As inspeções, realizadas ao longo de 2019, abrangeram 11 das 22 Secções de Processo Executivo (SPE) da Segurança Social e foram motivadas pela “receção de um volume crescente de queixas”, segundo refere um comunicado publicado hoje.
Estas inspeções, lê-se no mesmo comunicado, “confirmaram práticas irregulares lesivas dos direitos dos cidadãos”, nomeadamente situações de cobrança de dívida inexistente, de penhoras de contas bancárias acima do valor legalmente permitido, de demora injustificada na restituição de valores indevidamente cobrados ou ainda de não notificação atempada e correta dos prazos de pagamento das dívidas.
Trata-se de práticas, acentua a provedora de Justiça, que “ferem particularmente os direitos dos cidadãos” e que “em muitos casos agravam as situações de precariedade dos agregados familiares dos executados”, o que levou Maria Lúcia Amaral a enviar à direção dos institutos da Segurança Social e ao Governo um conjunto de recomendações visando a eliminação e prevenção dessas práticas.
“São preocupantes os volumes de dívida inexistente ou prescrita que são participados, pelo ISS, [Instituto da Segurança Social] para execução” assinala o relatório produzido na sequência destas inspeções e cujo conteúdo foi também hoje divulgado, acentuando que em 2017 e em 2018, foram anulados/declarados prescritos, em sede executiva, cerca de 300 e 210 milhões de euros, respetivamente, ou seja, 30% e 23% do que nesses anos foi o valor de dívida que originou a instauração de processos executivos.
Estes números, admite a Provedoria de Justiça, “ficarão aquém da realidade” e derivam da intervenção de vários organismos intervenientes seja pela não participação de dívida inexistente, pela não análise da prescrição da dívida na fase pré-executiva, pela insuficiência de automatismos que permitam detetar as prescrições ou pela morosidade com que é feita a análise dos processos prescritos que escapam aos automatismos.
“A participação de dívida inexistente penaliza os serviços e os cidadãos/contribuintes não devedores e em nada contribui para aproximar o Estado dos cidadãos, nem para a gestão eficaz dos recursos públicos”, refere o documento que recomenda, por isso um reforço da triagem prévia.
Entre as várias recomendações que faz com o objetivo de eliminar e prevenir irregularidades graves, a provedora de Justiça inclui a necessidade de as SPE comprovarem os argumentos do executado de que o rendimento depositado em determinada conta bancária é impenhorável e de notificarem o banco para o cancelamento ou redução da penhora.
“É urgente uniformizar e atualizar as minutas de penhora de rendimentos, adaptando-as à legislação em vigor”, acentua o relatório, referindo ainda a importância de as minutas de penhora de saldo de conta bancária remetidas às instituições financeiras serem alteradas, “evitando-se que subvertam o regime legal aplicável em matéria de preferência na escolha da(s) conta(s) a penhorar”.
A restituição dos valores cobrados indevidamente no mais curto prazo de tempo possível, a notificação do executado para a regularização da situação quando este deixe de pagar três ou mais prestações de planos de prestacionais são outras das recomendações.
No âmbito das condições de trabalho e recursos humanos, Maria Lúcia Amaral aponta, entre outras, a necessidade de se aumentar o espaço em que funcionam algumas SPE e de melhorar as acessibilidades para os funcionários com mobilidade reduzida ou ainda o reforço do atendimento à distância.
“Com perplexidade, constata-se a exiguidade de investimentos em recursos humanos (no IGFSS - Instituto de Gestão Financeira da segurança Social] e, aparentemente, também no ISS, com reflexos na gestão do primeiro) e em sistemas informáticos (no II,IP), onde os prejuízos tanto abrangem a sustentabilidade das prestações sociais, em geral, como os direitos e garantias dos executados, objeto de sistemático (e até institucionalizado) atropelo, no que, afinal, também deveria ser um Estado de Direito”, lê-se no relatório.
A Provedoria de Justiça recebeu 356 queixas sobre execuções fiscais em 2019, mais 12 do que em 2018, e a maior parte (68%) referem-se a processos instruídos pela Segurança Social, segundo o Relatório de Atividades deste órgão do Estado.
As execuções fiscais, de acordo com os dados do relatório, correspondem a mais de um terço do total de 966 queixas no âmbito da fiscalidade que os contribuintes fizeram chegar ao gabinete da provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, ao longo do ano passado.
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