Apesar das famílias terem mais cães do que gatos, o maior crescimento ocorreu na alimentação destes últimos - tanto em valor como em volume. A explicação é a existência de "embalagens maiores e mais pesadas, o que diminui a frequência de compra – 10 vezes ao ano em cão versus 18 vezes" para os gatos, diz a consultora.
No mercado nacional, o estudo "Cat Food in Portugal" de maio passado, elaborado pela Euromonitor com dados relativos a 2016, aponta que a Nestlé é a líder de mercado (com uma quota de mercado nos 35%), e a Mars secunda-a com 14%. Seguindo a "tendência de humanização dos animais", os portugueses devem adquirir mais "produtos alimentares para gatos de alta qualidade".
No caso dos cães, a mesma consultora aponta no estudo "Dog Food in Portugal", também de maio, que essa tendência se irá igualmente verificar em "produtos de valor acrescentado com benefícios nutricionais superiores", sustentada pelas "melhorias económicas". Aliás, antecipa mesmo que a comida "premium" terá melhores vendas do que a chamada "económica".
Neste segmento, a Nestlé deve continuar a liderar o mercado este ano (obteve 20% do mercado em 2016), seguindo-se a Mars com uma quota de 14%. Apesar do número de cães domésticos poder aumentar este ano em Portugal, as vendas de alimentos serão prejudicadas porque a escolha deve recair em caninos mais pequenos, embora atenuada pela selecção de comida preparada mais benéfica e por uma diminuição da oferta de comida caseira.
Quantos são os animais domésticos?
Em Portugal, não se sabe ao certo o número dos animais domésticos, nomeadamente cães e gatos. Em setembro passado, a candidata do partido Pessoas Animais Natureza (PAN) à Câmara de Leiria, Daniela Sousa, arriscou um número, afirmando haver "mais do que cinco cães por pessoa".
A Marktest afirmava para esse ano que 5,4 milhões de indivíduos tinham em casa animais de estimação ("63,1% do total de residentes no Continente com 15 e mais anos"). Cães e gatos lideravam e, nesse ano, "em 38,8% dos lares do Continente existia pelo menos um cão e em 28,4% dos lares existia pelo menos um gato".
O Sindicato dos Médicos Veterinários (SNMV) contabilizava em abril de 2016 ter quase um milhão de inscritos no seu Sistema de Identificação e Recuperação Animal (SIRA), relativo aos "chips" colocados nos animais de estimação. O Instituto Nacional de Estatística ou o Sistema de Identificação e Registo de Caninos e Felinos (da Direção-Geral de Veterinária) não têm quaisquer dados quantitativos.
Em 2015, a consultora GfK afirmava que dois milhões dos 3,8 milhões de lares nacionais tinham animais, dos quais 30% eram cães e 18% gatos.
Segundo dados europeus relativos a 2012, Portugal tinha 17 cães por 100 habitantes e 9,5 gatos.
Estados Unidos gastam mais em alimentação para animais do que o PIB de 64 países do mundo
Apesar destas lacunas para Portugal, o país parece acompanhar os dados internacionais que demonstram como a despesa com os animais domésticos não parou de aumentar, apesar da crise económica.
Isso foi notório nos EUA, onde a American Pet Products Association (APPA) registou para 2017 um gasto anual estimado de 69,3 mil milhões de dólares, quando em 2007 se fixava nos 41 mil milhões - "mais do que o produto interno bruto de 64 países no mundo", escrevia então a Bloomberg. Por comparação, gastava-se 11,6 mil milhões em videojogos, 10,8 mil milhões no cinema e quase o mesmo a comprar música.
A publicação do sector Petfood Industry notava em outubro de 2015 como, apesar dos anos da crise económica, o negócio da alimentação para os animais domésticos é "resiliente ou mesmo resistente", com crescimentos médios anuais de cerca de 3%.
Os números actuais têm de ser colocados em perspectiva, quando existem agora quase 90 milhões de cães e mais de 94 milhões de felinos nos lares norte-americanos. Isto porque existe uma relação mais afectiva com os animais.
Os mimos para cães e gatos: comida, hotéis, antidepressivos e ... máscaras de Halloween
O objectivo é retribuir aos animais "em termos humanos", explica Bob Vetere, presidente da American Pet Products Manufacturers Association (APPMA). Os animais deixaram de ir para canis ou gatis nas férias dos donos para serem colocados em hotéis, passaram a ter sobremesas ("sticks" perfumados, por exemplo, cujo cheiro os endoidece de felicidade...) ou acompanham a dieta dos donos, com carne orgânica ou dietas "vegan".
A APPMA nota que 42% dos cães dorme na cama dos donos (eram 34% em 1998), metade dos compradores de um novo automóvel tem em atenção o potencial "conforto" dos cães e um terço compra mesmo uma prenda no dia de aniversário do animal. O negócio também cresceu com a venda de perfumes ou gabardinas protectoras a custarem entre as dezenas e centenas de euros.
A retribuição humana ocorre noutras dimensões. Uma outra análise da Nielsen para os EUA e França mostrou, no ano passado, como 55% dos inquiridos estavam dispostos a abdicar de comprar chocolates para dar comida de boa qualidade aos seus animais domésticos.
No mesmo sentido, esse estudo "The Humanization of Pet Food" dizia que, para os EUA, 43% dos donos de animais com uma subscrição do canal de "streaming" Netflix estava disposto a abdicar do serviço para fazer o mesmo.
