O ministro das Finanças começou por dizer, na apresentação deste Orçamento do Estado ao país, no Ministério das Finanças, que a proposta do governo se rege pelo lema "estabilidade, confiança e compromisso".
"Estabilidade porque é isso verdadeiramente que as famílias aspiram. Perante as notícias e imagens do exterior, o que este orçamento faz é procurar a estabilidade nos elementos fundamentais na vida das famílias e de cada um de nós", começou por justificar. "Apoiar os rendimentos, reduzir as incertezas sobre o futuro, diminuir os impostos para podermos criar um rendimento disponível mais elevado para as famílias e, sobretudo, ancorarmos estas melhorias num cenários de médio prazo", enumerou. Ou seja, "o que procuramos fazer [com este orçamento], quer relativamente à administração pública, quer em relação ao setor privado, é assegurar estabilidade".
"A segunda palavra-chave é confiança. Confiança no futuro da economia portuguesa, confiança no futuro do nosso país, confiança no futuro das nossas empresas e na nossa capacidade de produzir riqueza, capaz de servir para mais e melhores salários", continuou.
Assim disso, o programa de políticas contido no orçamento de estado deste ano, visa "a melhoria do investimento das empresas, o aumento desse investimento, (...) mas também o aumento de investimento através do reforço do investimento público, dirigido a problemas estruturais da nossa economia, mas também destinado a alicerçar o crescimento do investimento privado".
Por último, Fernando Medina reiterou o "compromisso com a política de contas certas, com a palavra e com a estratégia de redução da dívida pública, porque esta demonstrou ser um instrumento poderosíssimo para a proteção das famílias, das empresas, em particular nos momentos mais incertos que a conjuntura externa nos traz", concluiu na intervenção inicial, passando depois ao detalhe do documento.
Medina recuou aos resultados de 2022 (um PIB de 6,5%, uma taxa de desemprego de 5,6%, um défice de 1,9%, uma redução em 10,5 pontos percentuais da dívida pública e uma inflação de 7,4%, acima do perspectivado) para dizer que o crescimento económico registado em 2022 "é um crescimento que, ao contrário do que alguns dizem, não é meramente de recuperação de uma queda acentuada da pandemia, não é só uma correção tardia desse processo, mas vai-nos permitir fechar o ano já acima do crescimento da Zona Euro no global 2019-2022. Não se trata simplesmente de uma recuperação que alguns procuram menorizar", reiterou.
Já sobre a dívida pública, salientou o resultado "histórico" (de redução em 10,5 pontos percentuais, para 115% do PIB) em 2022, que é da "maior importância para o nosso presente e para o nosso futuro". Procurando justificar porque é que esta se mantém uma das prioridades do governo para o próximo ano, Medina salientou que "já nos encontramos muito perto de regressar a níveis de dívida pública que não eram conhecidos antes dos tempos da troika", o que considera ser "uma trajetória da maior importância".
Isto, diz, tem impacto sobre "os juros que o Estado paga, mas sobretudo sobre os juros que as famílias pagam, os juros que as empresas pagam. Permite e permitirá ao sistema financeiro a melhoria dos seus ratings, o que se traduz na diminuição dos custos de financiamento às nossas empresas e famílias", reiterou.
Já olhando para os dados de 2023 — as estimativas do governo apontam para um crescimento de 1,3%, um aumento médio das remunerações de 5,1%, um défice de 0,9% do PIB, uma redução da dívida pública em 4,2 pontos percentuais e uma taxa de inflação de 4% — , Medina salientou que Portugal vai "reconhecer uma desaceleração" do crescimento, mas ainda assim "menor do que a generalidade dos países da Zona Euro".
"Se tivemos um ano de 2022 em que o crescimento da economia foi particularmente puxado pelo crescimento do consumo, é expectável que esse contributo, sendo positivo, diminua". Pelo contrário, disse, esta redução deve ser compensada por "um crescimento mais significativo do investimento".
Todavia, assume o ministro, o quadro em que este Orçamento do Estado será aplicado é de clara "degradação do contexto externo", nomeadamente devido à guerra na Ucrânia, que criou quebras de confiança e ruturas nas cadeias de abastecimento, à crise energética e aos constrangimentos que decorrem não apenas da guerra na Ucrânia, mas da política da China, e que não permitiu recuperar as cadeias de abastecimento à escala global, limitando a oferta de bens e escalando a inflação.
