O presidente da IL, Rui Rocha, um dos muitos que adorariam entregar o capital dos Fundos de Pensões da Segurança Social a fundos privados e, se houvesse problemas, como houve noutros países, o Estado que os resolvesse - são assim os liberais em Portugal e um pouco por todo o mundo -, teve a ousadia irresponsável de afirmar que "quem tem hoje 30 anos terá uma primeira pensão equivalente a 40% do seu último salário".

A afirmação não passa de alarmismo injustificado, baseado em estudos mal fundamentados - no caso, da CE/UE -, estáticos e que ignoram que a realidade muda por ação de medidas legislativas públicas da parte dos parlamentos ou dos governos, e a economia pode fazer toda a diferença. Como aconteceu nos últimos 25 anos, apesar do desempenho económico não ter sido o desejável.

O que se pretende com este alarmismo injustificado? Obrigar o governo e os jovens a optarem pelo sistema de capitalização privado. E nós sabemos as inúmeras tragédias que aconteceram pelo mundo fora com a entrega a entidades pouco escrupulosas das carteiras de poupança/reforma de milhões de cidadãos.

No final destas notícias, aparece um alerta discreto que estes "actores" ignoram: "Importa notar que estas estimativas só devem verificar-se se não houver qualquer mudança no Sistema da Segurança Social". Mas os parlamentos e os governos existem para produzirem mudanças pertinentes, sempre que tal se justifique, como tem sucedido nos últimos 25 anos. Haja decoro, vergonha e responsabilidade!

O que está, de facto, em causa? Os cálculos não têm em conta a totalidade dos anos de desconto, o que significa que a perda não será tão grande para quem trabalha consecutivamente até à reforma. No entanto, as estimativas da Comissão Europeia mostram, erradamente, que os portugueses na faixa dos 30 anos correm o risco de perder 60% do seu rendimento do trabalho quando chegarem à reforma, ignorando os possíveis e necessários ajustamentos no sistema ao longo dos próximos anos.

Já em 1998, o Livro Branco da Segurança Social, desenvolvido por uma comissão especialmente criada para estudar este tema, previa que a Segurança Social deixaria de ser sustentável a partir do ano 2020, e que tal se deveria ao aumento da despesa com pensões. O impacto deste Livro Branco foi tão significativo que acabou por inspirar duas reformas do sistema público de pensões (em 2002 e 2007).

Desde aí, a discussão em torno da sustentabilidade do sistema de pensões português tem emergido na esfera pública de forma recorrente. Ora, como se constata, em 2020, não ocorreu qualquer colapso da Segurança Social. Antes pelo contrário, foi reforçada a sua solidez. E de que maneira.

A discussão sobre a sustentabilidade do sistema de pensões português tem sido cada vez mais marcada pelos alinhamentos político-ideológicos dos seus intervenientes. Admitindo que um tema desta magnitude tem, necessariamente, implicações políticas, importa proporcionar um debate informado e objectivo, responda a perguntas importantes: o sistema de pensões português é financeiramente sustentável? Serão necessárias medidas para melhorar a sua sustentabilidade? Que tipo de reformas podem ser prosseguidas?

A crescente partidarização da discussão sobre a sustentabilidade do sistema de pensões português reflecte (em parte) a escassez de estudos sérios e rigorosos sobre este tópico. Mas também a falta de informação da parte dos subsistemas da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações, uma falha inaceitável destas duas entidades públicas. Exige-se controlo reforçado e transparência.

O debate sobre a sustentabilidade do sistema de pensões português está também demasiado centrado na questão da sustentabilidade financeira, isto é, a maioria dos autores tem tentado perceber, sobretudo, se as contribuições serão suficientes para pagar as pensões no futuro.

