Kathleen Krüger é a mulher mais poderosa do Bayern Munique. É team manager desde 2009. A nível nacional, Maria João Figueiredo, fez história ao ser a primeira mulher presidente de um clube. No caso, do Futebol Clube Barreirense. Patricia Rodríguez é CEO do Elche CF (Liga espanhola) depois de vários anos a tratar das finanças no Eibar, emblema liderado por uma outra mulher, Amaia Gorostiza.

Estes, são alguns, entre outros, exemplos de liderança no feminino no desporto, em geral, e no futebol, em particular.

Centrando, por agora, as atenções na bola redonda. Se na Federação Portuguesa de Futebol, Mónica Jorge, diretora para o Futebol Feminino, é a única mulher na direção, na Liga Portuguesa de Futebol Profissional “elas” estão em maioria na direção executiva.

“Temos dois homens e três mulheres”, salientou Sónia Carneiro, diretora-executiva da Liga Portuguesa de Futebol durante o Fórum Nacional ALL IN – Rumo à Igualdade de Género no Desporto, evento online que procurou debater as desigualdades de género no mundo do desporto.

“A nível de colaboradores, são 40 homens e 30 mulheres”, enumerou durante a intervenção no painel “Liderança no desporto”, que contou ainda com Elisabete Jacinto, piloto e membro da Comissão Mulheres e Desporto do Comité Olímpico de Portugal (COP), Carlos Paula Cardoso, Confederação do Desporto de Portugal e Pedro Sequeira, presidente da Confederação Treinadores de Portugal.

“Há um caminho a ser feito. Estamos melhor do que há 10 anos e muito melhor do que há 20. Mas falta fazer muito”, antecipou a diretora executiva da Liga. “Fazemos tudo o que os homens fazem e ainda um pouco mais difícil. Fazemos em cima de saltos”, atirou.

“Todo o grupo tem de ter um líder. A ideia não me tinha passado pela cabeça”

“Enquanto piloto de moto fazia tudo sozinha. Ultrapassava os obstáculos e traçava as metas”, recordou, ao SAPO24, Elisabete Jacinto, à margem do Fórum Nacional ALL IN, organizado pelo Instituto Português da Juventude (IPDJ), em parceria com a Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género, os comités olímpico e paralímpico de Portugal e a Confederação do Desporto de Portugal.

“Era um trabalho solitário. A solidão era o grande adversário. É um sentimento devastador”, assume. Na passagem para os camiões sentiu “alívio”, na expectativa de “ter pessoas ao lado”, pensou, então, Elisabete Jacinto.

Não foi exatamente assim. Pelo menos, no início. Depois de uma escolha “cuidada” da equipa, “havia conflitos e ninguém se entendia”, recordou a piloto, vencedora, em 2019, do África Eco Race, na categoria de camiões.

“O clique na cabeça surgiu num dia ao atascar o camião e vi duas pessoas, sem comunicarem, separadas por meia dúzia de metros, cada qual com uma placa e uma sinalética diferente”, recuou. “Sem tomarem uma decisão, percebi aí que o problema forte era de liderança. E percebi que tinha de ter coragem de ser líder”, frisou a primeira mulher a vencer uma longa maratona de todo-o-terreno ao volante de um camião (MAN), prova herdeira do Paris-Dakar.

“Todo o grupo tem de ter um líder. A ideia não me tinha passado pela cabeça”, admitiu. Nascida num tempo em que a mulher “estava em segundo plano”, Elisabete Jacinto, por força das circunstâncias, assumiu essa liderança. “Tive eu própria de assumir e dar mais um passo. Entrei em confronto comigo, com a minha estrutura de rapariga submissa, num mundo em que os homens protegem”.

O passo seguinte levou-a à informação. Procura, recolha e leitura. “Comecei a comprar livros gestão, liderança no futebol, de treinadores e pus em prática”.

O sucesso, e a natural imposição de liderança na equipa, surgiram depois de criar um património multidisciplinar. “Tive que aprender tudo em termos de liderança. Atuava em todas as áreas. Corrida e oficina”, elencou.

Debatendo-se e contrariando a insegurança inicial, “tive de aceitar ser líder e assumir o papel de corpo inteiro. E ser líder sempre, sem vacilar. Porque se tal acontecesse, deixariam de acreditar em mim”, referiu durante a intervenção. Na tomada de decisões, “a última palavra” pertencia-lhe. “A partir daí, começou a funcionar”, acrescentou Elisabete Jacinto.

A estratégia de liderança assentou, e, assenta, na perceção das diferenças entre os dois sexos. “Temos que perceber que há diferenças entre homens e mulheres, na forma de encarar o mundo e de fazer as coisas. Temos de saber lidar com elas. Se não, passa a ser um conflito entre nós”, resumiu, na conversa com o SAPO24. A palavra-chave é “consciencialização”. “Há diferenças que não podem ser ignoradas e algumas são boas”, reforçou.

“A minha equipa teve sucesso, manteve-se anos a fio, conseguimos chegar ao topo, porque foi mista. Teve lado feminino e masculino e com menos meios do que outros. Só mulheres, não funciona. E só homens, idem. O sucesso constrói-se com equipas mistas”, rematou.

O caso português. Mulheres à procura da liderança. Mas só uma lidera, em 28 federações

Em Portugal, a liderança no movimento desportivo era, à data de 31 dezembro 2018, dominada por homens. Entre 28 federações nacionais com modalidades olímpicas, apenas uma, Tiro com Arco, tinha uma mulher como presidente. Maria da Graça Coelho. Em sentido oposto, sete não tinham qualquer mulher na direção: Federação de Atletismo, Boxe, Canoagem, Ciclismo, Hipismo, Tiro e Desportos de Inverno.

Os dados, a que o SAPO24 teve acesso, constam no estudo "ALL IN: Towards balance gender in sport", um projeto conjunto da União Europeia e do Conselho da Europa que tem como principal objetivo apoiar as autoridades públicas e as organizações desportivas na elaboração e implementação de políticas e programas para combater as desigualdades de género no desporto.

Entre as federações "apenas 16% dos vice-presidentes e 11% dos membros da direção, são mulheres". Traduzindo para números redondos, dos 115 vice-presidentes das 28 federações de modalidades olímpicas, 18 são vice-presidências femininas. E três mulheres ocupam cargos na direção.

Como nota de destaque, o Ténis, apresenta o mesmo número (3) de homens e mulheres no cargo de vice-presidentes. E se no IPDJ, então, o Conselho Diretivo era ocupado por “duas mulheres e dois homens”, hoje esse número está em dois para um, favorável ao sexo masculino, o COP, presidido por um homem, dos cinco vice-presidentes, um é mulher. Um número, que ainda assim, no caso da estrutura máxima do olimpismo português, permiti-lhe ter a maior representação de mulheres em órgãos de direção (20%), quando comparado com as federações (11%).

Face a esta realidade numérica, e para contrariá-la, o estudo indica ainda que oito federações (29% do total das 28 estruturas federativas em análise), Tiro com Arco, Atletismo, Basquetebol, Futebol, Golfe, Andebol, Hóquei em Campo e Voleibol, estão a trabalhar para “aumentar o número de mulheres em posições de liderança”, lê-se no documento.