“Foi uma surpresa em termos de ‘timing’, foi mais cedo do que se esperava”, disse à Lusa Bernando Câncio, do Banco Big, uma opinião alinhada com a de José Lagarto, da Orey Financial, que estava à espera que a S&P fizesse uma mudança de perspetiva para positiva “para preparar o mercado”, antes de alterar a classificação da notação financeira da dívida da República.
Para Filipe Garcia, da IMF – Informação de Mercados Financeiros, que também ficou surpreendido com a decisão, a atribuição pela S&P do grau de investimento à dívida soberana de Portugal é um certificado de que, na opinião da empresa de notação financeira, “o pior já é passado e de que Portugal continua a trilhar um caminho de sucesso perante o problema da dívida” pública, ainda que continue muito elevada face ao Produto Interno Bruto (PIB).
Sobre os impactos desta decisão, os analistas antecipam uma redução das taxas de juro da dívida, que esta manhã negociavam já no mercado secundário em mínimos de janeiro de 2016 no prazo a dez anos e em mínimos de dezembro de 2015 no prazo a cinco anos.
“Com esta decisão, há um conjunto de investidores internacionais em dívida pública que até agora não podiam fazer aquisição de dívida de Portugal para as suas carteiras e que agora podem fazer”, disse Filipe Garcia, referindo-se a fundos de pensões ou outros investidores privados que pelas regras que seguem não podem comprar dívida que não tenha grau de investimento por pelo menos uma das três grandes agências de ‘rating’ (Moody’s, S&P e Moody’s).
Bernando Câncio, do BIG, diz mesmo que a reação hoje do mercado está a ser “mais positiva do que se esperava”, antecipando que o impacto negativo que teria sobre a dívida de Portugal a redução do programa de compra de títulos do Banco Central Europeu (BCE) será, pelo menos parcialmente, compensando por esta decisão da S&P.
“O discurso político também está a ajudar o mercado, deixa os investidores tranquilos” sobre evolução das finanças públicas e da economia, refere.
José Lagarto, da Orey, destaca o impacto que esta decisão tem no interesse de investidores em empresas portuguesas e até facilitar regressos à bolsa, e recordou que o PSI20 está hoje a subir mais do que os congéneres europeus, com o banco BCP a avançar de forma significativa, o que relaciona com o elogio da S&P à recapitalização do setor bancário.
Também António Duarte, gestor da corretora XTB, destaca sobretudo "o efeito especulativo que uma notícia destas acarreta" para a economia, e em particular, para as empresas, uma vez que os investidores voltam a pôr Portugal no radar.
"Atrai quem nunca colocou Portugal na equação, aumenta a probabilidade da tomada de posições e é claramente um bom sinal para a economia do país", afirmou.
A agência de notação financeira Standard and Poor's decidiu na sexta-feira tirar Portugal do 'lixo', revendo em alta o 'rating' atribuído à dívida soberana portuguesa de 'BB+' para 'BBB-', um primeiro nível de investimento.
Com esta revisão em alta para 'BBB-', com perspetiva 'estável', Portugal volta a ter uma notação de investimento, atribuída por uma das três principais agências de 'rating' mundiais.
Desde 2012 que a agência atribuía à dívida soberana portuguesa um rating 'BB+', a nota mais elevada de não investimento, com uma perspetiva 'estável'.
Quanto à Fitch, esta manteve em junho o ‘rating’ de Portugal em ‘lixo’, mas alterou a perspetiva para ‘positiva, o que indica que poderá mudar a nota de Portugal para grau de investimento na revisão de final do ano.
No início deste mês, foi a vez de a Moody’s melhorar a perspetiva sobre a dívida pública portuguesa de estável para positiva, podendo assim rever em alta o ‘rating’, para grau de investimento dentro de 12 ou 18 meses.
Também no caso da S&P o mercado esperava que primeiro alterasse a perspetiva e só posteriormente a nota da dívida soberana, pelo que a decisão de sexta-feira de dispensar o passo intermédio foi uma surpresa.
Os dados económicos positivos da economia foram uma das justificações para a agência tirar Portugal do 'lixo', antecipando a economia a crescer 2% em média até 2020, um défice de 1,5% este ano e menos riscos no acesso ao financiamento.
A agência destacou também o foco do Governo em "fortalecer o sistema bancário português e a consolidação orçamental", recordando que o executivo socialista "cumpriu o seu objetivo orçamental ambicioso" de 2016 e "parece que o vai fazer novamente este ano, apoiado pela aceleração do crescimento económico e incluindo o impacto positivo do mercado de trabalho no balanço da Segurança Social".
Contudo, a agência não deixou de apontar problemas à economia, às finanças públicas e à banca, admitindo que poderá voltar a colocar Portugal no lixo caso as condições do país piore,, nomeadamente com um "enfraquecimento relevante no crescimento económico, devido a um desvio significativo da política económica ou caso não se verifiquem reformas estruturais que potenciem o crescimento".
Também "um desvio considerável e negativo na consolidação orçamental e a adoção de medidas que possam dificultar o acesso de Portugal aos mercados financeiros" podem prejudicar o rating português, avisou.
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