Vamos aos factos. Pelo segundo ano consecutivo, o país alcançou um saldo orçamental positivo (vulgo excedente das contas públicas). Foram os saldos Medina (2023), com 1,2% do PIB e o valor nominal de 3.247 milhões de euros, e o saldo Miranda Sarmento (2024), com 0,7% do PIB, 1.994,2 milhões de euros. Trata-se de registos positivos, embora uma avaliação mais profunda careça de ser realizada para percebermos todos a verdadeira sustentabilidade destes superavits orçamentais, como de todos os anteriores.

Como sabemos, o primeiro excedente desde 1973 foi alcançado em 2019, por Mário Centeno, durante o seu mandato como ministro das Finanças, tendo Portugal registado um excedente orçamental de 0,2% do PIB. Este marco foi significativo, pois foi a primeira vez, em democracia, que Portugal não teve um défice orçamental.

Todo o governo, muitos "analistas" e "comentadores" teceram hosanas aos feitos, projectando o seu "responsável" para um lugar no Olimpo, tal como tinha acontecido no ano anterior com Fernando Medina e, em 2019, com Mário Centeno. Mas esqueceram-se do dever de escalpelizar a razão de ser destes desempenhos orçamentais.

Estes resultados foram conseguidos com recursos a vários expedientes, denotando falta de robustez dos saldos alcançados. Foram o resultado de desempenhos económicos fortes? De políticas fiscais asfixiantes dos contribuintes? Houve uma boa gestão da despesa pública? E da receita? Até onde foi a "engenharia financeira"? A estas questões nucleares nenhum expert se dedicou. Nem sequer as entidades oficiais (Tribunal de Contas e Conselho das Finanças Públicas) dedicaram especial atenção a estas causas. Estava consagrado o "milagre" e, como tal, nada mais havia a fazer. Pouca ou nenhuma atenção à Conta Geral do Estado, onde poderiam encontrar respostas às questões colocadas atrás.

Estes analistas e comentadores, pouco ou nada rigorosos, sérios ou independentes, que passam a vida na Comunicação Social a vergastar a Segurança Social (está falida, não tem sustentabilidade, etc), muitas vezes com fins insondáveis, fazem autêntico bullying político sobre os cidadãos eleitores, cujo nível de informação não lhes permite destrinçar a verdade da manipulação. E fazem-no com uma regularidade inaudita.

Na verdade, estes senhores omitem, delibera e intencionalmente, a verdade: foi graças ao saldo positivo da Segurança Social que Portugal registou um excedente, em 2019, 2023 e 2024. Nos dois últimos anos, a Segurança Social teve os seguintes saldos/excedentes: 5.670 milhões de euros (2023); 5.824,8 milhões de euros (2024).

Como é fácil de concluir, sem estes excedentes da Segurança Social nunca existiria saldo positivo no saldo do orçamento de Estado. Bastaria terem lido a página dois do comunicado do INE sobre défices excessivos para observar esta indelével verdade. Mas nada disso fizeram. Por incompetência, por preguiça ou má-fé? É difícil dizê-lo, mas uma destas três razões terá sido.

Os governos tiveram algum mérito no saldo da Segurança Social? Muito pouco, como explico mais à frente. Com efeito, o saldo da Segurança Social foi amplamente positivo nos últimos 30 anos. Somente em 1995 e 2001 teve saldos negativos, com pouca expressão financeira. Em termos acumulados, ao logo destes 30 anos o saldo excedeu 40.888,6 milhões de euros. O saldo foi positivo em 28 dos 30 anos.

Só nos últimos cinco anos (2021-2025P), o saldo acumulado será superior a 23.957 milhões de euros. Onde está, afinal, a tese mentirosa da falta de sustentabilidade da Segurança Social?

Adicionalmente, a carteira da Segurança Social aumentou cerca de 30% de 2022 para 2023 e, em conjunto com a carteira da CGA, aumentou 33,55% no mesmo período (num ano, 2023, o ano dos reformados e pensionistas "entalados").

São incrementos notáveis, que justificam a actual solidez do sistema de previdência, ao contrário do que se afirma muitas vezes, indevidamente. E se houvesse uma melhor gestão dos saldos anuais e mecanismos de controlo reforçados, sem dúvida que a posição da carteira seria muito melhor.

