"Sean Marks teve, na mão, a pior cartada entre todos os General Managers em toda a história da NBA". As declarações foram feitas por Steve Kerr, treinador dos atuais campeões Golden State Warriors, em novembro passado. Marks assumiu funções nos Brooklyn Nets em fevereiro de 2016, depois de ter sido o primeiro neozelandês a jogar na liga. Defendeu as cores de seis equipas durante onze temporadas e, antes de chegar a Brooklyn, passou dez anos em San Antonio, como Assistant General Manager de R.C. Buford, um dos principais responsáveis pela cultura de sucesso que a equipa do Texas construiu nas últimas duas décadas.
Depois daquela que é considerada, por muitos, como a pior troca da história da NBA, em 2013, os Nets ficaram de mãos a abanar. Sem o título que procuravam quando decidiram avançar para a infame troca, e sem as escolhas de 1.ª ronda em 2014, 2016 e 2018. Sem saída.
Quando Marks chegou a Brooklyn, em 2016, o cenário combinava na perfeição com os equipamentos da equipa: era negro. O sucessor de Billy King recebeu uma herança pesada, já que não tinha controlo sobre as escolhas de draft de primeira ronda até 2019 e de segunda ronda até 2020. O futuro da equipa estava hipotecado. Mas o antigo n.º 2 de Buford em San Antonio encarou o seu novo emprego como um desafio. E não perdeu tempo.
Dois meses depois, anunciou a contratação de Kenny Atkinson para o comando técnico. Atkinson não tinha experiência como treinador principal na NBA, mas era apontado como o melhor treinador de desenvolvimento de jogadores da liga norte-americana. Com influências de Rick Adelman, Mike D'Antoni e Mike Budenholzer, quis implementar, desde logo, algumas diretrizes dos seus mestres no estilo de jogo da equipa, como a velocidade nas transições e a utilização do pick & roll (bloqueio direto) como principal jogada ofensiva, aliada a uma mentalidade que aposta declaradamente no lançamento de três pontos (o treinador quer 40 "bombas" tentadas por jogo) e na partilha da bola.
Sendo aquilo a que os norte-americanos chamam de players' coach, Atkison provou, desde o primeiro dia, que gosta de criar uma relação muito próxima com todos os seus atletas. Detesta estar fechado no seu gabinete e prefere andar pelo ginásio a acompanhar o treino físico dos jogadores ou a exemplificar as jogadas que quer ver executadas, durante os treinos. "Os Nets são como uma empresa 'start-up' construída com trabalho árduo. Não somos os Spurs, que estão no modo 'sabemos o que fazer'. Nós somos curiosos, estamos à procura e a testar merdas", afirmou o técnico, bem ao seu estilo nova-iorquino, numa entrevista a um site desportivo mexicano.
Para os adeptos, é um processo que vai exigir paciência. Esta é, de resto, a palavra mais ouvida da boca de Sean Marks.
O General Manager está a ganhar fama. Boa fama. Pelo menos já ganhou a alcunha de "Trader Sean", tanta é a sua atividade ao telemóvel à procura de trocas que possam beneficiar o futuro aparentemente em stand-by dos Nets. Em poucas palavras, está a aceitar atletas com maus contratos para, na mesma negociação, adicionar escolhas de draft. Em pouco mais de um ano e meio, já acumulou quatro escolhas, três das quais (uma de primeira ronda e duas de segunda) para o draft de Junho deste ano. No entanto, Marks não olha apenas para fora. Contratou também uma "Performance Team of Health Specialists" para monitorizar a alimentação, o sono e outros hábitos dos jogadores, como a recuperação física entre jogos.
Outra das apostas do GM é a contratação de jogadores subvalorizados ou que caíram em desgraça. Foi graças à sua arte negocial que garantiu - imagine-se! - as 2.ª e 3.ª escolhas do draft de 2015, respectivamente D'Angelo Russell (os Los Angeles Lakers apostaram em Lonzo Ball para a posição de base) e Jahlil Okafor (o poste mostrou dificuldades de coabitação com Joel Embiid no jogo interior dos Philadelphia 76ers). Os dois jogadores perderam crédito na liga, sobretudo devido a episódios que revelaram falta de maturidade fora das quatro linhas, e os Nets esperam que a mudança de cenário seja sinónimo de melhoria de rendimento desportivo.
Ano e meio depois do início da reconstrução, os sinais de melhoria são evidentes. Após uma época de 2016/17 em que fizeram o pior registo entre as trinta equipas da NBA (20 vitórias e 62 derrotas), os Nets somam, este ano, 15 triunfos - incluindo vitórias sobre Cleveland Cavaliers, Oklahoma City Thunder, Washington Wizards e Minnesota Timberwolves - e 23 desaires, sendo que as projeções dos analistas apontam para uma temporada com 33 ou 34 vitórias. Nesta altura, não só não são a pior equipa da NBA, como têm nove formações com registos mais negativos e estão a apenas quatro vitórias de distância do 8.º lugar da conferência Este, o último que dá acesso aos playoffs.
Só isto seria assinalável, mas é ainda mais notável se tivermos em consideração que Jeremy Lin, a estrela da equipa, se lesionou com gravidade no primeiro jogo da época, D'Angelo Russell jogou apenas doze partidas e Jahlil Okafor tem meros 33 minutos nas pernas desde que aterrou em Brooklyn. A mentalidade "Next Man Up" que Kenny Atkinson imprimiu no seu conjunto de jogadores está a potenciar o aparecimento de algumas das revelações da época da NBA, como são os casos de Spencer Dinwiddie (12.8pts, 3.0res, 6.5ast) e Caris LeVert (12.2pts, 3.8res, 4.2ast).
Não moram All-Stars em Brooklyn, nem sequer há muitos jogadores com experiência de playoffs. Mas o plano está traçado por Sean Marks e, com menos lesões, algum sucesso na free agency e no draft, e o trabalho de desenvolvimento de jovens da equipa técnica liderada por Kenny Atkinson, existe algo parecido com um futuro em Brooklyn.
Pode não ser muito brilhante, pelo menos no imediato, mas não há dúvidas que já há luz ao fundo do túnel.
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