O documento a que a Lusa teve acesso foi apresentado no Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia e, ao longo de 52 páginas, quatro acionistas que integram a associação de pequenos investidores ATM apresentam as razões para defenderem a impugnação da decisão tomada na assembleia-geral de 13 de dezembro, em que à segunda tentativa os acionistas do BPI aprovaram a venda de 2% do BFA à operadora angolana Unitel.
“Nestes termos, e com os fundamentos expostos, pede-se a vossa excelência senhor juiz que declare nula ou anule (…) a deliberação tomada pela assembleia geral do Banco BPI na sua reunião de 13 de dezembro”, lê-se na ação judicial que deu entrada esta quinta-feira.
A venda parcial do BFA pelo BPI já foi entretanto concretizada a 05 de janeiro, anunciou o banco, passando então a operadora angolana a controlar 51,9% do capital e ficando o BPI com 48,1%.
Já no final de outubro, a ATM tinha dado a indicação de que poderia vir a impugnar a assembleia-geral de acionistas do BPI sobre o tema, defendendo que nem Caixabank nem Santoro — principais acionistas — deveriam votar por terem ambos interesses na operação.
É que o Caixabank tem em curso uma Oferta Pública de Aquisição (OPA) sobre 100% do capital do BPI e a Santoro tem ligações à Unitel, uma vez que ambas as empresas são controladas pela empresária Isabel dos Santos.
A 13 de dezembro, os acionistas do BPI aprovaram por 83,23% dos votos expressos (sem contar com abstenções) a venda parcial do BFA – apresentada pela administração do BPI como a “única solução” para resolver o excesso de exposição do BPI a Angola, que motivava a preocupação do Banco Central Europeu -, tendo então vários pequenos acionistas dito à Lusa que Caixabank e Santoro se abstiveram.
Questionado pelos jornalistas em conferência de imprensa sobre essas abstenções, o presidente do BPI, Artur Santos Silva, recusou comentar e também não respondeu à questão sobre se há a possibilidade de as abstenções do Caixabank e Santoro terem acontecido para evitar contestação judicial pelos pequenos acionistas.
“Pode fazer as leituras que entender. Neste processo, e chegados a este ponto, só 3,8% do capital social esteve contra esta transação”, afirmou o fundador do banco.
Os pequenos acionistas e também o grupo Violas, o maior acionista português do BPI com 2,7%, tinham-se já manifestado várias vezes contra a operação por considerarem que retirava valor ao BPI.
No final da assembleia-geral de 13 de dezembro, Tiago Violas considerou que houve “uma troca direta do controlo do BPI pelo controlo do BFA e que os pequenos acionistas foram quem pagou”, referindo-se ao facto de o Caixabank ter em curso a OPA do CaixaBank, em que este oferece 1,134 euros por ação.
Questionado sobre se aceitariam fechar este tema e não avançar com processos em tribunal caso o Caixabank revisse o preço oferecido na OPA, Tiago Violas afirmou que tudo seria “ponderado” e que o fundamental é que “o BPI vale bastante mais do que 1,13″ euros por ação e que esta venda parcial do BFA cria “destruição de valor”.
Já em outubro, a associação ATM se tinha pronunciado contra o baixo valor do preço da OPA do Caixabank, considerando que não paga a perda de valor de o BPI já não controlar o BFA.
Os principais acionistas do BPI são o Caixabank, que detém cerca de 45,50% do capital social (e tem em curso uma Oferta Pública de Aquisição para controlar a totalidade do capital do banco), e a angolana Santoro, com 18,6%.
Entre os acionistas de referência contam-se ainda a seguradora Allianz, com 8,4%, a ‘holding’ da família Violas, com 2,68%, e o Banco BIC, com 2,28%, posição esta que se relaciona com a da Santoro, uma vez que ambas as empresas têm Isabel dos Santos como acionista de referência.
O BFA tem sido nos últimos anos a ‘joia da coroa’ do BPI.
Dos lucros de 182,9 milhões de euros que o BPI apresentou entre janeiro e setembro de 2016, a atividade internacional (onde se inclui a operação em Angola) contribuiu com 125,4 milhões de euros.
Se a venda parcial do BFA já estivesse concretizada à data de 30 de setembro, o banco tinha tido um prejuízo de 25 milhões, em vez de lucro, devido à inversão do resultado da atividade internacional, que passaria de 125 milhões positivos para 84 milhões negativos, segundo a própria instituição.
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