Resta dizer que toda a informação estatística contida neste artigo é fidedigna e está suportada em dados oficias do INE, Banco de Portugal, Segurança Social, Tribunal de Contas, Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social e Caixa Geral de Aposentações.

Numa nota adicional, recordo que desde Janeiro de 2024, cerca de 120 mil pensionistas e reformados reunidos em torno do Movimento Justiça para Pensionistas e Reformados, que representa e interpreta os anseios legítimos dos reformados de 2023, reclamam por justiça, uma vez que se consideram duplamente discriminados: são os únicos que não tiveram qualquer actualização da pensão no ano seguinte à reforma e que sofreram na sua plenitude os efeitos da inflação acumulada desde 2021, que já ultrapassa os 15%, sem considerar o grupo dos bens alimentares ou os encargos com habitação onde o aumento foi muito superior.

Isto, embora os aumentos dos pensionistas de 2023 pudessem ser cobertos por pouco mais de 1% do excedente de 2023, nem seria necessário usar propriamente esse capital, pois os seus juros cobrem várias vezes o aumento em questão, dado que a rendibilidade tem sido muito superior a 1%/ano.

A falta de empenhamento do presidente da República (talvez mais preocupado com assuntos de outras origens nacionais), do PSD e do PS foi a nota de maior desagrado e indignação destes reformados. A falta de sensibilidade social e determinação política foi evidente e chocou estes cidadãos, tratados como de segunda. Apelaram a todos os grupo parlamentares, em sede de especialidade, que poderiam ter viabilizado uma solução que sanasse esta inaceitável injustiça, para quem ficou excluído e ostracizado.

Os que tiveram a coragem de suscitar o problema, existente desde 2007, podem ter conseguido parcialmente esse objectivo, mas ficaram "entalados" entre os pensionistas de 2022 e os de 2024, que viram o seu problema resolvido, graças ao trabalho insano dos de 2023, que, contra-ventos e marés, lutaram por esse objectivo.

Os reformados de 2023 sentem-se esquecidos e excluídos. Por isso, confiam na determinação, sabedoria, sensatez e capacidade de compromisso do Governo e/ou dos grupos parlamentares para se alcançar uma solução justa, ainda em 2025, que não deixe um grupo tão significativo de cidadãos excluídos e marginalizados de um direito inalienável.

Como referido, em 2023 e 2024 houve excedentes recorde na Segurança Social (5.6 e 5,8 MM€), montante para o qual os pensionistas de 2023 ainda contribuíram – cerca de 1% desse montante pagaria os aumentos devidos. Na verdade, os pensionistas de 2023 são contemporâneos do recorde de excedentes acumulados pela Segurança Social tal como do recorde do valor da sua carteira (mais de 45 MM€ no final de 2024), mas ficaram excluídos desses benefícios para os quais ainda contribuíram.

O Governo e/ou Parlamento ainda podem, em 2025, fazer justiça e dar dignidade a estes 120 mil cidadãos reformados. Assim haja vontade política e sensibilidade… se assim for, ainda podemos ir a tempo de obter justiça. Tudo faremos para que se faça justiça. Esperamos do futuro Governo e da acção conjugada de todos os grupos parlamentares uma atitude justa, digna, solidária e verdadeiramente estrutural em prol desta causa. Os reformados de 2023 não podem continuar a ser bola de arremesso político entre PS e PSD, que imputaram responsabilidades um ao outro, esquecendo que a resolução deste problema é uma questão nacional, ao alcance do governo, qualquer que ele seja.

E é também aos governos que devem ser imputadas as falhas sucessivas na gestão da receita dos fundos da Segurança Social, falhas no combate à evasão e fraude e outras, que têm impedido que a sustentabilidade da Segurança Social nacional seja ainda mais sólida e duradoura, não obstante comparar muito bem com os países da União Europeia ou da OCDE em melhor posição nesta matéria. Mas esta análise ficará para outro artigo.