Era ainda pequeno, pré-adolescente, quando mudei de escola pela primeira vez. "De que clube és?", perguntavam os do nono ano, muito mais velhos do que eu. “Tchhh, já não ganham há xis anos!”, atiravam assim que eu dizia que era do Sporting. Era difícil ser levado a sério, ser sportinguista era quase tabu. Era. Agora já não cola e deixa-me um sorriso enorme na cara pensar que vou ver o meu clube levantar a taça do campeonato e fazer justiça. E podem perguntar agora de que clube sou que respondo sem hesitar: do Sporting, ora pois! Que bem que sabe ser campeão.
Não sou fanático de futebol, daqueles que não perdem um jogo e sabem de cor quem marcou o golo da vitória contra o Olhanense no dia 11 de maio de 2013. Mas não é mentira dizer que sei que o clube passou por muito nestes 19 anos de seca: coisas boas, coisas más, coisas muito más e coisas terríveis, das quais nem quero falar. Digo já que é preciso muita paciência e amor à camisola, mas pelo Sporting e por momentos destes vale a pena.
O meu amor pelo clube não veio do nada. Cresci numa família sportinguista - com uma ou outra maçã podre. O meu irmão, por acaso gémeo, que agora treina como guarda-redes no Atlético (o de Portugal, não o madrileno), passou a preferir o Porto porque o Sporting perdia vezes de mais. Até que um dia mudou para o Benfica porque foi campeão. Passámos anos a chamá-lo "troca-tintas" (e é mesmo um troca-tintas), mas a verdade é que nunca conseguimos trazê-lo para o Sporting outra vez – nem o meu avô, que passou anos a oferecer-nos cachecóis, equipamentos, gorros, bolas de futebol e jornais do Sporting no Natal, no aniversário ou só porque sim. Só lamento que já não consiga ver o Sporting ser campeão este ano.
A minha mãe também é sportinguista, mas daquelas leoas que protegem as crias com unhas e dentes. Portanto, nunca quis que fôssemos ver um jogo de risco (clássico) ao estádio. No entanto, lembro-me de um inofensivo Sporting - Académica de Coimbra, em Alvalade, em que até entrei em campo com os jogadores (sou o ruivo da fotografia), tinha oito anos. Como miúdo, foi um momento mágico. Mágico até o jogo terminar a zeros (imaginem o galo!). Aí é que foi chato, fui (fomos) de trombas para casa.
O meu pai também é sportinguista, mas mantém a distância (durante anos teve como presente de aniversário um bilhete de época). É dos que diz que é preciso aprender a não fazer dramas e que o Sporting está condenado a perder enquanto "eles" fizerem barulho. Mas, apesar de dizer que não presta muita atenção ao futebol, passa horas a discutir resultados e notícias com o meu irmão, incluindo piadas e memes que recebe: “O Sporting ganhou o campeonato. Depois desligou a PS4 e foi dormir”. Até pode ter graça, mas é muito década passada.
No momento em que escrevo este texto faltam três jornadas, mas já posso dizer com segurança: pela primeira vez na minha vida o Sporting vai ser campeão. E não me quero queixar, mas vencer este campeonato nos dias que correm traz sentimentos mistos. Afinal, ninguém pôde ir ver um jogo que fosse ao estádio, onde cantos e assobios foram substituídos por um silêncio quebrado apenas pelos jogadores em campo. Por outro lado, também a festa é agridoce: sempre imaginei como seria ver o Sporting campeão no passado, as ruas cheias de verde e branco, a festa, a alegria, o buzinão, momento pelo qual todos esperaram. Sair à rua com tudo e gritar a plenos pulmões: “Viva o Sporting!”.
Mas nenhuma alma consciente vai celebrar para o Marquês nesta altura do campeonato (trocadilho completamente não intencional), com aquela-coisa-cujo-nome-não-vou-mencionar a pairar por aí. Tenho um orgulho imenso na conquista do Sporting numa altura tão turbulenta. Conseguimos, ganhámos a Liga NOS - mas fica a pergunta: o que fazer desta vitória? Seria bom – perfeito, até - sair e celebrar com tudo e todos, mas no estado em que isto se encontra é preciso ter cautelas. Ou melhor, é preciso rugir com máscara – mas vai ouvir-se tão bem como em qualquer outro ano. Este ano vou gritar mais alto que nunca: "Viva o Sporting!"
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