Entendo que tenham solicitado a minha opinião, afinal sou uma pessoa experimentada em tetras. É como quando se pede opinião a um artista veterano sobre um novato que está a dar os primeiros passos.
Muitos têm dito, em jeito de piada (ou talvez não) que parece que voltámos aos anos sessenta, com Fátima, Futebol, Fado e... Festa em Santa Comba Dão, terra natal de Salazar. Parece-me um manifesto exagero. Não recuámos assim tanto. Regressámos aos anos noventa. O Tetra é tão 1998! Os benfiquistas entraram na máquina do tempo. Depois da festa no Marquês vão tentar comprar bilhetes para a Expo 98, para o dia em que actuam os Silence 4. Bem-vindos a 98, vão ver que gostam. Daqui a seis anos vão tentar ir buscar um treinador mal tratado no Porto para serem campeões europeus. Era preciso é que Paulo Fonseca fosse tão bom como José Mourinho. Nada temam, amigos portistas. Fonseca nunca conseguiria chegar à final da Liga dos Campeões, perdia-se no caminho, com os seus parcos conhecimentos no que toca a cidades europeias.
Confesso que, para escrever esta crónica, usei o método de trabalho de Eduardo Barroso: não vi o jogo. Não pude pedir, como o cirurgião, que o meu filho visse e me contasse, já que ele tem apenas cinco meses. Mas fiz um zapping rápido e apanhei o essencial: o 2-0 ao fim de quinze minutos – temos de reconhecer que o Vitória de Guimarães foi pragmático a garantir um lugar na Supertaça Cândido de Oliveira – e a entrevista de Carlos Dias da Silva ao intervalo, perguntando ao primeiro-ministro se o tetra dava alegria “aos portugueses”. Pensando bem, aquela teoria do regresso ao Estado Novo pode não estar tão errada quanto isso.
A festa no final do jogo foi bonita, embora tenha perdido um pouco a magia por ser no Estádio da Luz. Foi melhor em 2015, em Guimarães: nada como uma pilhagenzinha para descarregar a adrenalina. Roubar material desportivo sabe ainda melhor que lançar foguetes. E é menos perigoso, porque nunca ninguém ficou sem uma mão por roubar um fato-de-treino (os ladrões iranianos não podem dizer o mesmo).
Entre os portistas é recorrente a queixa de um tratamento parcial por parte da maioria da imprensa. Acho que essa queixa não tem fundamento. Tenho a certeza que neste momento há já um jornalista d’A Bola a abandonar a festa no Marquês de Pombal (com duas garrafas de champanhe no bucho) e apanhar o primeiro avião para o Dubai, para entrevistar o saudoso João Gabriel, dando-lhe oportunidade de fazer primeira página amanhã, como fez quando o FCPorto foi campeão, usando exactamente as mesmas palavras: “este título é um tributo aos árbitros”.
Amanhã vai ser dia de ressaca para muito boa gente. E dia de sair finalmente o castigo do Samaris. Enquanto isso, o Brahimi escapou por pouco a prisão perpétua. É verdade, e não é que o Pizzi continua sem ver o quinto amarelo? Acho que esse recorde é ainda mais merecedor de comemoração do que quatro campeonatos seguidos. Um dá acesso ao Guinness, outro não.
Há quem use a metáfora do copo meio cheio ou meio vazio, eu costumo usar a do campeonato ganho ou campeonato perdido. Este foi claramente perdido pelo Porto. O anterior tinha sido perdido pelo Bryan Ruiz. E Rui Vitória tem o mérito de estar sempre lá à espera. É como aquelas pessoas que arranjam sempre lugar para estacionar à porta. Esta época foi, ao mesmo tempo, uma homenagem a Giovanni Trapattoni: fazendo lembrar a sua passagem por Portugal, este ano voltou a ganhar o menos mau e não o melhor.
Bom, está na altura de preparar a próxima época. No Sporting é preciso perceber qual o valor do aumento no ordenado de Jesus, depois do décimo remake do filme “segurem-me que vou para o FCP!”, no Porto é preciso encontrar uma boa firma de engenharia para colocar o Depoitre, no Benfica é preciso saber se os juízes que vão visionar os jogos, agora com vídeo árbitro, querem jantar no Museu da Cerveja ou preferem ir provar a caldeirada do Barbas.
Da minha parte fica a tristeza de não ter ganho, claro. E a grande alegria de ser do Futebol Clube do Porto. Sempre.
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