A minha mãe tem um segredo cabeludo, daqueles que fazem cócegas no cérebro.
Quando ninguém está a ver, enquanto o segredo vai e vem, ela coça a cabeça.
Quando a mãe fala, o segredo esconde-se.
‘Leva o guarda-chuva ou ainda apanhas uma molha”.
E logo o dia de sol se verte numa choradeira copiosa.
‘Não comas isso, que te vai cair mal’.
E logo o que era bom dá voltas e voltas na barriga até enjoar.
‘Faz assado, não faças cozido’.
E logo o caldo se entorna.
A mãe fala como quem tudo sabe e tudo pode.
E logo cresce em mim uma certa irritação.
Mas a mãe quer mandar em tudo porque não controla nada.
Sem saber o que viria,
A mãe ofereceu o seu corpo para me dar corpo.
Deu do seu tempo para eu ter tempo para crescer.
Largou os seus sonhos para que eu agarrasse os meus.
Sem saber o que seria,
Ela amou primeiro.
Apesar do medo,
Mesmo na dúvida,
Sem garantias.
A minha mãe não é perfeita.
Este é segredo cabeludo da minha mãe.
É bonito, mas ela não sabe.
Agora, o segredo da minha mãe já não é segredo para mim.
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