Na rubrica ‘One on One’ da revista inglesa Four Four Two, publicada ontem no site da publicação, Robinho respondeu a várias questões colocadas por fãs através das redes sociais. E se as notícias de há uns anos ajudaram a traçar uma personalidade "menos fácil" do jogador, aquando a sua saída do Real Madrid ou Manchester City, o brasileiro parece agora bem feliz e numa boa fase da carreira. “Um dia sem sorrir, é um dia perdido”, confidenciou. Com 25 golos apontados na época passada pelo Atlético Mineiro no Brasileirão, alguém duvida que não tenha vontade acrescida para esgar um sorriso de orelha a orelha?
Nascido Robson de Souza, começou bem cedo no Urbano Caldeira, mítica casa do Santos, aos 16 anos, a mostrar o talento que já vinha causando algum burburinho interno. Em 2002, estreou-se na primeira equipa e marcou 10 golos. Bem vistas as coisas, podemos considerar que foi um bom mote para o que aí vinha. Afinal, no total, antes de rumar aos ‘blancos’ do Real Madrid, no verão de 2005, foram mais de 80. Mais: a par de Káká, Adriano e Ronaldinho, conquistou a Taça das Confederações, o que certamente terá contribuído para que os merengues, na altura, investissem 24 milhões de euros pelo passe do atleta de 21 anos.
Porém, falar de Robinho é também recuar aos primórdios da sua a carreira no ‘Peixe’, termo pelo qual é conhecido o Santos, clube que o viu nascer para o futebol. Por isso, é de todo natural voltar à velhinha questão “da comparação” com aquele que é considerado um dos melhores jogadores de todos os tempos, até porque não se pode considerar que seja uma história nova ou de contornos inéditos, especialmente, se tivermos em contexto todo o universo futebolístico brasileiro. Assim, se uma nova esperança desponta nas camadas jovens de um clube, mostrando uma aptidão aparentemente inata para driblar sucessivamente os seus pares e marcar uns golos, a comparação é quase automática: vem aí o novo Pelé?
Robinho não fugiu à comparação, apesar do estilo, do físico ou da aptidão natural de um predestinado, que herdou no seu ADN o toque irreverente de quem nasceu com o dom para jogar futebol desnorteando a cabeça dos defesas contrários, poder fazer lembrar o "Rei". Porém, recusa comparações com Pelé.
“Incomparável. Não dá para me comparar a alguém que marcou 1.000 golos, jogou em quatro Campeonatos do Mundo [de seleções] e é considerado como o maior jogador de futebol de sempre. Tenho que agradecer a todos aqueles que estiveram a meu lado durante os primeiros anos, porque sempre fui muito bem orientado durante o tempo em que estive na academia do Santos. Mais ainda quando cheguei à equipa principal e tive o meu treinador, Emerson Leão, a cuidar de mim”.
Já sobre o Rei, esclareceu: “Ele [Emerson Leão] disse-me uma vez: ‘és um grande jogador, podes até parecer-te com ele, mas Pelé é Pelé e Robinho é Robinho’. Claro que era bom ser comparado com ele, mas sempre tive bem assente na minha cabeça que não tinha nada a ver com Pelé. Nunca haverá outro futebolista como ele.”
Robinho insiste, porém, que os 25 golos apontados na época transata não são a principal razão para o seu comportamento alegre durante entrevista. E explica, na primeira pessoa, que hoje em dia é o mesmo rapaz humilde que utilizava transportes públicos na cidade operária de Manchester, em Inglaterra, há uns anos.
“Sendo futebolista, as pessoas acham estranho, mas sempre fui bastante humilde e nunca tive problemas em utilizar os transporte públicos. Assim fiz toda a minha vida antes de ser jogador. Porque haveria de ser diferente numa cidade que me recebeu de braços abertos? No entanto, utilizava o carro para ir para os treinos. Não queria arriscar chegar atrasado e chatear o treinador!“, disse, entre risos.
Raul, Zidane e a estreia 24h depois de aterrar em Madrid
Neymar até pode ter optado pelo Barcelona em detrimento do Real Madrid, mas Robinho, há mais de dez anos, seguiu o caminho inverso. E revelou que não foi uma escolha difícil, principalmente porque o atual clube de Cristiano Ronaldo tinha nas suas fileiras jogadores como Ronaldo (o Fenómeno), Zinedine Zidane e Raul.
