"Queremos estar no Alentejo porque nós queremos descentralizar o futebol”. Foi com o intuito de criar um clube que “representa esta geração” que Conguito — nome pelo qual Fábio Lopes, animador da rádio Mega Hits — apresentou o Villa Athletic Club, fundado a 14 de junho de 2022.
Sob a direção de Conguito, o Villa estabeleceu-se em Ponte de Sor para jogar no campeonato distrital de Portalegre. Isto, apesar de ser assumido desde o início que os seus atletas treinariam a cerca de duas horas de distância, na área da Grande Lisboa, conforme foi comunicado à Rádio Renascença.
Além de contar com uma imagem moderna e desempoeirada, este projeto causou burburinho por contar com Meyong — ex-jogador e um dos grandes símbolos do Vitória de Setúbal, onde se iniciou como treinador — para liderar a equipa técnica do escalão de seniores — o único do Villa Athletic Club. Entre os atletas escolhidos para o projeto figuram nomes como Edinho e André Carvalhas, ambos com extensa experiência nos principais escalões do futebol português.
No entanto, as coisas começaram logo a correr mal no primeiro jogo da Taça Remax — prova organizada pela Associação de Futebol de Portalegre (AFP) —, a 9 de outubro, quando ninguém do Villa apareceu para disputar a partida contra o Gavionenses, como relata a Rádio Portalegre.
O jogo seguinte, contudo, assumiria contornos ainda mais bizarros. De acordo com o mesmo meio de comunicação, este domingo, 16 de outubro, o Villa Athletic Club apresentou-se no Estádio Domingos Patalino para o embate com o Elvas Clube Alentejano de Desportos com apenas 12 jogadores e sem equipa técnica. Além disso, os atletas nem sequer dispunham de equipamentos próprios, sendo necessário recorrer à ajuda do Grupo Desportivo Samora Correia, que cedeu os seus.
A Rádio Portalegre conta também que os jogadores tiveram de deslocar-se em viaturas particulares e nem sequer tinham uma folha de papel para oficializar a constituição da equipa ao árbitro da partida, tendo pedido uma ao clube da casa. Mais surpreendente talvez é que o Villa venceu o jogo ao Elvas por 2-0, não obstante as circunstâncias.
O presidente do clube da casa, Paulo Canhão, confessa que nunca viu “uma coisa destas”, relatando que cada vez que um atleta do Villa sentiu dificuldades em campo, uma pessoa na bancada saltou para o campo para providenciar assistência, apesar de não estar acreditado como fisioterapeuta.
Salários em atraso e problemas de financiamento
Quando episódios como estes se somam dentro de campo, normalmente é sinal de que fora do mesmo a situação é bem pior. Um dos jogadores do Villa, Edinho, criticou publicamente Fábio Lopes através de uma história de Instagram, entretanto tornada indisponível.
“Ainda estou para saber quem és, Conguito. Principalmente como é possível fazeres o que estás a fazer a 24 jogadores. Quero ver qual será a tua desculpa agora. Há gente à espera do pagamento dos salários em atraso!”, escreveu o jogador de 38 anos. “Jogadores recusaram-se a ir para outros projetos, jovens despediram-se por [lhes] venderes um sonho”, continua, acusando Fábio Lopes de “ter colocado jovens jogadores “numa casa só com água fria e sem alimentação”. “Isto não fica assim”, garante.
Já no final da manhã desta quarta-feira, quatro dos jogadores dirigiram-se à entrada das instalações do Grupo Renascença — do qual a Mega Hits faz parte — para pedir justificações a Fábio Lopes, noticiou o Record [acesso restrito]. As queixas ecoam as de Edinho: salários em atraso e falta de condições, prometendo uma reação em conjunto
Ao mesmo diário desportivo, Meyong — que, segundo o Expresso, esteve na bancada no jogo em Elvas por não ter sido inscrito — disse sentir-se “enganado e usado” pelo clube, queixando-se ainda de que Fábio Lopes não atende as chamadas telefónicas que lhe são dirigidas.
Com o caso do Villa Athletic Club a começar a espalhar-se nas redes sociais, já houve pelo menos um caso de denúncia por parte de um fotógrafo contactado por Fábio Lopes para prestar serviço num jogo, sem ter recebido o devido pagamento.
No Twitter, André Tenente diz ter recebido um convite de Conguito para fotografar o jogo amigável de apresentação, frente ao Moitense, a 29 de agosto. O fotógrafo alega ter ficado apalavrado um acordo de pagamento para depois do jogo, mas este nunca veio a acontecer, apesar da sua insistência.
Quanto à falta de condições experienciada pelos atletas do clube, o presidente do Grupo Desportivo Samora Correia, Tiago Dias, disse à Rádio Portalegre que permitiu o empréstimo dos equipamentos devido à intenção dos jogadores em “honrar o compromisso e ir a jogo, mesmo sem quaisquer condições por parte dos dirigentes do clube”. Frisando que o clube de Samora Correia não tem qualquer ligação ao Villa nem “possível benefício nesta situação”, o dirigente fez saber, contudo, que a equipa de Ponte de Sor já treinou no seu complexo por intermédio de “um pedido de uma terceira pessoa”.
O SAPO24 contactou o Villa Athletic Club para prestar esclarecimentos, não tendo obtido resposta até à data. Fábio Lopes, porém, enviou um comunicado à agência Lusa através sua assessoria.
“Humildemente, reconheço que estão a ser dias muito difíceis”, afirma, admitindo que “os investimentos iniciais previstos não se concretizaram” e o clube está agora a “ter algumas dificuldades ao nível de patrocínios diretos com marcas”. “Somos uma equipa pequena, mas dedicada inteiramente ao Villa Athletic Club e a encontrar todas as soluções de viabilização deste projeto”, sublinhou, assumindo a confiança de que a sua equipa “tudo fará para chegar a uma solução rapidamente”.
O SAPO24 tentou também contactar Meyong, sem sucesso. Contactado pela Lusa, o futebolista Edinho escusou-se a falar sobre o assunto, remetendo uma declaração para quando “as coisas acalmarem”.
Foi também contactada a Associação de Futebol de Portalegre para compreender como é que este órgão está a acompanhar o caso, não tendo sido obtida uma resposta à data de publicação deste artigo.
Aquando ao lançamento do Villa, o presidente da AFP, Daniel Pina, disse à Renascença aceitar o clube de “braços abertos”. “Todos os clubes são bem-vindos à Associação de Futebol de Portalegre, sejam eles clubes novos ou clubes que são reativados. Vemos sempre com bons olhos termos mais clubes, mais equipas e mais atletas, porque para nós o mais importante é isso. E o Villa é um clube que se filiou porque tinha todos os requisitos para se filiar”, adiantou.
Daniel Pina, no entanto, respondeu à agência Lusa, remetendo esclarecimentos sobre o caso para uma conferência de imprensa que se realiza, na quarta-feira, na sede desta associação de futebol, em Portalegre.
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