“[…] Reconhece-se a existência de um contrato de trabalho, sem termos, entre Md Zaber Ahmed e a ré Uber Eats Portugal”, lê-se na sentença do tribunal.
O contrato em causa terá retroativos a 1 de maio de 2023, quando entraram em vigor as alterações ao Código do Trabalho.
Esta é a primeira vez que um tribunal português aplica a presunção de laboralidade entre estafetas e plataformas digitais.
A ação em causa foi intentada pelo Ministério Público, na sequência de uma inspeção da Autoridade para as Condições de Trabalho.
Através desta, segundo a mesma sentença, verificou-se a existência entre Md Zaber Ahmed e a Ubear Eats Portugal “de uma prestação de atividade aparentemente autónoma, mas prestada em condições análogas à de contrato de trabalho”.
Conforme precisou, a prestação desenvolvia-se no âmbito de uma plataforma digital, através da “‘outorga de um contrato de parceiro de entregas independente’, mas em que, ‘inter alia’, a plataforma controla a atividade do prestador, restringe a sua possibilidade de aceitar ou recusar tarefas e fixa a retribuição para o mercado efetuado”.
Na fundamentação da decisão, datada de quarta-feira, está, entre outros pontos, o facto de ser a plataforma a fixar, de forma unilateral, o valor dos montantes a pagar ao estafeta pelas entregas, não havendo qualquer negociação prévia quanto aos critérios utilizados para a definição dos valores.
Por outro lado, a Uber Eats Portugal “controla e supervisiona” a atividade, “restringe a autonomia do prestador da atividade quanto à organização do trabalho” e também “exerce poderes de exclusão de futuras atividades na plataforma, através da desativação da conta”.
O tribunal concluiu também que o estafeta está inserido na organização da Uber Eats Portugal, que “‘não é uma mera intermediária na contratação de serviços entre estabelecimentos comerciais e estafetas'”.
Na rede social Instagram, o deputado do Bloco de Esquerda (BE) José Soeiro, que partilhou o caso, classificou esta decisão “como histórica”, sendo a primeira vez que é reconhecido o direito a um contrato de trabalho e a todos os restantes direitos pressupostos a um estafeta de uma plataforma digital.
“É a primeira decisão de um tribunal português que aplica o novo artigo 12.º-A do Código de Trabalho, pelo qual lutámos e que tantos debates implicou”, referiu.
Para José Soeiro, inicia-se agora uma nova fase no mundo do “trabalho plataformizado em Portugal”
Em novembro do ano passado, a ministra do Trabalho e Segurança Social afirmou, no parlamento, que estavam então em curso 1.000 ações de reconhecimento de contratos de trabalho de trabalhadores de plataformas digitais em situação laboral irregular.
Comentários