Há, ainda assim, diz Medina, fatores de confiança a nível interno para lidar "com a degradação da envolvente externa", salientando a localização estratégica de Portugal, uma alta quota de renováveis (60% vs 37% na UE), a aceleração da execução do Plano de Recuperação e Resiliência, uma taxa de desemprego baixa, quatro anos de estabilidade política e social, reforçada pelo Acordo de Rendimentos alcançado este fim de semana e uma melhoria do rating da dívida para BBB+.
Face ao contexto, o Governo estabelece como objetivo "uma trajetória de crescimento e de convergência com a União europeia", assente em três prioridades: reforço dos rendimentos, promoção do investimento e redução da dívida pública.
Sobre o reforço dos rendimentos, Medina salientou a evolução do salário mínimo nacional, alcançado no compromisso para o Acordo de Rendimentos, que deverá ser de 760 em 2023 e aumentar até aos 900 euros em 2026. "Temos hoje um horizonte de estabilidade e de previsibilidade da evolução dos salários no setor privado", reiterou. Já sobre a administração pública, disse que a proposta que o governo apresentou "assenta numa base plurianual, (...) que é um sinal muito claro neste referencial de estabilidade e confiança para quem trabalha na administração pública".
Em particular sobre os salários da administração pública, Medina destacou um aumento da massa salarial de 5,1% para 742 mil funcionários públicos, que se traduzirá numa despesa de 1,3 milhões de euros, e que resulta de um aumento médio do salário base de 3,6%, um aumento de 0,3% no subsídio de refeição, para 5,20 euros, e um aumento de 1,2% em outras valorizações, como por exemplo as promoções e progressões. Trata-se, diz de "uma proposta séria, clara e perfeitamente dirigida a vários problemas centrais na administração pública portuguesa".
No que concerne os incentivos fiscais para o aumento de salários no setor privado, o ministro salienta a "majoração dos encargos salariais adicionais em 50%", que diz, permitirá às empresas "concretizar as medidas plasmadas no Acordo de Rendimentos".
Esta política de melhoria das remunerações, "de forma estável e previsível, é completada com medidas de apoio ao IRC nas empresas e setores que desenvolvam ou superem a adequada política salarial, com particular destaque para a majoração destes benefícios fiscais para as empresas do Interior", notou o ministro das Finanças.
"Mas ente reforço dos rendimentos não ficaria completo se o Estado não fizesse a sua parte", diz Medina, salientando, em primeiro lugar, as alterações previstas em sede de IRS neste Orçamento do Estado, sendo elas: a atualização dos limites dos escalões, uma redução para 21% na taxa de IRS do segundo escalão, o reforço do mínimo de existência e um novo modelo de tabelas de retenção. O objetivo, reitera, é "redução do IRS que as famílias pagam". Pelo menos dois milhões de agregados familiares serão abrangidos por estas alterações, estimou.
Sobre o reforço do mínimo de existência, Fernando Medina salientou que o novo modelo visa corrigir um efeito perverso, uma "injustiça", que abrangia sobretudo trabalhadores que recebem "nas imediações do salário mínimo" e nos quais um aumento do salário bruto não se traduz num aumento do salário líquido. "Esta é uma das medidas mais importantes deste orçamento", considerou.
"As medidas deste ano são uma continuidade de uma trajetória de redução dos impostos sobre os rendimentos, feita de forma gradual, de forma consistente, de forma contínua, no mesmo sentido, com prudência, mas sempre com efetividade, e que permite, no conjunto destes exercícios, e para uma larga faixa das famílias, uma redução de 500 euros ao ano em impostos", salientou Medina.
O ministro das Finanças destacou ainda o alargamento do IRS Jovem — com isenção de imposto sobre 50% do seu rendimento no primeiro ano; de 40% no segundo ano; de 30% no terceiro e quarto anos e de 20% no quinto ano — e o reforço do Programa Porta 65 no apoio às camadas mais jovens da população.
