A equipa de equipa de São Francisco ganhou dois dos últimos três campeonatos do principal campeonato de basquetebol do mundo e é a principal candidata a levantar o ceptro da NBA em 2017-2018. O seu treinador é Steve Kerr, técnico que recentemente se tornou no mais rápido de sempre a atingir a marca de 250 vitórias em toda a história da competição (no jogo do passado sábado que opôs os Warriors aos San Antonio Spurs).
Mas esta história é sobre o encontro que se seguiu. E onde Kerr apareceu para trabalhar, mas não fez foi aquilo que era suposto — comandar a equipa. Esse trabalho ficou a cargo dos próprios jogadores. Draymond Green, Andre Iguodala, Stephen Curry e o resto da turma assumiram as rédeas dos Warriors durante o jogo contra os Phoenix Suns. E não se pode dizer — de todo — que se saíram mal, visto que o resultado final acabou em 129-83.
Na verdade, os jogadores assumiram a equipa logo na parte da manhã e não somente durante o tempo que durou a partida frente aos Suns. Kerr assinalou que Iguodala tratou do treino e JaVale McGee ficou ao computador a ajudar na análise dos vídeos. Durante o jogo, David West, extremo veterano, foi apanhado a falar de forma efusiva a partir do banco de suplentes. Draymoond Green fez questão de o acompanhar e co-conduzir a orquestra. Assim como a estrela maior da companhia, Stephen Curry — que por acaso até esteve para levar um aviso por estar a demorar demasiado tempo num desconto de tempo a abrir a segunda-parte do jogo.
“Fui horrível”, revelou o base. “Pensei na jogada. Depois, esqueci-me da segunda opção. Depois, ainda tinha dois rapazes nas posições erradas no quadro [de jogadas]”, finalizou.
Gradualmente e com o passar dos minutos, Green foi assumindo uma posição mais predominante no comando, de acordo com o The Mercury News, publicação da Bay Area, em São Francisco. Indisponível para dar uma ajudinha aos companheiros (está a contas com uma lesão), parecia que já se encontrava vestido para ocasião — estava de fato. E, enquanto ditava as jogadas, West e JaVale McGee vestiram o papel de assistentes.
Quem não ficou contente com esta atitude por parte dos Warriors foi o base adversário daquele jogo, Troy Daniels. O jogador considerou ao The Arizona Republic que a mesma desvirtua o fair play e demonstrou desrespeito. “É desrespeitoso. No entanto, não penso que seja difícil treinar aqueles rapazes. Penso que qualquer um pode fazê-lo”, revelou.
Contudo, nem todos os jogadores dos Phoenix Suns olharam para esta atitude da mesma forma. Dentro do plantel, existem várias opiniões, quer sobre a decisão de Kerr, quer sobre o desrespeito que podem ter sofrido. É que a equipa não atravessa um bom momento na NBA. O jogo com Golden State foi a quarta partida que ditou uma derrota com uma diferença tão acentuada — leia-se acima dos 40 pontos. E os Suns (que somam 18 vitórias e 40 derrotas na liga) tinham perdido 11 dos últimos 12 jogos.
“Demonstra falta de respeito por um adversário. E nós, talvez, neste momento, não merecemos ser respeitados. Quando continuas a perder por 40, as equipas não te vão respeitar. Mas cabe-nos a nós alterar isso”, acrescentou Jared Dudley, jogador dos Suns, à ESPN.
Já Devin Booker, estrela maior do conjunto do Arizona, tem uma opinião diferente da dos colegas. “Podes olhar para isto de duas formas: podes dizer que qualquer um pode orientar aquela equipa ou podes dizer que é um [bom método]. Pessoalmente, gostei. Se eu fosse treinador, eu fazia-o durante o ano. Então, não olharia para a situação como sendo desrespeitoso. Tenho a certeza que há pessoas que vão dizer que o foi, mas eu penso que o Steve [Kerr] é um homem pacato que tem esse tipo de relação com os seus jogadores. Mas, se ele não dispusesse de 4 jogadores All-Star, aí, penso que já não o faria”, concluiu.
Como foi escrito anteriormente, esta derrota por uma diferença de 46 pontos ditou o quarto jogo da época em que perderam por mais de 40 — número igual às derrotas por essa diferença em toda a NBA durante a temporada de 2017-18. Mais: os Phoenix Suns nos últimos 49 (!) anos só perderam por mais de 40 pontos... em quatro ocasiões.
Em defesa de Steve Kerr
O técnico dos Warriors, porém, desmarca-se das críticas. Segundo o próprio, esta decisão cabia transmitir uma mensagem aos seus jogadores e não aos adversários.