A vontade de jogar pelos merengues era tanta, que se estreou logo 24 horas após ter aterrado no aeroporto da cidade madrilena. A 28 de agosto, a vinte minutos do fim, na casa do Cádiz, na primeira volta do campeonato, Robinho estreava-se com número 10 nas costas, que até a essa época pertencia ao português Luís Figo. Executou várias arrancadas, mostrou-se confortável com a bola no pé e ajudou o gigante espanhol a vencer por 2-1 com uma assistência (e teria feito duas, mas Helguera falhou um chamado "golo cantado"). Foi capa dos desportivos As e Marca e parecia uma contratação de sonho. A carreira, no entanto, ditou outra história.
"Pode parecer uma escolha difícil, mas não foi. O Real Madrid foi a equipa que mostrou mais interesse em mim. São dois grandes clubes, com fãs em todo o mundo. Mas nessa altura vi que tinham um grande grupo brasileiro no plantel, a equipa técnica também era do Brasil e Vanderlei Luxemburgo era o treinador. Tendo em conta estes fatores, porque haveria de ter ido para o Barcelona?", disse.
Era um balneário galático. E se havia um jogador que estava inserido bem no centro das atenções, era o inglês David Beckham. Sobre ele, o brasileiro não podia ter melhor opinião. Humilde, trabalhador e, aparentemente, melhor a falar português que espanhol.
No entanto, com a chegada do treinador italiano Fabio Capello, o tempo de jogo de Robinho começou a escassear. Não sendo uma aposta clara do novo técnico, foi noticiado que a dada altura foi oferecido pelo clube como moeda de troca na transferência de Cristiano Ronaldo, do Manchester United para o Real Madrid. Será que o jogador continua magoado ou, por outro lado, mostra-se arrependido de ter saído do Santiago Bernabéu?
“Não me arrependo de sair do Real Madrid, mas sim de ter deixado as coisas como deixei na altura da minha saída, já que foi o clube que me abriu as portas e me deu a oportunidade de conquistar a Europa. Talvez pela maneira como forcei a minha a transferência, tenha apagado as memórias das grandes coisas que fiz pela equipa; ajudei-os a serem campeões e penso que joguei bem durante o tempo em que lá passei. Mas estava determinado em sair e como tenho um temperamento explosivo, não pensei bem nas coisas como devia”, explicou.
Dois títulos espanhóis e uma saída acrimoniosa depois, rumou até ao futebol inglês (Manchester City) para marcar 16 golos em 53 jogos. Escasso, ainda assim, para quem custou 43 milhões de euros ao cofres do clube inglês. Tanto assim que acabou emprestado ao Santos na segunda época ao serviço dos citizens, num negócio que se revelou benéfico para ambas as partes: para o atleta, uma vez que reencontrou o caminho dos golos; para o clube, porque "recuperou", futebolísticamente falando, um ativo excedente dos quadros.
Ainda que a estadia em Inglaterra não tenha sido a mais feliz, o brasileiro percebeu que se tratava de um projeto grandioso e destinado ao sucesso, devido ao forte investimento do ‘sheik’ Mansour bin Zayed Al Nahyan no eterno rival do Manchester United.
“Desde o dia da minha chegada que pude perceber que o projeto do City está destinado ao sucesso e que o clube iria crescer - mas nunca pensei que fosse de forma tão rápida. Não sabia muito do clube antes de chegar, mas senti-me honrado por ter sido a primeira contratação mediática. Ainda comecei bem, mas infelizmente não existiam os nomes [no plantel] que existem hoje em dia. O Manchester City é o único clube pelo qual passei sem que tivesse conquistado o título de campeão”, explicou ao Four Four Two.
AC Milan com Zlatan, Ronaldinho e o título de campeão
“Depois da tempestade, vem a bonança”, já diz o ditado. Onze tentos durante os meses de empréstimo ao Santos valeram a Robinho a transferência para a Serie A, em 2010/2011. À época, o avançado brasileiro tinha manifestado o desejo de jogar em Espanha ou Itália e Adriano Galliani, vice-presidente do AC Milan, acenou ao pedido. A sua contratação sucedeu-se à transferência do sueco Zlatan Ibrahimovic, que se tinha transferido do FC Barcelona, e o brasileiro juntou-se em Milão aos compatriotas Alexandre Pato e Ronaldinho. De acordo com o Transfermarkt, o acordo valeu aos citizens algo como 18 milhões de euros.