No que diz respeito ao apoio às famílias com crianças, o ministro das Finanças destacou o aumento do abono de família, a alteração nos escalões desta prestação social (com impacto estimado em 480 mil pessoas), o aumento das deduções no IRS a partir do segundo filho e os apoios no âmbito da garantia para a Infância, que visam crianças em situação de pobreza extrema. A par, destaca a atualização do Indexante de Apoios Sociais (que impacta o cálculo de vários apoios do Estado), a atualização das pensões e, por fim, o reforço do complemento solidário para idosos, alargamento inclusivamente o número os seus beneficiários.
No que concerne os apoios à habitação, o ministério destaca a limitação a 2% do aumento das rendas, o novo regime de renegociação dos contratos de crédito à habitação — que beneficiará aproximadamente 1,3 milhões de agregados, e que permite às famílias que ultrapassem uma determinada taxa de esforço exigir a renegociação das condições de crédito—, a suspensão da comissão de amortização antecipada — para que as famílias possam abater a sua dívida sem sofrer penalizações —, e o apoio aos encargos com o crédito habitação, materializado na redução das retenções na fonte para trabalhadores dependentes que recebam até 2700 euros por mês que o solicitem.
No âmbito das medidas que visam conter os custos da energia, o governo destaca a redução do IVA da eletricidade para 6%, beneficiando cerca de 5 milhões de consumidores, a manutenção dos preços dos transportes públicos, abrangendo cerca de 1,2 milhões de passes, a possibilidade de transitar-se para o mercado regulado de gás natural, permitindo poupanças superiores a 70%, e a redução do Imposto Sobre Produtos Petrolíferos na gasolina e no gasóleo.
Fazendo um exercício para um casal com dois filhos (de 5 e 8 anos), com salário bruto de 2550 euros, o ministério das Finanças estima uma poupança anual devido às medidas do Orçamento do Estado para 2023 de 3271 euros anuais, ou seja, próximo de 300 euros por mês.
Olhando agora para as empresas e visando a promoção do investimento privado, Fernando Medina destacou o novo incentivo à capitalização de empresas para "acabar com uma distorção que o nosso país tem e que favorece aquelas empresas que pedem dinheiro emprestado ao banco em detrimento das empresas em que os sócios colocam capital direto". A par, o Orçamento do Estado para 2023 prevê uma melhoria do regime fiscal de apoio ao investimento, um novo regime fiscal de dedução de prejuízos, além de uma redução do IRC (de 17%) para pequenas e médias empresas, dos atuais 25 mil euros para os 50 mil euros de lucro anual.
Antes do final desta conferência, Fernando Medina garantiu que o país está preparado para cenários “mais adversos”, caso se concretizem, uma vez que ganhou espaço orçamental com a estratégia seguida em 2022. “Sim, estamos preparados para cenários que possam ser mais adversos porque é essa a nossa obrigação: deixar o país com mais segurança”, disse.
O titular das Finanças realçou que quando apresentou o último Orçamento do Estado para 2022 sublinhou que o grande objetivo era ganhar margem de manobra para enfrentar contextos adversos. “Esses resultados foram atingidos”, vincou, salientando que o país “dispõe de margem de manobra superior àquela que tinha há um ano”. O ministro justificou que tal apenas foi possível por ter seguido uma estratégia este ano, que, diz, se revelou “correta”. “O nosso caminho foi de ganhar essa margem. Arrancamos para ano de 2023 com espaço dentro da política orçamental”, reiterou.
"Custa-me muito estar a imaginar falar sobre Orçamento Retificativo", assumiu Medina, mas, ainda assim, garantiu que "nenhuma despesa fundamental deixará de ser feita ou emissão de dívida, por algum capricho de ponto de vista orçamental".
Pouco passava das 13h10 quando Augusto Santos Silva recebeu das mãos de Fernando Medina o Orçamento do Estado para 2023. Em declarações aos jornalistas após a entrega do documento, o ministro das Finanças disse tratar-se de uma proposta de orçamento que privilegia a estabilidade e o investimento no futuro do país, ainda que mantendo "as contas certas".
As próximas datas relevantes do OE2023:
- Debate na generalidade: 26 e 27 de outubro;
- Debate na especialidade: a partir de 28 de outubro;
- Discussão em plenário: a partir de 21 de novembro;
- Votação final global: 25 de novembro.
Recorde-se que a aprovação final do documento está garantida já que o PS tem maioria absoluta na Assembleia da República.
Veja aqui em detalhe as medidas previstas neste Orçamento do Estado para 2023.
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