71 milhões de lares norte-americanos tinham um animal doméstico em 2016 (eram 64 milhões cinco anos antes) e os donos gastavam 9,8 mil milhões de dólares em serviços veterinários, a que acrescia quase o mesmo valor para medicamentos (há um para atenuar a "ansiedade da separação canina", com os ingredientes activos do Prozac...) ou produtos para combater a obesidade.
"Os cuidados animais são a categoria de maior crescimento no retalho, cerca de 6% ao ano", notava a Nielsen. "Mais novos produtos para animais foram lançados no primeiro semestre [de 2015] do que em todo o ano de 2005".
E a diversificação da oferta não pára de aumentar: no ano passado, os norte-americanos gastaram mais de 400 milhões de dólares em trajes ou máscaras para os animais festejarem o Halloween.
Impacto económico da indústria dos "pets" é significativo
O mercado é enorme e está em constante transformação, para se adequar aos interesses dos proprietários de animais domésticos, com óbvios retornos para a economia.
Um estudo da George Mason University apontou em 2015 que o impacto económico directo ou indirecto da "indústria do animal de estimação" gerou mais de 221 mil milhões de dólares para a economia norte-americana.
O estudo revelado em fevereiro passado mostra que esta indústria garante 1,3 milhões de empregos, com valores salariais acima dos 60 mil milhões de dólares.
Segundo Terry Clower, responsável desse estudo financiado pelo Pet Leadership Council e pelo Pet Industry Joint Advisory Council mas tendo por base dados oficiais, a estes valores há que acrescentar 23 mil milhões de dólares em impostos federais, estaduais e locais.
O desenvolvimento económico tem um aspecto importante na relação com a aquisição de animais domésticos ou de melhorias no seu bem estar. Em 2012, a revista Quartz já notava que quando "aumenta o rendimento, algumas pessoas podem ter animais de estimação pela primeira vez". Numa perspectiva mais macro-económica, "consoante os países se desenvolvem, novas indústrias - feiras caninas, hotéis de animais - crescem".
Nessa altura, segundo a Euromonitor, a Índia tinha quatro cães pequenos por mil pessoas (o maior crescimento em 53 países analisados, com um aumento de 58% em cinco anos). Já a Alemanha, que nem sequer era considerada nos lugares cimeiros desta análise, teve em 2014 um estudo interno sobre "Pet Ownership as Economic Factor", realizado por Renate Ohr, da universidade de Goettingen. O país tinha 11,5 milhões de gatos e 6,9 milhões de cães, num sentido contrário à média europeia onde os cães predominam.
A autora calculava que as vendas de produtos relacionados com animais de estimação ultrapassavam os 9,1 mil milhões de euros e assegurava entre 185 mil a 200 mil empregos a tempo inteiro.
Só na alimentação e acessórios, o valor atingia os 4,8 mil milhões de euros, mas Ohr apontava igualmente a forma como os animais domésticos são "apreciados" através das despesas que os seus donos estão dispostos ou podem suportar. Por exemplo, em 2013, um residente no Reino Unido gastava quase 77 euros com os seus animais, enquanto em Portugal se ficava pelos 28,5 euros.
"As pessoas que gostam de animais não precisam de ser convencidas por este estudo", escreveu. "No entanto, os resultados mostram às pessoas que podem ou querem pensar apenas em 'termos económicos' que a propriedade de animais não só vale a pena de um ponto de vista social como também comercial".
Aliás, a par dessas componentes sociais ou comerciais, há uma outra vertente interessante: na Alemanha, um estudo de 2001 notou que os donos de animais de estimação recorriam ao médico 7,5% menos do que as pessoas sem esses animais.
A análise mais recente de Terry Clower, da George Mason University, confirmava que os mais de 132 milhões de donos norte-americanos de animais de estimação vão ao médico 0,6 vezes menos do que quem não tem esses animais, representando uma poupança nos custos nacionais de saúde de 11,3 mil milhões de dólares.
Os (novos) membros da família
Apesar das despesas com os animais, a retribuição económica dos donos aos animais domésticos decorre igualmente da felicidade que eles devolvem e não pode ser contabilizada.
Desde "reduzir o stress e a solidão a aumentar a produtividade e o bem-estar geral, os animais têm um papel significativo na vida diária das pessoas", explica o recente estudo "The Effect of Pets on Happiness: A Large-scale Multi-Factor Analysis using Social Multimedia", baseado na análise de investigadores da universidade de Rochester (EUA) a cerca de 20 mil utilizadores do Instagram, com técnicas de reconhecimento facial em dois milhões de fotografias e análise do seu grau de felicidade, entre outros parâmetros, com os animais.
O estudo acompanha as tendências da importância dos animais em ambiente familiar. A revista Economist, em dezembro passado, notava como a "maioria dos americanos vê os seus animais domésticos como membros da família" e os proprietários dos cães preferem assumir-se mais como "parentes" do que como "donos".
De tal forma que surgem novos negócios a imitar o que é feito para os "donos". Por exemplo, tal como se alugam casas no Airbnb, as empresas norte-americanas Rover e DogVacay proporcionam lares próximos da sua habitação usual para se deixarem os animais.
As empresas têm seguro contra acidentes e a Rover permite mesmo ver as caminhadas que o cão faz, através de um sistema de GPS. A DogVacay envia fotografias diárias aos donos para garantir como o animal está feliz. O modelo de negócio já está a ser copiado na Austrália, Brasil ou Inglaterra.
Comentários