“Quando me transferi para o Milan, o objetivo era ganhar a Serie A e a Liga dos Campeões. Infelizmente, não ganhámos a Champions, mas conseguimos reinar em Itália novamente. Tínhamos uma excelente equipa: Thiago Silva, Clarence Seedorf, Zlatan Ibrahimovic, Filippo Inzaghi e Alexandre Pato”, começou por dizer.
“Penso que não tinha muito a provar ao Manchester City ou a qualquer um em Inglaterra. Joguei bem durante o tempo que lá estive, apenas não tanto como queria — existiram alguns problemas. É que se queres crescer enquanto clube, precisas de algo mais do que uma ou duas estrelas. Precisas de um grupo sólido e de banco. No Milan, estava rodeado de grandes jogadores. No City, não acontecia o mesmo”, concluiu.
Era um plantel que hoje qualquer adepto rossonerri recorda com uma mescla de felicidade e tristeza. Felicidade, porque são memórias de títulos que o tempo recente não prolongou, além de que se tratava de uma época em que no plantel era composto por nomes como Pirlo, Nesta, Zambrotta ou Ambrosini; tristeza, pois é um cenário bem diferente do que o 6.º lugar no campeonato que atualmente se verifica. No meio, uma curiosidade: segundo Robinho, a sua contratação surgiu na sequência de uma recomendação de... Zlatan Ibrahimovic. E este, ainda hoje, lhe cobra o facto de ter chamado “casa” a San Siro.
“Adriano Galliani disse-me que o Zlatan me tinha recomendado. Ele tinha o respeito da administração do clube, que o tinha contratado ao Barça, altura em que o Galliani lhe falou que havia a hipótese de me contratar”, explicou.
Segundo Galliani, o sueco terá dito ao dirigente para avançar com o negócio porque Robinho se tratava de um “fenómeno” com quem ia trabalhar bem para “assegurar golos que a equipa precisa”.
Porém, duas épocas depois, em 2012/2013, o encanto em Milão esmoronou. Talvez por culpa da saída de Zlatan para o PSG, Robinho não conseguiu ser o protagonista que Allegri pretendia e parecia não encaixar nos planos do técnico. Jogou pouco, teve problemas fora do campo e marcou apenas 2 golos em em 27 jogos.
China, Scolari e novo título
Depois de dois empréstimos ao Santos por duas vezes, o “menino da Vila” acabou por rumar à China para encontrar o Luiz Felipe Scolari. Para além de Felipão, a equipa do Guangzhou Evergrande contava com jogadores brasileiros como Paulinho e Ricardo Goulart. Estávamos em junho de 2015, quando Robinho chegou a território chinês e assinou um contrato por seis meses. A aventura pelo continente asiático acabaria por traduzir-se em 10 jogos e 3 golos (em 30 jornadas). No entanto, foi o que bastou para se sagrar campeão chinês.
Sobre o futebol chinês o avançado confidenciou que gostou de lá jogar e que consegue antever uma evolução do desporto no país.
“O futebol está a crescer a um ritmo rápido na China. Os treinadores estrangeiros estão a trabalhar imenso para desenvolver o jogo e o nível dos técnicos. Tive uma boa experiência no Guangzhou e consigo vê-los a evoluir. Há poucos anos, era pouco provável ver um jogador de renome aceitar uma oferta de um clube chinês, mas agora conseguem fazer frente até aos maiores clubes europeus. Há tanto dinheiro envolvido que não pensas duas vezes em mudar-te para lá se tiveres oportunidade”.
Regresso ao Brasil para chegar à canarinha
“O meu objetivo é voltar à seleção, mas antes tenho de jogar bem”, declarou o futebolista ao assinar pelo Atlético Mineiro, em 2016, após a curta experiência no Guangzhou Evergrande.
Da mesma forma, revelou ambição para conquistar um título que ainda não tem no palmarés, a Taça Libertadores da América: “Não é uma obsessão, mas é um título importante que ainda não tenho. Agora tenho a oportunidade de ser campeão com o Atlético Mineiro e esse é o meu objetivo.”
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