“Eu disse ao Jay [Triano, treinador interino dos Suns] que as pessoas podem fazer um grande alarido sobre o assunto, mas nada tinha que ver com desrespeito. Teve tudo a ver com eu chegar à minha equipa. Não consegui fazê-lo no mês passado. Estão cansados da minha voz — eu estou cansado da minha voz. Tem sido um esforço longo nos últimos anos. Não estava a conseguir chegar até eles e imaginámos que seria uma boa noite para sacar um truque da cartola e fazer uma coisa diferente”, revelou à ESPN.
“Penso que os jogadores responderam bastante bem. Sinto que, quando estamos focados, somos realmente difíceis de bater. E esta noite estivemos focados. Penso que só o facto de terem que contar uns com os outros e não terem que ouvir a voz — que soa ao professor do Charlie Brown ou ao pai ou a quem é a voz. Neste momento, é o que lhes pareço. Portanto, eles precisavam de ouvir uma voz diferente”, justificou.
Todavia, ao contrário das vozes críticas, Triano parece não ter ficado incomodado com a atitude de Kerr. “Reparei que as jogadas [da equipa] estavam um bocadinho melhores depois dos descontos de tempo. Nah, não tive qualquer problema com aquilo o Steve fez”, disse entre risos.
Não estando a viver no contexto em que estes jogadores vivem, é fácil condenar a atitude de Kerr. Porém, como escreve Tim Bontemps no The Washington Post, é preciso olhar para a situação e ver todo o espectro, e não somente este jogo. E daí perceber aquilo que o técnico está a tentar amealhar com os resultados da sua experiência. De acordo com Bontemps, nada teve que ver com desrespeito ou fazer pouco da equipa de Phoenix — até porque Kerr foi General Manager (espécie de Diretor Desportivo na estrutura do nosso futebol) dos Suns durante três anos.
Tudo se deveu ao facto de este querer arranjar uma nova motivação e um novo propósito a um conjunto que nos últimos 18 meses viveu sob o estigma “de podemos derrotar qualquer equipa do mundo” e “somos invencíveis”. Quanto ao resultado da experiência, esse parece mais que unânime. Kerr, pelo menos, ficou agradado.
“Penso que correu como esperava. Tendo a experiência como jogador em Chicago, durante três anos seguidos [chegar às finais da NBA]... falo muito sobre isso. Perdes a frescura do primeiro e segundo anos. É emocionalmente esgotante para estes rapazes jogar noite após noite, com as pessoas a tentar batê-los”, disse.
“É diferente. Agora é diferente. Vocês [quem os acompanha] conseguem senti-lo. De há três anos para agora é diferente. Tens de estar preparado para isso. Estamos a tentar guiá-los; estamos a tentar dar-lhes andamento. Penso que estamos num bom momento. Gosto de como a equipa está. Não temos jogado bem nas últimas semanas, mas estamos a criar bons hábitos e esta noite foi um bom sinal”, concluiu.
Os Warriors, com Kerr no comando, sagraram-se campeões em 2015 frente aos Cleveland Cavaliers de LeBron James. Na altura, levantaram-se vozes críticas referindo que tal só aconteceu porque Kevin Love e Kyrie Irving, elementos fulcrais nos Cavaliers, estavam lesionados na altura das Finais.
Como resposta, na época seguinte, a equipa de Golden State acabaria por estabelecer o recorde de vitórias da NBA durante uma temporada regular seguinte: 73 vitórias e apenas 9 derrotas. E muito céptico, deixou de o ser. Contudo, acabou por perder as Finais para a equipa de Cleveland, que se "vingou" assim da temporada passada.
Mas um Kevin Durant, ávido de títulos, estava a acompanhar tudo desde Oklahoma City e durante esse verão mudou-se para a Bay Area. Na época passada, Steph Curry, Kevin Durant, Klay Thompson e Draymond Green lideraram os Warriors em 67 vitórias — às quais se seguiram mais 16 nos playoffs, vingando, na final, precisamente contra os Cavs, a derrota do ano anterior. E ficou somado o segundo título em três anos. "Sem espinhas".
Só que... e agora? Vistas bem as coisas, o registo atual de 44 vitórias e 13 derrotas não seria desanimador para outra qualquer equipa. Mas estes são os Warriors, aqueles que fazem o impensável. O patamar está de tal maneira elevado que não se pode dar ao "luxo" de "normalidade". E 13 derrotas, quando ainda faltam 25 jogos para terminar a época regular, determinou que era preciso um abanão para recolocar as cabeças das estrelas novamente alinhadas. Ou assim Steve Kerr espera. Conquanto, num jogo que ditou uma diferença pontual de 46 pontos, dificilmente se pode advogar que a experiência não tenha atingido o seu intento.
[Artigo atualizado às 19:06. Corrige no segundo parágrafo o resultado do jogo para 129-83.]
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