“Isto é um problema que afeta não só Portugal. Afeta todos os países da bacia do Mediterrâneo e agora também outros países que até aqui não lidavam com esta matéria. Portanto, as alterações climáticas têm influência direta nisto e nós temos, obviamente, que ter em conta estas questões na preparação que fazemos para cada época de incêndios, até porque a época de incêndios já não existe e nós sabemos que em qualquer momento do ano podemos ter estas situações”, disse Patrícia Gaspar.

Na sede das Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova Iorque, onde participou numa reunião de alto nível sobre a revisão intercalar da implementação do quadro de Sendai para a Redução do Risco de Catástrofes 2015-2030, a secretária de Estado destacou o trabalho que tem sido desenvolvido pelas várias esferas do executivo.

“Há aqui várias dimensões que se conjugam para garantir que estamos o mais preparados possível para conseguir enfrentar mais um verão que se avizinha difícil. Estamos há vários anos a trabalhar na questão da prevenção, na preparação dos nossos territórios, (…) em criar comunidades mais preparadas para enfrentar estas situações, não só no momento da resposta, mas sobretudo naquela que é a chamada resiliência dos territórios, ou seja, garantir que se intervém na floresta, que se fazem as limpezas todos os anos dos caminhos florestais, dos espaços florestais à volta das casas, à volta dos aglomerados”, indicou.

Em termos do dispositivo que dará resposta aos incêndios florestais, Patrícia Gaspar afirmou que este ano está ”mais robustecido” do que em 2022, embora a tendência passe por aumentos menos expressivos a cada ano.

De acordo com a secretária de Estado, Portugal dispõe de um dispositivo sazonal que está preparado para enfrentar aquilo que são os “dias normais de verão”, tendo, porém, a ”capacidade e a flexibilidade” de garantir um reforço período em que o “risco escale”.

Peritos australianos em incêndios florestais defendem que os comandantes dos bombeiros em Portugal devem ter formação mais adequada e “mais experiência” na gestão dos grandes incêndios.

Um relatório feito por quatro especialistas australianos que estiveram em Portugal durante cerca de três semanas em novembro e agora publicado pela Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF), avança que a forma como a Proteção Civil está a nomear os comandantes para liderar as operações no terreno está a levar “a maus resultados na supressão de incêndios florestais”.

Questionada sobre esta avaliação, Patrícia Gaspar recusou-se a entrar em pormenor nas conclusões do relatório mas frisou que Portugal tem feito uma “aposta enorme na área da capacitação e da formação” dos seus bombeiros.

“Se há área onde nós conseguimos evoluir ao longo dos últimos anos é na organização e na capacitação dos corpos de bombeiros, não só a nível dos meios materiais, mas também ao nível da formação e da própria organização, não só dos comandos, mas de todos os bombeiros que estão presentes nos vários dispositivos”, afirmou.

“É um processo contínuo. (…) Nós estamos numa fase de grande alteração, fruto muito desta crise climática. Temos neste momento incêndios de última geração, com comportamentos que há 10 ou 20 anos não se verificavam. E os bombeiros em Portugal, Espanha, em França, na Grécia, no Chile… estão todos num processo de permanente aprendizagem”, avaliou Patrícia Gaspar.

Os peritos australianos, que estiveram em Portugal no âmbito de um projeto que integra o programa de intercâmbio da AGIF e financiado pela fundação Rotary International, consideram também que os agentes da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) podem “não ser os mais apropriados, devidamente qualificados e experientes para realizar ataques prolongados em incêndios florestais”, tendo ficado demonstrada esta situação em fogos que deflagraram no ano passado.

Na sua passagem pela ONU, entre quinta-feira e hoje, a secretária de Estado da Proteção Civil participou numa reunião em que se refletiu sobre as conclusões e recomendações da Revisão Intercalar do Quadro de Sendai e avaliou as mudanças e novos desafios que entretanto emergiram desde 2015.

Em entrevista à Lusa, Patrícia Gaspar classificou o evento como de “elevadíssima importância” e constatou que as políticas relacionadas à redução do risco de catástrofe “passaram definitivamente para a ordem do dia e são uma prioridade neste momento”.

“Trata-se de uma mudança grande de paradigma na forma como os países de todo o mundo e também as próprias Nações Unidas estão a encarar esta questão. (…) . Temos perfeita consciência, em termos globais, que as vulnerabilidades aumentaram e que temos cada vez mais probabilidade – nos vários pontos do mundo – de ter eventos com maior complexidade e de maior dimensão e a cooperação internacional é absolutamente crítica nesta matéria. Dificilmente encontramos um país que sozinho consiga responder e estar à altura de um desafio destes”, observou.

Na quinta-feira, Patrícia Gaspar participou ainda num evento paralelo promovido pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) e pelo Gabinete para a Redução do Risco de Desastre das Nações Unidas (UN DRR) , intitulado “Redução do risco de desastres em países afetados por crises multidimensionais”, e na sessão plenária designada “Traçando caminhos adequados para humanos e natureza”.

Um dos aspetos destacados pela secretária de Estado foi a questão do financiamento e a importância de levar esta temática não só para o setor público, mas cada vez mais também para o setor privado.

Estes eventos foram acompanhados por diversas reuniões bilaterais, como as que manteve hoje com a representante especial das Nações Unidas para a Redução do Risco de Catástrofes, Mami Mizutori, e com Estados-membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

MYMM (CMP) // RBF

Lusa/Fim