Em entrevista à agência Lusa, em Bruxelas, a propósito do novo cargo, o responsável notou que “a OMC está a passar um momento difícil”.
“Está um pouco disfuncional e há alguns grandes desafios a enfrentar. Todas as dificuldades que tem tido — e que não são de agora — foram aceleradas com a política da administração norte-americana, que levou a que a organização ficasse ainda mais exposta a essas dificuldades”, acrescentou, numa alusão às pressões feitas pelos Estados Unidos, nomeadamente para revisão do estatuto da China na organização.
Por essa razão, “esta é a altura” de avançar com a reforma da OMC, insistiu.
“Acho que ninguém tem interesse em que o sistema multilateral comercial se dissolva. O sistema da OMC rege a maior parte das relações comerciais a nível global e, quando não se tem um sistema desses, a alternativa é cada país adotar medidas unilaterais […] e isso é um retrocesso e ninguém tem interesse nisso”, argumentou João Aguiar Machado.
Aludindo às atuais tensões comerciais, nomeadamente entre os Estados Unidos e a China, o responsável reforçou: “Acho que todos temos interesse porque a alternativa é voltar ao faroeste, à lei do mais forte”.
O até agora diretor-geral dos Assuntos Marítimos e Pescas (DG-MARE), que em meados de setembro assume a chefia da missão da UE junto da OMC, ressalvou, ainda assim, que esta não será uma reestruturação para “reformar toda a organização, mas sim reformar as áreas que mais necessitam”.
“É colmatar as deficiências que têm sido verificadas nos últimos anos, mas não é refazer uma nova organização. É tentar, de maneira cirúrgica, remediar as dificuldades”, precisou.
Entre as principais áreas de atuação, João Aguiar Machado destacou a necessidade de reavivar a “função de negociação da OMC”, que “está paralisada já há mais de 20 anos” por não haver consenso entre os países.
Assinalou, também, a necessidade de rever o estatuto dado às economias emergentes, que a seu ver é, atualmente, usado por países como a China e a Índia para beneficiarem “de toda uma série de exceções e derrogações previstas para os países em vias de desenvolvimento”.
Acresce a questão da supervisão das regulamentações comerciais dos países membros da OMC, “outra das funções da organização, também está um pouco avariada porque a transparência não é suficiente”, observou João Aguiar Machado.
Criada em 1995, a OMC conta atualmente com 164 membros, entre os quais Portugal, que foi um dos fundadores, assim como a UE e os Estados Unidos.
A China aderiu à OMC em 2001.
Questionado pela Lusa sobre prazos para esta reforma, João Aguiar Machado defendeu que o processo avance “o mais rapidamente possível”, mas lembrou que não será “tarefa fácil” porque implica “o consenso de todos os países membros”.
Já falando sobre a intenção manifestada pelos Estados Unidos de abandonar a OMC, o responsável português disse esperar que isso não se concretize porque “seria muito mau para o sistema de regulação do comércio global”.
Sediada em Genebra, na Suíça, a OMC tem como função mediar as relações comerciais da quase totalidade dos países do mundo (abrange 98%), estipular regras para o comércio entre os Estados e agir em casos de violação dessas mesmas regras.
Numa altura negra para a OMC, João Aguiar Machado saudou o acordo de livre comércio alcançado entre a UE e a Mercado Comum do Sul (Mercosul), considerando ser “muito satisfatório” para ambas as partes e um “importante sinal político”.
*Por Ana Matos Neves, da agência Lusa
Comentários