
"Tenho aprendido imenso com estes alunos... Vêm com muita vontade de aprender, com os olhos muito abertos e super agradecidos", diz Joana Estorninho de Almeida, diretora do centro do CIEE em Lisboa, onde recebeu o SAPO24 para falar sobre o programa que está prestes a começar.
O CIEE é uma organização não governamental americana, que escolheu Lisboa para a sua sede europeia. É lá que, desde 2017, se realiza o programa "Ecossistemas Aquáticos e Sustentabilidade", que traz alunos dos 14 aos 17 anos até à capital portuguesa durante três semanas, todos os verões. Com aulas de segunda a sábado, o currículo inclui ainda atividades como snorkeling, kayak, surf e observação de golfinhos.
A maioria dos estudantes vem através de bolsas, com tudo incluído e financiadas pelo CIEE, que lhes dão a oportunidade de viver uma experiência que nunca antes tiveram. Os alunos podem vir de qualquer parte do mundo, apesar da maioria vir dos Estados Unidos.
"Vêm alguns miúdos das grandes cidades, que são um pouco mais privilegiados e já conhecem o mundo. E depois, vêm outros que se calhar nunca tinham saído do Estado deles sequer", conta a diretora, revelando que até já se emocionou com as histórias de algumas das crianças que têm cruzado o seu caminho. "Uma vez estávamos na praia da Costa da Caparica a almoçar e uma miúda desatou a correr para a água, toda vestida. Fui atrás dela e comecei a chamá-la, até que ela me diz que nunca tinha visto o mar antes, e que aquele era um dos momentos mais felizes que já viveu."
As famílias de acolhimento
Todos os anos, o CIEE Lisbon procura famílias dispostas a acolher os jovens que participam no programa. Qualquer tipo de família se pode inscrever, desde pais e mães solteiras até aos reformados. Os únicos requisitos são morar na zona da Grande Lisboa oferecer um quarto ao estudante, pequeno-almoço e jantar. A organização paga um valor justo por cada estudante acolhido e garante apoio 24 horas por dia.
Apesar deste ser um curso sobre sistemas aquáticos e sustentabilidade, a aprendizagem intercultural não deixa de ter a devida importância. É aí que as famílias desempenham o maior papel, nomeadamente, quando é hora de jantar.
"O momento privilegiado da nossa rotina na cultura portuguesa é sentar à mesa e conversar. No fundo, queremos dar essa experiência aos alunos", diz Joana, que aproveita também para explicar que o domingo é o dia da família, onde aqueles que acolhem aproveitam para fazer um plano diferente com os acolhidos.
"O jantar continua a ser um momento de encontro em minha casa, onde falamos de tudo"
Quem concorda é Carla Araújo, que recebe estudantes em sua casa, anualmente, há já 12 anos. Mãe de duas filhas, afirma que começou por participar uma vez que achou interessante poder dar às filhas a oportunidade de ter contacto com a língua inglesa e com crianças da mesma idade. Com o tempo, tornou-se um hábito e assim, ao longo dos anos, já passaram por aquela casa mais de 20 alunas.
"Apesar das minhas filhas já terem 24 e 17 anos, o jantar continua a ser um momento de encontro em minha casa, onde falamos de tudo. É engraçado perceber que elas conseguem falar de coisas comuns, muito presentes na vida delas, e outras vezes trocarem vivências muito diferentes", diz Carla ao SAPO24.
O intercâmbio cultural é outro dos aspetos que parece funcionar para os dois lados, uma vez que por cá as famílias também sentem que aprendem com quem vem do lado oposto do mundo.
“Estes alunos trazem-nos uma América que não é a dos filmes, trazem-nos uma vivência que é muito mais plural do que a que nos chega pelos media tradicionais, seja a televisão ou o cinema. Essa aprendizagem torna-nos mais críticos, pela positiva e pela negativa. Há coisas em que percebemos que não estamos a fazer bem e outras em que, pelo contrário, percebemos que temos muita sorte”, revela Carla.
A barreira linguística podia ser um problema, mas pelo que parece, não é. Não só há um esforço por parte da organização para fazer o “match perfeito” entre o aluno e a família que o vai receber, mas há também muita flexibilidade entre os hóspedes e os hospitaleiros.
“Tentamos pôr as senhoras mais velhas que não falam inglês com pelo menos um aluno que fale espanhol. Muitos alunos são filhos de imigrantes e têm origens latino-americanas, portanto falam, pelo menos, o espanhol, e conseguem comunicar”, explica Joana, uma vez que não é incomum a participação de pessoas mais velhas no programa. Carla partilha da mesma opinião e afirma que “a barreira linguística nunca foi um problema”, pois no final, “acabamos sempre por nos entender”.
O número de alunos participantes no programa tem vindo a aumentar desde a pandemia. No entanto, Portugal, ao contrário de Espanha, continua a não ser um dos países com maior adesão no que toca a famílias de acolhimento. Este verão, o CIEE espera novamente um aumento no número de alunos, pelo que precisam também de muitas famílias. As inscrições estão abertas até dia 15 de abril através deste formulário ou do e-mail cieelx@gmail.com.
“Se as pessoas tiverem vontade de receber, não há como experimentar.. a experiência serve muito como uma aprendizagem para as diferenças”, recomenda Carla a todos aqueles que considerem participar. Para os membros da família mais novos parece resultar também, maioritariamente pelas amizades que fazem. É o que afirma Carla.
“Por vezes são as minhas filhas que perguntam quando é que chega a menina do CIEE ou se este semestre não vamos receber ninguém… É bom quando, por exemplo, uma das alunas resolve criar um grupo de WhatsApp, já depois de terem regressado, e a que dão o nome de Lisboa Fam.”
Artigo editado por Ana Pimentel
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