Depois de ter sido notícia há uns tempos por uma “caçada” onde se abateram 500 animais por desporto, a bela terra da Azambuja volta a ser tema de conversa depois de a Junta de Freguesia ter anunciado que não vai contratar artistas que se tenham manifestado contra as touradas, depois de ter mais de 240 personalidades terem assinado uma carta a pedir que a RTP deixasse de transmitir touradas. A Junta de Freguesia publicou na sua página de Facebook "Comunica-se que em todo e qualquer espetáculo que eventualmente venha ainda a realizar-se este executivo terá em consideração na escolha dos artistas o facto de os mesmos se terem ou não manifestado contra as nossas tradições!". O ponto de exclamação final dá a entender que a página é gerida por uma criança com birra que amuou. Resta saber se uma dessas tradições é a censura.

Primeiro, quem é que quer ir fazer seja o que for à Azambuja? Começa logo por aí. As pessoas só vão à Azambuja quando se deixam dormir no comboio ou se enganam na saída da A1 e queriam sair na estação de serviço de Aveiras para comer um panado a seis euros. A Junta da Azambuja marcar esta posição é como um gajo feio e pobre na after party do desfile da Victoria's Secret a dizer que não quer fazer sexo com ninguém. Também ninguém estava interessado.

No entanto, devo dizer que compreendo, em parte, a posição da Junta da Azambuja. Os autarcas são eleitos pelo povo e devem representar as suas vontades. Acham que a maioria dos habitantes da Azambuja quer lá músicos ou o que seja que se manifestaram abertamente contra a tourada? Provavelmente, não. Há uns anos, o Bruno Nogueira teve de cancelar um espectáculo em Montemor-o-Novo, depois de ter feito piadas com touradas e recebido ameaças. Os fanáticos das touradas não são muito fãs de piadas com touradas, tal como os fanáticos de qualquer outra coisa não são fãs de piadas com essa qualquer outra coisa. Cabe às pessoas votar e eleger quem os representa. Se acham que esta posição é válida, então fiquem lá com a Azambuja para vocês. Nem está em causa gostar de touradas, acho legítimo gostar, especialmente quem nasceu no meio ou numa terra onde isso é tradição, não tenho nada contra quem gosta, só acho ridículo serem permitidas. Quem gosta pode ver no YouTube ou em VHS. Nem está em causa a personalidade de alguém por gostar ou não de touradas: conheço pessoas que gostam e que são muito melhores pessoas do que outros que são veganos. Gostar de tourada não significa ser-se má pessoa tal como gostar de animais não significa que somos boa gente. Olhem para mim, que até adoptei uma cadela, mas que sou uma besta.

Eu nem sou bem contra a transmissão de touradas na RTP. Sou contra a existência das touradas nos dias de hoje. A partir do momento em que são permitidas, legais e que gozam de estatuto de espetáculo cultural, então não vejo grande razão para a RTP não as transmitir, sendo uma televisão pública que deve passar e veicular cultura. O problema não é a RTP transmitir tourada, o problema é a tortura de animais em praça pública ainda ser permitida no nosso país, em 2021, desde que seja um touro, claro, se fosse um cavalo a levar com bandarilhas já era horrível. A Junta da Azambuja pensa que está a responder na mesma moeda, sem perceber que está a usar o seu poder (público) para fazer pirraça e chantagem. Seria de esperar que uma presidente que vai ser candidata pelo Chega fosse mais adepta da liberdade de expressão (risos). Imaginem que as outras terras começavam a fazer o mesmo: a Aveiro não podia ir quem dissesse publicamente que não gostava de ovos moles; ao Porto não podia ir quem não gostasse de francesinha; e às Caldas da Rainha, já todos estamos a ver o que ia acontecer.

Infelizmente, é uma altura em que muita gente do mundo do espectáculo está sem rendimentos e que sofreu muitos cortes, especialmente técnicos e pessoas atrás da cortina. Infelizmente, a posição da Junta da Azambuja não tem isso em conta, interessam-lhes mais as tradições do que dar cultura e entretenimento aos seus habitantes e trabalho a quem vive das artes. Se calhar, Azambuja merece ter só tourada como “cultura”. Se calhar, Azambuja não merece mais do que isso, mas isso veremos nas próximas eleições. Os restantes habitantes que não se revêem nesta posição, gostem ou não de tourada, podem sempre apanhar o comboio ou pegar no carro e ir a outro sítio. Por exemplo, dificilmente a Azambuja receberá espectáculos de comédia, já que, quase todos os comediantes são anti-touradas. Por isso, quem for de lá e gostar de comédia, pode ir a outros sítios, gostem ou não de touradas, serão sempre bem vindos. Deixo algumas sugestões: