sei porque não se fala nesses municípios. Porque só se fala em Viana do Castelo”, questionou, sem especificar os municípios em causa.
No esclarecimento enviado à Lusa, a AMT acrescenta ter “recomendado às autoridades de transporte (AT) envolvidas [as dez Câmaras municipais do distrito de Viana do Castelo e a CIM do Alto Minho] que regularizem com a maior urgência a situação dos pagamentos do SPTP efetuado nas suas áreas geográficas de abrangência”.
Quanto “à prestação de SPTP nos municípios onde ainda não se alcançou um acordo, a AMT recomendou que as partes retomem as negociações, tendo em vista alcançar um resultado satisfatório para todos os envolvidos e que salvaguarde os interesses das populações, mantendo o SPTP nestas áreas”.
“A AMT nota que não se pode substituir à entidade adjudicante na formação dos valores a pagar a título de eventual compensação, nem se pode substituir à gestão de contratos de OSP na monitorização regular, cabendo-lhe intervir aquando da verificação da violação de normas legais ou contratuais”, refere a nota.
Para a AMT, “o cumprimento de OSP deve ser compensado na exata medida da imposição de tais obrigações e dos efeitos que as mesmas provocam, sendo da responsabilidade das AT competentes proceder a tais compensações, naturalmente, em função das disponibilidades financeiras”.
“Caso estas não existam, então, o nível de obrigações impostas tem de ser ajustado ou devem ser adotadas outras medidas que as AT considerem mais adequadas, com respeito pelos princípios da transparência, da concorrência não falseada e da promoção e proteção dos direitos dos utilizadores/passageiros”, sustenta.
*Com Lusa
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