Entre um golo cheio de Vida e uma derrota em forma de pesadelo
O trocadilho é simples e fraco, mas a verdade é que o golo do 2-1 croata deu outra Vida a um jogo intenso no meio-campo e altamente disputado nas recuperações de bola e contra-ataques.
Aquele cabeceamento do central do Besiktas, Domagoj Vida, parecia ser o bilhete para que a Croácia pudesse regressar a uma fase da competição que só tinha alcançado no Campeonato do Mundo de França, em 1998. Contudo, Mário Fernandes, o central russo de dupla nacionalidade, decidiu devolver o gesto e fez o empate quando faltavam escassos minutos para o fim do tempo de jogo.
Penaltis. Loucura e Subasic volta a ser um “íman” ao amparar os remates necessários para ajudar a sua seleção a apurar-se para as meias-finais. Caiu a anfitriã, fez-se justiça perante a magia e facilidade do jogo croata.
Por falar em apuramentos, a canarinha está mesmo de relações cortadas com o hexa e a derrota com a Bélgica é uma prova total disso mesmo.
Courtois foi imperial, Kevin de Bruyne disse “presente” e os belgas resistiram à qualidade tática de Tite. Neymar Jr. ainda teve um acesso de fúria atirando um remate indefensável aos 90+2, uma expressão da gíria futebolística que guardião belga decidiu redefinir com uma palmada sensacional para parar o remate do astro brasileiro.
Aquele momento após o apito final mostra um Neymar ajoelhado perante a evidência de que para se ser campeão é preciso ter algo mais do que magia, dribles ou golos.
Contudo, houve um guardião que teve uns quartos-de-final para esquecer, Fernando Muslera. O uruguaio teve um lapso de julgamento e abordou um remate de Antoine Griezmann forte, mas à figura de forma infantil.
Parecia uma situação saída do Oliver e Benji, como um remate de Oliver com um efeito mágico que de repente nas luvas do guarda-redes sofria um desvio fantástico. Todavia, estamos no mundo real e Muslera deixou a hipótese do Uruguai atingir às meias-finais fugir por entre as suas luvas.
Passe, técnica, determinação: Luka Modric no Mundial
O destaque individual dos quartos-de-final do Mundial vai para Luka Modric. O médio do Real Madrid é conhecido pela sua qualidade de passe e visão de jogo, duas qualidades que fazem dele um dos melhores médios do mundo. A caminhada da Croácia na Rússia tem assentado muito na qualidade do seu capitão. Mas e o jogo com a Rússia? Teve dedo de Modric?
Para além da capacidade de liderança, o croata foi decisivo na assistência para o segundo golo e com o penalti batido. Mas mais do que aquilo que as estatísticas dizem, Modric foi dono e senhor do jogo. Sempre calmo com a bola no pé, sempre a encontrar a melhor linha de passe, a melhor opção para a equipa. Modric até defensivamente foi importante ao condicionar a saída de bola russa.
Quando a equipa recuperava a bola o médio decidia sempre bem, optando ora pelo contra-ataque rápido ora pela contenção. Mas o mais impressionante é mesmo a disponibilidade física do croata. Já no prolongamento vimos Modric a pegar no jogo e fazer arrancadas com bola para levar a equipa para a frente. Isto depois de mais de 100 minutos nas pernas.
A expectativa é agora grande para se perceber o que é que o médio do Real Madrid consegue fazer no confronto com a Inglaterra.
As bolachas belgas que engasgaram o Brasil
Numa fase já bem avançada do Mundial é difícil escolhermos uma surpresa, pois a partir dos quartos-de-final já todas as seleções em jogo têm uma boa hipótese de levantar o troféu. Todavia, o facto de a Bélgica ter abatido os eternos candidatos merece essa etiqueta.
Mais uma vez, a Bélgica foi perfeita no confronto tático superiorizando-se nas transições, fáceis, no equilíbrio de jogo (as subidas de Kevin de Bruyne eram apoiadas de forma exímia por Axel Witsel) e no momento de definir as jogadas.
É difícil parar uma equipa que tem uma “orquestra” em completa sintonia e que aguenta mesmo com as maiores individualidades, seja de Coutinho, Neymar Jr, Marcelo, Gabriel Jesus ou qualquer outro.
A bossa nova de Tite não sobreviveu ao ataque mordaz e eficaz dos Diabos Vermelhos, que tiveram também aquilo que por vezes ajuda a definir um candidato sério: a estrelinha de campeão.
O primeiro tento do jogo é um auto-golo (já vamos para lá da dezena neste Mundial) que nasce de um cruzamento de Chadli, o suplente passou a titular e ao que parece está com vontade de ser campeão do Mundo, começando o desastre canarinho e a caixa-surpresa belga.
Roberto Martínez finalmente conseguiu unir um grupo que já derrotou um par de candidatos nesta corrida pelo Mundial, com uma equipa que tem de tudo: um avançado soberbo e que sabe jogar fora da área - o segundo golo da Bélgica é construído por Lukaku -, criativos capazes de criar sérias dores de cabeça - Eden Hazard tem se perdido algo nos dribles, mas é a aquela “peça de xadrez” que dita muito a fluidez de jogo da Bélgica -, uma defesa dura e elástica e um guardião que não sabe falhar.
Se no Europeu em 2016 fracassaram, em 2018 estão a um pequeno passo de atingir o cume do Olimpo do Desporto-Rei.
A magia brasileira que teimou em não aparecer
Escolher a maior desilusão numa fase destas é relativamente fácil. O “todo-poderoso” Brasil caiu com estrondo e mais um dos favoritos ficou pelo caminho. O jogo e o adversário já foram aqui analisados, mas o que faltou à canarinha na sua caminhada na Rússia?
Acima de tudo faltou Neymar. O astro do PSG não soltou o seu génio nos palcos da Rússia e pareceu sempre mais previsível do que o normal. O capitão brasileiro era a grande esperança do seu país mas a sua passagem pelo Mundial ficou mais famosa pelas suas quedas e “mergulhos” do que pelo futebol praticado.
Neymar tentou sempre pegar no jogo do Brasil (e o jogo com a Bélgica não foi exceção), mas sempre sem muita eficácia. O talento de Neymar ainda apareceu depois dos 90 minutos, com o jogo em 2-1, mas o brilhante remate encontrou um tremendo Courtois do outro lado.
O resto do Brasil pareceu cair com a falta de soluções a Neymar. Destacou-se Coutinho, com um perfume futebolístico acima da média, como demonstra o passe magistral para o 2-1 no jogo com a Bélgica. Mas ainda assim foi insuficiente e o Brasil caiu mesmo, deixando o Mundial 2018 à mercê de seleções europeias.
Tite tem a sua quota parte de culpa. O Brasil, apesar das excecionais individualidades que tem nunca pareceu uma verdadeira equipa. Nunca conseguiu potenciar o 1x1 de Neymar nem a capacidade finalizadora de Gabriel Jesus, uma das maiores desilusões deste Mundial.
O “escrete” acaba por desiludir numa competição onde havia imensas (talvez demasiadas) esperanças de que chegasse o hexa.
O onze dos quartos-de-final
GR – Thibaut Courtois (Bélgica)
DF – John Stones (Inglaterra), Domagoj Vida (Croácia) e Raphael Varane (França)
MC – Kevin de Bruyne (Bélgica), Luka Modric (Croácia), Coutinho (Brasil) e Golovin (Rússia)
AV – Antoine Griezmann (França), Harry Kane (Inglaterra), Eden Hazard (Bélgica)
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